“Não se pode estar bem com Deus e com o Diabo ao mesmo tempo”

Jerónimo de Sousa avisa o PS que não pode ter o melhor de dois mundos e que os socialistas têm de decidir se querem continuar o caminho dos consensos à esquerda ou se preferem aproximar-se do PSD de Rio

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Jerónimo de Sousa Miguel Manso

O que acha da polémica à volta da ida ao futebol do ministro das Finanças, Mário Centeno? Se for constituído arguido, deve sair do Governo?
Tendo em conta uma decisão do Partido Popular Europeu, a de promover um debate sobre essa matéria, consideramos que se tratou de uma operação de aproveitamento político de que discordamos. Temos um princípio fundamental: não comentamos notícias que estejam em processo de investigação ou segredo de justiça. O que consideramos importante é a investigação, o apuramento da verdade.

Deve ser razão para sair do Governo um ministro ser arguido?
O arguido é um suspeito, não é um condenado. É prudente ter este sentido da medida.

O PCP tem alguma leitura política destes casos que subitamente estão a ser investigados?
Não fazemos leitura política. A intervenção do Ministério Público demonstra que a Justiça está a funcionar. Os processos têm de ser desenvolvidos e concluídos. Mas isto não invalida que continuem a existir problemas de fundo, como, por exemplo, a falta de agentes da Polícia Judiciária ou os oficiais de justiça que, tal como os juízes, esperam pela alteração do seu estatuto.

Como é que o PCP olha para o Pacto da Justiça?
Como dizia a minha mãe, “a melhor prova do pudim é comê-lo”. Cremos nós que é preciso, perante uma proposta substantiva, encontrar as respostas. Não esquecendo que a celeridade e a eficácia da Justiça passa muito pelos meios, pelos recursos humanos. Não é admissível que para a Polícia Judiciária esteja aberto um concurso há seis anos, sem desenvolvimentos. As leis podem ser magníficas, mas é através da sua aplicação prática e através de forças para a aplicar que se encontra a melhor solução para, no quadro constitucional, se caminhar para uma Justiça que seja justa para todos e não desigual a partir das capacidades económicas de cada cidadão ou empresa. Se essas leis vieram corresponder a este princípio, com certeza que terão o apoio do PCP.

A chegada de Rui Rio à presidência do PSD pode indicar uma mudança de ciclo político?
Se fôssemos levados por algumas declarações no seio do PSD e no seio do PS, poderíamos estar perante o ensejo de alguns de repetirem essa coisa desgastada do bloco c. Para nós, o maior problema não é esse, é saber se vamos continuar um percurso com esses avanços com os passos em frente, se vamos procurar uma política alternativa capaz de responder aos problemas nacionais ou não. 

Mas o PSD parece ter um líder mais aberto a consensos com o PS e, nesse sentido, o PS pode ficar no melhor de dois mundos: fala com a esquerda, fala com a direita e faz acordo com quem melhor o servir...
Infelizmente, nesta ou naquela matéria – designadamente na legislação laboral – verificou-se um posicionamento chamado “geometria variável”, que foi inventado pelo António Guterres, mas obviamente não se pode estar bem com Deus e com o Diabo ao mesmo tempo, independentemente de quem seja o Diabo. Compete ao PS saber se continua este caminho que se tem verificado ou não.

Que pasta teria Jerónimo Sousa num Governo, se houvesse essa abertura?
Nunca pensei nisso. Não é uma ambição, nem um sonho. 

Jerónimo de Sousa tem prazo de validade à frente do PCP? Vai levar este mandato até ao fim, em 2020?
Em relação a lugares de responsabilidade, devemos ser nós os primeiros a decidir o que fazer e, em segundo lugar, ouvir a opinião franca dos meus camaradas de partido. Mais tarde ou mais cedo as responsabilidades serão alteradas, pelas leis da vida, designadamente. Modéstia à parte, o secretário-geral do PCP hoje vai a qualquer ponto do país, de Vinhais ao Corvo, e a forma como é recebido – não é pelos meus camaradas de partido, que esses manifestam a afectividade natural, é por muita gente que não é do meu partido a dizer: “Continue!”.

Um dos temas que vão em breve marcar o debate político é a legalização da eutanásia. O PCP já tem uma posição sobre esse assunto?
Em relação aos militantes do partido, não existe uma unidade de pensamento. Para nós, tem sido fundamental o debate que se faz. Surgem grandes interrogações. Cometeríamos um erro se esta discussão fosse entre médicos e juristas. Não pode ser, é um problema da sociedade e, como tal, tem de chegar o mais longe possível. Mas ainda não temos uma posição fechada.

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