Ajuda à região síria de Ghouta adiada em dia de novas suspeitas de uso de armas químicas
Estima-se que cerca de 90 civis tenham morrido na quarta-feira. Exército sírio garante que a derrota da oposição armada está para breve.
A chegada de uma coluna humanitária à região de Ghouta Oriental, nos arredores de Damasco, marcada para a manhã desta quinta-feira, foi adiada. Há suspeitas de ataques químicos por parte da força aérea do regime de Bashar al-Assad e intensos bombardeamentos continuam a atingir o enclave que ainda é dominado pela oposição armada ao Governo sírio.
De acordo com o que relata a AFP, os camiões com a juda humanitária do Comité Internacional da Cruz Vermelha, Crescente Vermelho e Nações Unidas, estão parados nos arredores de Ghouta Oriental, num posto de controlo do Exército sírio. O comboio ia distribuir mantimentos e material médico na principal cidade do enclave, Douma.
“A marcha da coluna foi adiada. Enquanto a situação estiver a evoluir no terreno não nos permite realizar a operação em condições”, disse à AFP a porta-voz da Cruz Vermelha, Ingy Sedky.
O regime de Assad, apoiado pela Rússia e pelo Irão, intensificou os bombardeamentos sobre Ghouta Oriental nos últimos 18 dias de forma a recuperar o controlo do enclave que está desde há anos nas mãos dos grupos rebeldes que lutam pela queda do Presidente sírio. A estes ataques aéreos seguiu-se, nos últimos dias, uma ofensiva terrestre destinada a expulsar a oposição da região, o que estará prestes a acontecer, diz Damasco.
Segundo o Observatório Sírio para os Direitos Humanos (organização com sede em Londres e que conta com observadores no terreno), quase 90 civis morreram na quarta-feira na sequência de novos bombardeamentos por parte dos aviões sírios. De acordo com os cálculos do Observatório, o número de mortos civis em Ghouta nos últimos 18 dias subiu já para perto de 900.
Esta organização relata ainda à Reuters que dezenas de pessoas tiveram de receber assistência médica por terem dificuldades em respirar depois destes ataques aéreos. Os médicos responsáveis pelos tratamentos ligaram os sintomas a um possível ataque tóxico.
As vítimas que apresentaram este tipo de sintomas encontram-se maioritariamente nas cidades de Saqba e Hammuriyeh, que foram atingidas pelos bombardeamentos sírios na quarta-feira.
A Sociedade Médica Síria-Americana (Sams) diz que deu assistência a pelo menos 29 pessoas que tinham sinais de exposição ao elemento químico cloro. Contudo, não houve mortos.
“Devido a um ataque com cloro em Ghouta Oriental, os pacientes estão a sofrer sintomas como dispneia severa, transpiração, congestionamentos de membranas mucosas, corrimento nasal grave, sibilância e eritema conjuntival”, explicou a Sams nas redes sociais, diz o Guardian.
Numa entrevista ao canal CNEWS, na quarta-feira, o ministro dos Negócios Estrangeiros francês, Jean-Yves Le Drian, avisou que se existirem provas da utilização de armas químicas na Síria, a França irá avançar com “medidas de intervenção”.
Não é a primeira vez que surgem acusações de utilização de armas químicas por parte do regime sírio nos sete anos que a guerra já leva e na ofensiva contra Ghouta em particular. Chegou a ser acordado um cessar-fogo de 30 dias em todo o país, aprovado pelo Conselho de Segurança da ONU – que excluía porém operações militares contra grupos terroristas – e uma trégua diária de cinco horas imposta por Moscovo, mas nunca foram respeitadas.
Na segunda-feira chegou ao enclave a primeira coluna de ajuda humanitária desde o início da intensa ofensiva de Damasco. Porém, as tropas do Governo de Bashar al-Assad retiraram a maior parte do material médico e os alimentos destinados às cerca de 400 mil pessoas que estão presas em Ghouta Oriental.
Dividida e prestes a cair
Segundo disse um comandante de Damasco à Reuters nesta quinta-feira, a ofensiva está a resultar. O exército sírio está prestes a dividir Ghouta Oriental em dois, cortando as rotas de abastecimento da oposição rebelde que aí se encontra, explicou.
A mesma fonte disse que as tropas que avançam a leste vão encontrar-se em breve com a coluna militar no lado ocidental. A consumar-se esta divisão do território, a região fica praticamente nas mãos do regime de Assad.
Segundo explicou o comandante ouvido pela Reuters, que pediu para não ser identificado, esta divisão formará uma estreita parcela de território controlado pelas tropas sírias que tornará impossível à oposição movimentar-se entre o Norte e o Sul do enclave, pois estarão ao alcance do fogo dos militares de Assad.
No entanto, Wael Alwan, porta-voz do Failaq al-Rahman, um dos principais grupos rebeldes em Ghouta, desmentiu à Reuters que a região tenha sido dividida em dois, ou esteja à beira disso. Garantiu também à televisão Al-Jazira que as tropas de Assad controlam apenas 30% do enclave.
Esta semana, o Kremlin propôs a retirada em segurança dos combatentes rebeldes em Ghouta. O pedido foi rejeitado pelos rebeldes, que garantiram que nunca houve qualquer contacto com Moscovo relativamente a uma oferta do género.
Com a proposta da Rússia, está a ser repetida a mesma estratégia utilizada por Damasco e os seus aliados ao longo dos sete anos de guerra na Síria. Em Alepo foram também realizados intensos bombardeamentos para pressionar a oposição que controlava a cidade, para depois se avançar com uma ofensiva terrestre. A seguir, foi feita uma proposta de retirada segura, o que levou à rendição por parte dos grupos combatentes.
A confirmar-se, a queda de Ghouta será a maior derrota da oposição desde Alepo. Sem o controlo deste enclave nos arredores de Damasco, os combatentes rebeldes ficarão sem a capacidade de atingir a capital síria com os seus morteiros.