Paulo Macedo recoloca Caixa a dar lucro

Operação bancária, gestão financeira e corte de custos explicam reviravolta nas contas do banco público.

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MIGUEL A. LOPES

O banco público fechou 2017 com um resultado líquido positivo de 52 milhões de euros, que contrasta com o enorme prejuízo de 2016, que chegou perto dos dois mil milhões. Este é o primeiro exercício positivo nos últimos seis anos e chega um ano antes do previsto pelo próprio Paulo Macedo e do acordado com Bruxelas.

Na base desta recuperação estiveram não só a melhoria dos resultados obtidos pelo negócio dos balcões da Caixa, em especial o saldo entre os juros pagos pelas poupanças e os juros cobrados nos créditos, mas também o resultados de operações financeiras. A redução de custos da estrutura, em pleno programa de eliminação de postos de trabalho e balcões, e a reduzida despesa com créditos problemáticos (depois da forte limpeza de balanço feita no exercício anterior), também explicam aquilo que Rui Vilar, presidente do conselho de administração, considera ser "o sinal visível da viragem de página" na vida do maior grupo bancario.

Na apresentação de abertura da conferência de imprensa de divulgação das contas anuais, Vilar referiu que a CGD tem agora "as condições de capital, de liquidez e institucionais" para fazer um caminho de "sucesso". E lembrou que o banco público está a cumprir com os compromissos assumidos com as autoridades europeias. 

Recorde-se que o banco acordou com Bruxelas e Frankfurt uma recapitalização num valor global de cinco mil milhões de euros, que permitiu limpar imparidades de mais de dois mil milhões de euros em 2016. 

O presidente-executivo Paulo Macedo recordou isso mesmo, isto é, que o ano de 2017 fica marcado pela recapitalização do banco e que o ano de 2018 tem de ser, de acordo com o plano estratégico, o da recuperação. Um sinal que já se reflecte nas contas "com uma convergência em termos de margem financeira" e "com os resultados a serem positivos " quando a expectativa era que ainda se mantivessem negativos até 2018.

A explicar esta aceleração no cumprimento da meta de rentabilização esteve a margem financeira, que recuperou 201,4 milhões de euros para os 1241 milhões, na sequência de uma diminuição do custo de financiamento, não só pela eliminação da despesa com a ajuda pública (através dos CoCos, instrumentos de dívida), mas também com o custo mais baixo nos juros. 

Em paralelo, as comissões aumentaram em 15 milhões para 464,9 milhões, um reflexo da maior dinâmica na venda dos serviços aos clientes e de uma subida generalizada nos preços tabelados. Um tema que tem vindo a marcar a actualidade da gestão de Paulo Macedo, mas que tem aqui um reflexo no desempenho que o antigo ministro da Saúde tem conseguido à frente do banco público. 

Sobre este assunto, "temos claramente a intenção de aumentar o volume de comissões, mas não temos a intenção de mexer no tarifário deste ano", explicou Paulo Macedo, esta sexta-feira aos jornalistas. E esclareceu que o "assunto de eleição da CGD não são as comissões", mas o facto de a CGD ter regressado aos lucros antes do previsto no plano estratégico. Ainda assim, "um milhão e 300 mil clientes (700 mil reformados e jovens) isentos de comissões cobradas pela CGD em 2017 vão continuar isentos este ano", assegurou Paulo Macedo, lembrando que o banco ainda não regressou aos níves de comissões que se verificavam em 2015.

Menos depósitos compensados por fundos e dívida

Na captação de recursos junto dos clientes, os depósitos até diminuíram, mas foram compensados pela subida de outras soluções de poupança vendidas aos balcões, como os fundos de investimento ou os instrumentos de dívida do Estado, as obrigações do Tesouro de Rendimento Variável (OTRV). 

Assim, a Caixa explica que "a redução dos depósitos de clientes em 3030 milhões de euros (-4,6%) para 63.499 milhões teve origem sobretudo na actividade internacional, reflectindo o processo de encerramento das sucursais offshore".

Já o total de recursos captados na actividade doméstica "ascendeu a 68.648 milhões de euros no final de 2017, o que representou um aumento de 2,0%, com destaque para a colocação de OTRV em 1473 milhões de euros". Nos fundos de investimento, o crescimento foi de 409 milhões para quase quatro mil milhões.

