Faltam estudos que comprovem que cães ajudam. Mas também não prejudicam

O que existe, diz professora da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra, é um estudo publicado no Canadá em 2016 que revela uma diminuição dos níveis de stress parental após a introdução de um cão de assistência. Mas "haverá muitas variáveis a considerar nestas conclusões”.

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Tanto Guiomar Oliveira como Carlos Nunes Filipe recusam a ideia de que os casos de autismo estejam a aumentar no país Paulo Pimenta

Não existe, ainda, qualquer “evidência científica” de que um cão de assistência possa contribuir para a terapêutica das crianças com perturbação do espectro do autismo. Guiomar Oliveira, coordenadora da Unidade de Neurodesenvolvimento e Autismo do Centro de Desenvolvimento da Criança, do Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra, diz ao PÚBLICO que não é “claro” quais os “outcomes mensuráveis” na interacção animal-criança-família para ser possível avaliar o resultado.

O que existe, continua a docente da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra, é um estudo publicado no Canadá em 2016 que revela uma diminuição dos níveis de stress parental após a introdução de um cão de assistência. “Ainda assim teríamos de saber de que tipo de autismo estamos a falar, bem como de que tipo de família. Ou seja, haverá muitas variáveis a considerar nestas conclusões”, ressalva a especialista em neurodesenvolvimento, admitindo que, “se não for nocivo” para a criança, não vê “contra-indicação” num cão de assistência.

Também Carlos Nunes Filipe, psiquiatra e director clínico da Associação Portuguesa para as Perturbações do Desenvolvimento e Autismo (APPD) em Lisboa, sublinha que não existem estudos que indiquem que um cão de assistência possa desempenhar um papel no tratamento do autismo. “É uma perturbação genética, e por isso um cão não tem implicações na terapêutica”, observa, acrescentando que eventuais benefícios vão depender de vários factores. “A criança pode, por exemplo, ter medo do cão.”

Por outro lado, nota o psiquiatra, se entre os dois se estabelecer uma relação de “confiança e segurança”, um cão de assistência pode trazer benefícios para a criança. “Não há qualquer indicação, mas também não existe nada em contrário”, conclui Carlos Nunes Filipe, comparando o autismo com outras perturbações genéticas como, por exemplo, a trissomia 21. “Um cão ou outro animal não vão influenciar o tratamento.”

O último estudo epidemiológico sobre a prevalência do autismo em Portugal foi feito em 2000 e coordenado por Guiomar Oliveira. O trabalho teve como população-alvo mais de 330 mil crianças em idade escolar de Portugal continental e Açores, nascidas em 1990, 1991 e 1992. E permitiu concluir que uma em cada mil tinha alguma perturbação do espectro do autismo. Números que estão em linha com outros países.

Tanto Guiomar Oliveira como Carlos Nunes Filipe recusam a ideia de que os casos de autismo estejam a aumentar no país.

“O que está a aumentar é o conceito clínico para o diagnóstico da perturbação do espectro do autismo, que é cada vez mais abrangente, também em Portugal”, argumenta Guiomar Oliveira. O psiquiatra da APPD-Lisboa concorda.

“O que tem variado é o critério. Existe hoje uma maior abrangência e um maior conhecimento, que fazem com que a nossa percepção seja maior”, explica Carlos Nunes Filipe, apontando os Açores como a região do país com maior prevalência de autismo. Do lado oposto está o Alentejo, sendo que no Algarve os casos são também “raros” em relação ao resto do país.

O aumento da idade paterna e a reduzida diversidade genética da população de uma determinada região têm sido apontados como factores que podem influenciar o risco de autismo.

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