Candidatura de Falcón contra Maduro agudiza crise da oposição
MUD anunciou boicote às presidenciais de Abril, por falta de garantias, mas foi desconsiderada pela candidatura de um membro da sua coligação.
A oposição democrática venezuelana voltou a colher os indesejados frutos do desgaste que tem vindo a evidenciar nos últimos meses, com mais uma desautorização interna à sua estratégia política contra o regime chavista. Os partidos que compõem a Mesa da Unidade Democrática (MUD) tinham anunciado a sua renúncia às eleições presidenciais, por não verem cumpridas determinadas condições que, no seu entender, não permitem que o acto eleitoral agendado para 22 de Abril seja livre e verdadeiro, mas um dos seus membros, Henri Falcón, decidiu ignorar esta postura e inscreveu-se como candidato.
O antigo governador do estado venezuelano de Lara oficializou a sua intenção em concorrer na passada terça-feira, o último dia permitido pelo Conselho Nacional Eleitoral (CNE), e disputará a contenda com o actual Presidente e mais do que provável vencedor, Nicolás Maduro – que celebrou a apresentação da sua candidatura no mesmo dia, dançando reggaeton com a sua mulher. A corrida que conta ainda com o pastor evangélico Javier Bertucci, com o ex-militar Francisco Visconti, com o empresário Luis Alejandro Ratti, e com o engenheiro Reinaldo Quijada.
Todos os candidatos têm ligações mais ou menos assumidas ao aparelho governativo do falecido Hugo Chávez, incluindo o próprio Falcón, que se desvinculou do Partido Socialista Unido da Venezuela em 2010, mas que sempre foi visto dentro da MUD como alguém que gosta de se movimentar por zonas cinzentas e de se assumir como um conciliador e um moderado. A imprensa espanhola escreve mesmo que no seio da oposição são muitos os que suspeitam que Falcón possa ter fechado um acordo com o “oficialismo” para se candidatar, em troca de proveitos políticos futuros.
O antigo militar reconheceu que parte para as eleições numa posição de desvantagem mas afiançou que a única forma de combater Maduro, a quem chama de “candidato da fome”, é através do voto. E para tal, espera poder contar com a mobilização popular. “Falo em nome dos milhões de venezuelanos a quem o Governo prometeu um paraíso e ofereceu um inferno”, garantiu no Twitter.
A ‘traição’ de Falcón, filiado nos quadros do partido Avançada Progressista, integrante da MUD, e apoiado nesta missão por mais quatro partidos, levou a coligação a lamentar que aquele tenha optado por se “desviar do sentimento democrático do povo venezuelano”. A MUD repudiou uma acção legitimadora do “simulacro fraudulento e ilegítimo de uma eleição presidencial” – que Carlos Vecchio, da Vontade Popular, rotulou de “jogo do ditador”.
“A Unidade Democrática definiu (…) a sua posição sobre as condições para que haver uma verdadeira eleição na Venezuela, à luz da Constituição. Com a sua inscrição numa farsa eleitoral, Henri Falcón demarca-se completamente da Unidade”, escreveu a MUD nas redes sociais.
Certo é que a insurreição do ex-chavista belisca uma vez mais a imagem da aliança opositora e o seu desejo de promoção de unidade, poucos meses volvidos da última desconsideração pública às suas directrizes e de uma derrota contundente nas eleições regionais. Em Outubro do ano passado, quatro governadores eleitos da Acção Democrática (AD) preferiram prestar juramento junto da Assembleia Constituinte – eleita em Julho e totalmente dominada pelo regime – em vez de acatarem a ordem de proibição decretada pela MUD, que não reconhece a legitimidade política daquela instituição.
Assolada por tumultos internos, impedida de apoiar Leopoldo López ou Henrique Capriles – proibidos pelo CNE de se candidatarem às presidenciais –, em rota de colisão com a candidatura de Falcón, e ignorada, nos seus apelos por eleições justas, pelo chavismo, a MUD enfrenta um cenário de incerteza política. Corre sérios riscos de se fragmentar ainda mais, caso não recupere o protagonismo. A sua luta e unidade dependem cada vez mais da resposta que der nas próximas semanas.