“A Volvo Ocean Race tem que evoluir e continuar a liderar”
Após liderar a Team France na America's Cup, o belgo-canadiano volta a assumir o lugar de estratega da Dongfeng e afirma que o objectivo é vencer a prestigiada prova de vela.
Treze dias depois de partirem da África do Sul e de contornarem o Cabo da Boa Esperança, os Volvo Ocean 65 da MAPFRE e da Dongfeng têm Melbourne à vista. Tal como aconteceu na segunda etapa, o duelo pela vitória na terceira perna da Volvo Ocean Race (VOR) 2017-18 será entre o veleiro espanhol e o barco franco-chinês e tudo ficará decidido entre sábado e domingo. Antes de as sete tripulações zarparem da Cidade do Cabo rumo aos difíceis e frios mares do Índico Sul, o PÚBLICO conversou com Bruno Dubois, team manager e estratega da Dongfeng. De sorriso fácil e com um currículo de respeito como velejador, este belgo-canadiano, de 58 anos, assume pela segunda vez consecutiva o papel de principal responsável da equipa de bandeira chinesa e admite que a Dongfeng precisa de ganhar “consistência”. Dubois, que este ano liderou também a Team France na 35.ª America’s Cup, reconhece que a continuação do projecto francês na prova está num impasse, após a saída do principal patrocinador.
Que balanço faz da participação da Dongfeng até ao momento na VOR? Começaram com um terceiro lugar, depois ficaram em segundo. Satisfeito?
A primeira etapa não nos correu bem. Não conseguimos acompanhar o ritmo dos mais fortes na parte inicial, mas recuperámos e terminámos na terceira posição. Na segunda liderámos 12 dias, mas cometemos um erro grave e caímos para quarto ou quinto. Recuperámos até à segunda posição, o que foi positivo. Mostrou que o barco está rápido. Ainda estamos um pouco inconstantes. Quando ganharmos consistência estaremos em grande. A equipa tem encontrado forma de colocar o barco a andar rápido, o que é uma boa notícia.
Como explica o erro na segunda etapa, que acabou por entregar a vitória à MAPFRE?
Decidimos fazer o gybe [manobra em curva na qual o veleiro arriba até que as velas mudem de bordo] um pouco tarde. Ao virar mais tarde, fugíamos ao relatório com a actualização das posições e ninguém iria ver a nossa manobra durante seis horas. Mas eles [MAPFRE] anteciparam-se. Foi um erro.
Neste arranque, a Dongfeng, a MAPFRE e a Vestas parecem estar num patamar superior à concorrência. Vai ser uma corrida a três?
Não, acho que os outros ainda vão recuperar. Têm excelentes velejadores nas tripulações. Começaram a preparação mais tarde e talvez precisem de um pouco mais tempo, mas acredito que vão começar a aparecer forte nas próximas etapas.
Em 2014-15, após partir o mastro na etapa entre Auckland e Itajaí, o terceiro lugar da Dongfeng na classificação final foi considerado uma vitória. Desta vez, qualquer resultado que não seja o primeiro será uma derrota?
Ser terceiro não será uma vitória… Será razoável, mas não é aquilo que procuramos.
É amigo próximo de Mark Turner, o anterior CEO da VOR. Ficou surpreendido com a sua demissão em Outubro?
Sim e não. Sim, porque via o Mark completamente empenhado neste projecto. Não, porque ele não é um homem de “planos B”. Pediram-lhe para arranjar um plano alternativo às propostas que tinha anunciado e ele disse que não. É um homem de palavra e quando afirma algo, é isso que quer fazer. Respeito a sua escolha. Provavelmente teria feito o mesmo.
Gostava do “plano A”? As alterações anunciadas em Maio eram do seu agrado?
Gostava. O pouco tempo que iria haver entre esta e a próxima edição parecia-me curto, mas era ok. A minha única real preocupação era o tamanho das tripulações a bordo, que me parecia insuficiente. Não permitia a evolução de novos velejadores.
Qual é a sua opinião sobre o VO65, o barco que está a ser usado nesta edição?
É fantástico…
Acha que na próxima edição deve ser novamente utilizado?
O VO65 pode fazer, sem dúvida, mais uma edição, mas não me desagrada que surja um novo barco.
E esse novo barco deve ser o veleiro de 60 pés (18,28 metros) anunciado por Mark Turner em Maio?
Não sei se vão manter esse projecto. Talvez avancem para outro ou que mantenham o VO65. Mas precisam de mais alguma coisa, se não as pessoas deixam de participar. É preciso evoluir.
Há quem considere o projecto do barco de 60 pés demasiado radical e com custos excessivos…
Não me parece. Não temos que regressar aos barcos dos anos 80. A VOR tem que evoluir e continuar a liderar. Não deve manter os mesmos barcos durante muito tempo. O barco anunciado pelo Mark era excelente e extremamente rápido. Um verdadeiro foguete. Mas no final, não teve a aprovação da Volvo…
O seu projecto anterior foi na America's Cup, onde liderou a Team France. Nessa altura lamentou a falta de tempo. É um cenário bem diferente daquele que encontrou agora na VOR com a Dongfeng.
Na America's Cup faltou tempo e de dinheiro. Aqui temos tempo e dinheiro. É a grande diferença e torna tudo mais fácil (risos).
Com as limitações que encontrou no projecto Team France, ficou satisfeito com o resultado alcançado na America's Cup?
Ficamos em último, por isso não fiquei satisfeito. Fizemos algumas boas corridas, conseguimos vencer a Land Rover BAR e a Artemis. Foi um ensaio para o futuro, mas infelizmente a Groupama optou por não continuar no projecto e essa é a parte da desilusão. Não nos permite continuar em frente.
Com o afastamento da Groupama, em 2021 a Team France estará na 36.º America's Cup?
Não sei. O Franck [Cammas] está a tentar. Ele tem alguns contactos. Espero que consiga ter sucesso e que seja possível ter a Team France na Nova Zelândia.
Consigo novamente a team manager?
Veremos… Para já estou focado na Volvo Ocean Race, veremos depois.
A America's Cup é a única grande competição de vela que a França nunca venceu. O que é que precisa para dar essa vitória aos franceses?
Será preciso tempo e, no mínimo, de 70 milhões de euros. Para já, temos tempo e um par de patrocínios que não são suficientes. O Frank está a trabalhar, mas será preciso reformular a equipa.
Qual é o prazo limite para encontrar um patrocinador que substitua a Groupama?
Não se pode prolongar muito além do que o final deste ano, talvez um pouco mais. No limite, no final de 2019 tem que estar tudo pronto.
O que acha do barco anunciado pelos neozelandeses para a 36.ª America's Cup?
Gosto do barco, mas será rápido. Não teremos spinnakers [velas de grande dimensões à frente do mastro] e será algo similar a um multicasco. Não será um regresso ao passado e à tradição, como os neozelandeses diziam que iria ser. A diferença é ser um monocasco. Haverá um enorme desenvolvimento dos foils e provavelmente mais tripulação. Se o barco funcionar, será uma evolução fantástica para a comunidade da vela.
Quando terminar a VOR qual será o seu próximo projecto?
Aprendi uma lição na AC: temos que nos focar, como o Grant Dalton [CEO da Team New Zealand] se focou na Cup. Agora quero focar-me na VOR, fazer o melhor que sei, e quando acabar verei. Tenho a certeza que vão surgir propostas para fazer algo interessante.