Em breve, jovens não chegarão para satisfazer necessidades do mercado de trabalho
Jorge Malheiros, especialista em geografia da população, acredita que vai ser possível inverter a tendência de declínio populacional dentro de alguns anos.
Parece um paradoxo: a taxa de desemprego é hoje elevada entre os jovens. Mas, se a economia portuguesa retomar os valores médios de crescimento económico das últimas décadas, em breve o país não terá gente suficiente para as suas necessidades de mão-de-obra. Quem o diz é Jorge Malheiros, do Centro de Estudos Geográficos da Universidade de Lisboa.
Portugal está condenado ao declínio populacional?
De acordo com as projecções que temos feito, mantendo as actuais condições de fecundidade e de natalidade e um saldo migratório que agora é negativo, inevitavelmente teremos nove, oito milhões e eventualmente sete milhões de residentes em 2050, 2060. No próximo censo (2021) é provável que população portuguesa fique próximo dos 10 milhões. Os trabalhos que temos feito dizem, contudo, que a actual dinâmica do mercado de trabalho e as necessidades de inovação vão exigir a entrada de pessoas no país. O nosso mercado de trabalho vai precisar de mais gente e, com as actuais condições de natalidade, os jovens não vão ser suficientes para satisfazer as necessidades futuras.
Mas hoje a taxa de desemprego dos jovens é muito elevada.
O que se prevê é que isto comece a notar-se a partir do próximo decénio, admitindo que a economia portuguesa retome os valores médios de crescimento das últimas décadas. Se não, o país encolherá de tal maneira…Mas se retomarmos essas taxas de crescimento económico haverá necessidade de mais mão-de-obra. Se o número de estrangeiros que vier para cá e de portugueses que emigraram e decidem regressar for significativo, podemos passar a ter um saldo migratório positivo. Agora, isto não significa que tenhamos um grande crescimento populacional. Podemos é começar a estabilizar ou a crescer um pouco. E também não significa que a população se torne mais jovem. Para rejuvenescer precisávamos da entrada de pessoas a um ritmo da ordem das dezenas ou centenas de milhar de por ano.
Podemos falar, portanto, em crise demográfica?
Aqui há uns tempos falava-se da crise demográfica. Hoje tenho dúvidas de que se possa usar essa expressão. O que aconteceu foi uma transição muito rápida, o país envelheceu muito rapidamente. Isto obriga a um ajustamento rápido da sociedade. Mas nenhum país consegue viver de economia em declínio, de população em declínio. Tem de haver um reequilíbrio. Acredito que a situação irá inverter-se, mantendo-se no entanto a questão do envelhecimento. Uma pequena perda de população não é uma situação grave, o envelhecimento é processo natural, é bom que as pessoas vivam mais tempo, mas o processo tem de ser controlado. Não sendo uma crise, é contudo uma situação complicada, o défice de 24 mil é significativo e ainda temos um saldo migratório negativo. Esta situação comporta riscos — riscos de sustentabilidade da segurança social, do sistema do mercado de trabalho, défice de inovação. Actualmente, há um capital de esperança maior, as pessoas consomem um pouco mais, mas o nível efectivo de rendimento ainda não regressou aos valores de há 10 ou 12 anos atrás. As pessoas estão a ajustar-se, mas há alguma prudência na decisão de ter filhos.
Defende, pois, que temos razões para acreditar que a população possa voltar a crescer?
Temos razões para acreditar que isso possa acontecer no próximo decénio. Contudo, volto a frisar, o envelhecimento vai continuar. Há cinco anos, criou-se uma comissão para debater a questão da natalidade, mas não houve uma política efectiva, apenas pequenas medidas, sem uma estratégia nacional. O país não decidiu que um dos seus grandes desígnios era aumentar a natalidade. Ao nível das políticas, há um discurso simpático que não é acompanhado de políticas efectivas.