O partido que sentou o planeta no Parlamento

André Silva queria participar de forma mais activa na sociedade. É o único deputado do partido que defende os animais e a natureza, que não é de esquerda nem de direita.

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Nuno Ferreira Santos

André Silva, 42 anos, não tinha qualquer experiência antes de entrar para o Partido Animais e Natureza (PAN). “A experiência política adveio da vontade de mudar o paradigma social, cultural e económico de uma forma ainda mais activa, ou seja, mantendo a componente activista, mas dentro do sistema partidário e político”, conta ao P2. O que o fez tomar a decisão de envolver-se num projecto político foi ver um vídeo na Internet — “a melhor palestra que você irá ouvir na sua vida”, do activista Gary Yourofsky.

Quando surgiu, o PAN era motivo de gracejos por defender o planeta, os ecossistemas e outras formas de vida. Em suma; por rejeitar o antropocentrismo. “Lidamos bem com os comentários menos positivos ou mesmo diminutivos”, diz o engenheiro civil de formação. “Chamam-nos ‘PANtásticos’ e ‘comPANeiros’ muitas vezes. Momentos descontraídos que vivemos e gerimos com um sorriso na cara. Enfim, vamos PANificando o que podemos”, brinca. “Sabemos, acima de tudo, que incomodamos porque trazemos visões progressistas e somos livres”, acrescenta.

Na verdade, o que para alguns era uma miragem acabou por revelar-se uma certeza. Em 2015, André Silva ganha um lugar no Parlamento e, mais, consegue criar agenda na política e assunto nos meios de comunicação social. “Além de, nos últimos dois anos, se debater muito mais questões relacionadas com matéria de defesa ambiental no Parlamento, trouxemos também a perspectiva jurídico-legal da protecção dos animais”, avança. E exemplifica: “Conseguimos chegar a pessoas que não viam os seus direitos reconhecidos, os vegetarianos, com a adopção da opção vegetariana em todas as cantinas da administração pública e também a pessoas em situações de enorme fragilidade, com a aprovação, no último Orçamento do Estado, de implementação de salas de atendimento à vítima nas esquadras de polícia.”

André Silva relembra que o PAN “foi fundado pela vontade de muitas pessoas e organizações de protecção animal, de defesa ambiental e que deixaram de se rever na obsoleta categorização esquerda/direita e que rejeitam a ideia de que o ser humano é a medida de todas as coisas”. Foi exactamente por acharem que havia muita gente que queria mudar de paradigma que não ficou surpreendido quando conseguiram eleger um deputado nas últimas eleições.

Os elementos do partido, diz, são “livres de interesses vinculados ao hegemónico pensamento económico e social que tudo idolatra e destrói em nome do crescimento, em nome do PIB”. Até agora, “têm recusado posicionar-se dentro do partidarismo tradicional” e querem voltar a concorrer a solo às próximas eleições. Estar num pequeno partido traz, claro, um esforço extra. “Diariamente, deparamo-nos com obstáculos para aceder às mesmas plataformas de comunicação que os restantes partidos têm, com imenso volume de trabalho e as solicitações e restrições regimentais, como os tempos e oportunidades de debate diferentes”, exemplifica André Silva. “Porém, trabalhamos com uma equipa reduzida mas hiperdeterminada, a nível partidário local e nacional.”

Apesar de não serem novidade, as alterações climáticas voltaram a entrar na agenda política nacional por causa dos fogos: “Infelizmente, não foi surpresa para nós.” Sobre tudo isso, André Silva tem uma visão muito crítica: “A protecção dos sistemas ecológicos, ao contrário de ser a base de toda a economia e políticas públicas de emprego, de saúde, de educação, de obras públicas, é apenas um sound bite para embelezar um discurso político antropocêntrico em falência.” Um caminho que antevê perigoso porque, “inerentemente, levará ao colapso da sociedade como a conhecemos”.

“A tragédia dos incêndios de 2017, tal como a contínua poluição das massas de água em Portugal, nomeadamente do rio Liz e do rio Tejo, a juntar ao incessante e cego apoio financeiro a indústrias altamente poluentes como a pecuária intensiva, à produção de energia a partir da queima do carvão, entre outros casos, são a prova de que falta uma visão a longo prazo para o país”, critica. Para André Silva, isso tanto acontece “à esquerda produtivista como à direita extractivista”. E aponta o dedo ao actual executivo: “O Governo apregoa o desígnio da descarbonização da economia, mas não está a fazer tudo para o alcançar.”

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