Investigadores mostraram pela primeira vez que é possível direccionar um vírus geneticamente modificado para atacar células cancerígenas sem afectar o tecido saudável de uma pessoa, com uma única dose intravenosa.
Durante décadas, a ciência explorou a ideia de utilizar os vírus para alertar o sistema imunológico de que deveria atacar e destruir as células cancerígenas. Esse interesse foi substituído pela possibilidade de serem os vírus a atacar o próprio cancro, graças ao desenvolvimento da engenharia genética.
Num estudo publicado nesta quarta-feira na edição online da revista "Nature", uma equipa de cientistas mostrou que o vírus JX-594 consegue infectar tumores com efeitos secundários mínimos e que duram pouco tempo.
Vírus utilizado é seguro
A terapia experimental foi feita num número pequeno de pessoas por uma equipa de cientistas da Universidade de Otava e por uma pequena empresa de biotecnologia chamada Jennerex Inc. O objectivo era confirmar se o vírus era seguro - o que foi confirmado. O método vai ser testado em pacientes com cancro de fígado mais ou menos avançado.
“Com a quimioterapia existem efeitos secundários drásticos”, disse John Bell, cientista principal da Jennerex e do Instituto de Investigação do Hospital de Otava. “Com este tratamento, os doentes só tinham sintomas [equivalentes] ao da gripe durante 24 horas, e mais nada depois disso.”
O primeiro teste envolveu 23 doentes com vários tipos de cancro num estado muito avançado. Os pacientes foram divididos em cinco grupos - cada um recebeu uma dose intravenosa específica do vírus. Dos oito pacientes incluídos nos dois grupos com as maiores doses, sete apresentaram evidências de replicação viral no tumor.
Sete dos pacientes desse grupo mostraram que os vírus só se replicavam nas células cancerígenas, deixando em paz os tecidos saudáveis. Seis experimentaram uma melhora ou, pelo menos, uma estabilização do câncer.
Segunda fase de testes
A próxima fase vai incluir 120 doentes com cancro de fígado primário, conhecido como carcinoma hepatocelular. Segundo o investigador, este vírus mostrou uma actividade muito forte contra o cancro do fígado. Alguns destes cancros de fígado são causados por vírus, como o da hepatite B, e os investigadores acreditam que isso os torna mais susceptíveis a uma nova infecção feita por um segundo vírus.
O JX-594 é derivado de uma estirpe de vírus que antes era muito utilizada para vacinar as crianças contra a varíola, uma doença erradicada há décadas. “Sabemos que [o vírus] é bastante seguro”, disse Bell, sublinhando que a informação genética que o vírus necessita para mutar foi retirada.
O investigador acrescentou ainda que, como este vírus é administrado de uma forma intravenosa, há a possibilidade de que o mesmo limite a capacidade das células do cancro saírem de um tumor e através da corrente sanguínea irem para outro local, espalhando-se pelo corpo através das metáteses.
Notícia corrigida às 10h32 de 1 de Setembro