Durão Barroso acusado de quebrar promessa de não fazer lobby pelo Goldman Sachs
Antigo presidente reuniu num hotel em Bruxelas com vice-presidente da Comissão Europeia.
As actividades de Durão Barroso como lobista do banco Goldman Sachs estão de novo a levantar dúvidas em Bruxelas. Uma coligação de agências não-governamentais dedicadas à transparência apresentou uma queixa por má administração junto da Comissão Europeia, na sequência de uma reunião entre Barroso e o vice-presidente da Comissão, Jyrki Katainen, que terá sido combinada ao telefone pelo actual consultor do banco de investimento norte-americano e da qual não existem quaisquer registos.
“Não tenho o hábito de tirar notas nas reuniões e também não tirei nesta, pelo que não existem documentos deste encontro”, justificou o comissário europeu responsável pelas pastas do Emprego, Crescimento, Investimento e Competitividade, que confirmou que os dois se reuniram num hotel de Bruxelas para discutirem matérias ligadas ao “comércio internacional e política de defesa”.
“A reunião foi pedida por Durão Barroso e agendada pelo meu gabinete após um telefonema”, informou.
Numa carta enviada pela Aliança para a Transparência do Lobby e a Regulação Ética (ALTER-EU) ao secretário-geral da Comissão Europeia, Alexander Italianer, e divulgada esta terça-feira pelo EU Observer, os activistas pela transparência exigem que o Comité Independente de Ética proceda à revisão do estatuto de lobista de Durão Barroso, que na sequência da polémica da sua contratação pelo Goldman Sachs se tinha comprometido a não levar a cabo acções de lobby junto da instituição que dirigiu entre 2004 e 2014.
“Tudo indica que o antigo presidente Barroso está activamente a fazer lobby junto da Comissão Europeia em nome do banco de investimento Goldman Sachs. Mas a autorização que recebeu do Comité de Ética Ad-Hoc [constituído por Juncker para avaliar se a contratação de Barroso violava as disposições dos tratados sobre a transição de funções] teve por base uma promessa de não fazer lobby”, nota a ALTER-EU, considerando que perante as novas informações, a decisão daquele comité deve ser anulada, e as actividades de Durão Barroso no desempenho do seu cargo no banco de investimento devem ser reavaliadas.
“As suas actividades de lobby, agora confirmadas, exigem uma reavaliação pelo Comité Independente de Ética. Desta vez, este organismo deve proceder a uma investigação mais aprofundada ao papel do senhor Barroso no Goldman Sachs e averiguar se o antigo presidente terá induzido em erro o actual presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker”, pede a coligação, que acusa Barroso de ter quebrado o seu dever de discrição e integridade.
Em declarações ao PÚBLICO, Vítor Teixeira, da Transparency International, apoia o apelo à revisão do caso de Durão Barroso, lembrando que “de acordo com o código de conduta para comissários, ele tem a obrigação de se comportar de maneira digna durante e depois do seu mandato”. Notando que os argumentos que suportaram a pronúncia do comité ad-hoc “se revelaram falsos, e que são contra o código de ética, a decisão sobre o emprego do senhor Barroso no Goldman Sachs deve ser reanalisada”, considera.
A reunião em causa aconteceu a 25 de Outubro de 2017, num hotel próximo do edifício da Comissão Europeia, em Bruxelas. Só participaram Durão Barroso e Jyrki Katainen. Só depois de uma nota publicada pelo Playbook do Politico a dar conta do encontro entre os dois é que informação sobre a reunião foi acrescentada ao registo oficial dos encontros de Katainen com lobistas, mas apenas com a indicação de um encontro com o banco Goldman Sachs e sem fazer qualquer referência ao nome de Barroso.
“Entendemos que o vice-presidente Katainen quebrou as instruções do presidente Juncker relativas ao tratamento do antigo presidente Barroso e não cumpriu as melhores práticas administrativas”, lê-se na carta, que diz que o português beneficiou de um tratamento e de um “acesso privilegiado” a uma das principais figuras na hierarquia da Comissão distinto de todos os outros agentes registados como lobbyistas.
Num breve comentário à notícia do Eu Observer, o porta-voz da Comissão Europeia, Margaritis Schinas, limitou-se a confirmar a realização do encontro, sublinhando que este decorreu 36 meses após a saída de Barroso do cargo (quando o “período de nojo” previsto para a permissão de funções de lobby é de 18 meses) fora do edifício da Comissão. O mesmo responsável frisou que o vice-presidente, Jyrki Katainen, cumpriu os procedimentos em curso em termos de transparência ao inscrever a reunião no registo público oficial. “A legalidade aplicável foi seguida religiosamente”, afirmou.