A manobra das várias ferramentas financeiras ao seu dispor nos mercados globais também permitiu acrescentar uma componente positiva ao resultado da Caixa, em especial no equilíbrio feito na cobertura de risco em sintonia com a evolução das taxas de juro. As operações financeiras resultaram assim num resultado positivo de 215,8 milhões de euros, mais 76,6 milhões que em 2016. 

Por outro lado, a venda de activos e outras medidas de exploração permitiram equilibrar esta componente dos resultados de um prejuízo de 194 milhões para apenas 3,3 milhões, eliminado assim um peso sobre os resultados operacionais. 

O saldo final da operação bancária, contabilizando todos estes desempenhos, acabou por resultar num produto global da actividade de 1964,7 milhões de euros, uma melhoria de 541,3 milhões em relação ao ano anterior. Uma evolução positiva que não foi uma surpresa para Paulo Macedo, para quem houve "um crescendo no cumprimento do plano estratégico" que tem como condição colocar o banco público no caminho da rentabilidade. 

No que diz respeito aos custos de estrutura recorrentes, o seu valor caiu em 7% para os 1072,0 milhões de euros, um reflexo do programa de reestruturação em curso no banco e que contribuiu de forma positiva para o resultado líquido. Ainda assim, em termos não recorrentes, a eliminação de cerca de 500 postos de trabalho, revelada por Paulo Macedo esta sexta-feira aos jornalistas, traduziu-se, entre outras medidas num custos de 226,9 milhões de euros em provisões referentes ao programa de redução de pessoal. Este número de 500 saídas de trabalhadores da Caixa deverá repetir-se este ano. 

Até final do ano passado saíram voluntariamente 180 trabalhadores (rescisões amigáveis), metade do que aquelas que se candidataram. E reformaram-se cerca de 320 trabalhadores. A CGD vai ainda estudar um eventual plano de rescisões amigáveis para 2018, o que ainda não foi decidido. Mas haverá em 2018 um plano de pré-reformas que estará em curso até 2020. "Na CGD não haverá despedimentos", garante Paulo Macedo.

O custo que este programa está a ter para a Caixa explica, aliás, o resultado negativo em 176 milhões da actividade doméstica, por comparação com os resultado positivo do negócio internacional na ordem dos 228 milhões de euros, impulsionado pelo negócio em Macau e pela sucursal em França. A Caixa tem neste momento em curso um processo de alienação de algumas unidades internacionais, como Espanha, Brasil e África do Sul.

Outra pressão sobre os resultados verificou-se nas provisões não recorrentes referentes à reestruturação e alienação de actividades internacionais, um compromisso assumido pela Caixa no âmbito do plano de recapitalização acordado com as autoridades. 

Imparidade mínimas, crédito a descer

Paulo Macedo iniciou o seu mandato à frente do banco público com um balanço limpo, depois da forte injecção de capitais públicos no âmbito da recapitalização. Em 2016, as imparidades de créditos foram de quase 2400 milhões de euros. Em 2017, o número ficou-se pelos 85,9 milhões de euros. 

A própria qualidade do crédito que a Caixa tem em carteira melhorou no último ano, com o montante de créditos com problemas (Non Perfoming Loans e Non Perfoming Exposure) a recuar em aproximadamente um quarto do total durante 2017. Já no que diz respeito aos barómetros que avaliam os créditos arriscados, a Caixa refere no comunicado ao mercado que "o rácio de crédito em risco, calculado de acordo com os critérios do Banco de Portugal, reduziu-se de 10,5% em Dezembro de 2016 para 8,9% no final de 2017, atingindo uma cobertura por imparidades de 81,3%".

O volume de créditos também desceu, em todas as suas componentes. O "crédito a clientes bruto (incluindo créditos com acordo de recompra) reduziu-se 8,3% relativamente a Dezembro do ano anterior para 59.764 milhões de euros no final de Dezembro de 2017, com o crédito a empresas e a particulares da atividade da CGD Portugal a registarem variações de -14,0% e -4,5%, respectivamente".

O banco explica que "nesta redução merece especial destaque o processo de redução de exposições não produtivas através de vendas e write offs da carteira de crédito, no valor conjunto de 1434 milhões de euros e uma amortização de crédito superior à nova produção na sequência da desalavancagem dos agentes económicos nacionais". No fundo, em causa estão não só a venda de créditos de grande dimensão a compradores internacionais e fundos de gestão de activos, mas também a não renovação de créditos entretanto amortizados pelos clientes.  

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