Democracia mais larga
O alargamento de direitos políticos permitiria acabar com a incongruência de os imigrantes brasileiros serem os únicos que podem votar nas legislativas e os cabo-verdianos os únicos de origem africana a quem é reconhecido o direito de votar e concorrer às autárquicas.
Os cidadãos estrangeiros residentes em Portugal só podem votar em eleições autárquicas caso existam acordos de reciprocidade com os países dos quais são naturais ou tenham passaporte de um país da União Europeia. O Artigo 15.º da Constituição, por um lado, determina que qualquer estrangeiro residente no país usufrui dos direitos e dos deveres de um qualquer cidadão português e, por outro, não lhes concede os mesmos deveres e direitos de participação cívica. Se se reconhece que alguém estrangeiro possa estar inserido numa comunidade local, e, por isso mesmo, possa e deva ter uma opinião acerca do modo como a mesma é gerida, o mesmo não deve ser reconhecido em outros actos eleitorais? Talvez.
O alargamento do direito de voto é um alargamento da democracia. António Vitorino defendeu-o em 2011, exequível com uma alteração constitucional e à lei eleitoral, e o antigo alto-comissário para a Imigração e Minorias Étnicas Rui Marques também. Reconhecer o direito de voto a cidadãos de um conjunto mais alargado de países seria facilmente concretizável, se o princípio a adoptar fosse o de um período de tempo mínimo de residência, tal como estipula uma directiva europeia, fazendo coincidir a autorização de residência com o recenseamento obrigatório.
O princípio da reciprocidade e o de pertença a uma união de Estados como é a União Europeia diz respeito às relações entre Estados e justifica porque é que um uruguaio ou um romeno possa votar em Portugal e um angolano não. A exclusão de alguns Países Africanos de Língua Oficial Portugal (PALOP) diz muito das relações de Portugal com esses países. Numa Europa de maior mobilidade e de crescente preocupação securitária, dificilmente os critérios serão outros, sob pena de algumas nacionalidades criarem os seus próprios partidos. Em Portugal, os estrangeiros são 3,8% da população e nem constituem uma ameaça nem uma força eleitoral. O caso seria bem diferente na Alemanha.
Um critério mais amplo que incluísse os PALOP permitiria acabar com a incongruência de os imigrantes brasileiros serem os únicos que podem votar nas legislativas e os cabo-verdianos os únicos de origem africana a quem é reconhecido o direito de votar e concorrer às autárquicas. O alargamento de direitos políticos permitiria melhorar a inclusão, aumentar a participação e a representatividade política e tornar o sistema mais plural.