Bem podes esperar
A minha mãe ensinou-me que as queixas são um serviço público que se presta. Têm de ser honestas e inequívocas.
Come-se muito melhor no Norte do que no resto do país. Uma das razões é que as pessoas do Norte estão sempre atentas ao que comem. Exigem comer bem e sempre que isso não acontece queixam-se, primeiro com a boca, atacando a aldrabice e depois com os pés, nunca mais lá voltando.
A minha mãe ensinou-me que as queixas são um serviço público que se presta. Têm de ser honestas e inequívocas. Os aldrabões habituam-se a aldrabar porque os aldrabados calam-se, recompensando a aldrabice.
Aqui em Lisboa a cultura da queixa directa está há décadas em declínio, à medida que grassa a queixinha cobarde e desonesta de quem se quer vingar dum restaurante só porque não arranjou mais uma mesinha para sentar os priminhos que apareceram do nada.
No Porto aprendi, por causa dumas lulas muito gabadas que se revelaram uma grande merda, que a resposta correcta, quando insistem que são fresquíssimas e que é carbonizadas que ficam melhores, é "Então coma-as você!". A linha desenvolve-se bem: "se elas estão, de facto, tão boas como você diz, coma-as você que eu não lhes toco".
Aqui no Sul, quando se conta um desaire gastronómico, a réplica é sempre "De que é que estavas à espera?" A vítima é que é culpada por não ter previsto os maus tratos. "De que é que estavas à espera? Ganda otário! Não me digas que julgavas que ias ser bem servido àquela hora nessa parte da cidade? No Algarve, no Verão, a sério?"
Aqui somos cúmplices nas aldrabices, preparando-nos de antemão para sermos aldrabados. Sabemos tanto!