Realizador Peter Jackson admite que pôs actrizes na “lista negra” a conselho de Weinstein
Ashley Judd e Mira Sorvino deviam ter entrado na trilogia O Senhor dos Anéis, mas a companhia de Harvey Weinstein desaconselhou, dizendo que era “um pesadelo trabalhar com elas”. Ambas teriam já recusado os avanços sexuais do produtor. E ambas agradecem agora a "honestidade" do realizador e guionista neo-zelandês.
Mira Sorvino ficou simplesmente “agoniada” ao saber, através das declarações do realizador Peter Jackson, que terá sido sido preterida para vários papéis por causa de Harvey Weinstein, o todo-poderoso produtor de Hollywood caído em desgraça devido a uma (longa) série de acusações de violência sexual sobre mulheres.
O homem por trás da trilogia O Senhor dos Anéis admitiu que a actriz de Poderosa Afrodite e Ashley Judd, uma das protagonistas de filmes como Risco Duplo e Beijos que Matam, entraram para uma “lista negra” de profissionais a não contratar a conselho da empresa de Weinstein, noticia a imprensa internacional.
As duas actrizes, que contracenaram juntas em Norma Jena & Marilyn (1996), estão entre as mais de 20 mulheres que já vieram a público dizer que foram assediadas pelo produtor, alegações que levaram à abertura de várias investigações policiais. Foram das primeiras a falar da conduta predatória de Weinstein, logo em Outubro.
Segundo a britânica BBC, Weinstein já rejeitou as acusações tanto de Sorvino como de Judd, garantindo que também nunca sugeriu que fossem postas numa “lista negra”. Até aqui, aliás, tem negado qualquer das denúncias de sexo não consensual que o envolvam.
As declarações de Peter Jackson foram feitas a um site neo-zelandês e parecem não deixar dúvidas quanto à actuação da companhia dirigida pelo produtor: “Lembro-me de a Miramax nos dizer que era um pesadelo trabalhar com elas e que devíamos evitar fazê-lo a todo o custo. Isto foi provavelmente em 1998.”
Jackson e a sua equipa tinham pensado integrar as duas actrizes no elenco dos blockbusters baseados nos livros de J. R. R. Tolkien, mas depois da conversa que o realizador agora relatou, mudaram imediatamente de ideias. “Naquela altura, não tínhamos qualquer razão para duvidar do que aqueles rapazes nos estavam a dizer”, continuou. Hoje, admite, o cenário é diferente: “Agora suspeito que nos deram falsas informações sobre estas duas mulheres talentosas e, como resultado director, os seus nomes foram retirados da lista dos actores que queríamos contratar.”
As duas mulheres usaram agora a rede social Twitter para agradecer a Peter Jackson o facto de ter reconhecido, publicamente, que cedera à pressão de Harvey Weinstein.
Ashley Judd, cita a revista Variety, lembra-se de ter sido convidada para conhecer os bastidores da trilogia que estava a ser preparada – toda a parte criativa, a história, os figurinos. Chegaram mesmo a perguntar-lhe qual papel preferiria interpretar de entre dois que lhe foram propostos mas, depois, eventualmente pós-conversa com a Miramax, a actriz nunca mais recebeu qualquer contacto da equipa de Jackson. “Gosto de ver a verdade vir ao de cima. Obrigada, Peter”, twitou Judd.
Mira Sorvino, por seu lado, reconheceu ter desatado a chorar mal tomou conhecimento das declarações do realizador de O Senhor dos Anéis: “Isto é a confirmação de que Harvey Weinstein fez a minha carreira descarrilar, algo de que eu já suspeitava mas não estava certa. Obrigada Peter Jackson pela honestidade. Estou simplesmente agoniada.”
Reagindo às revelações de ingerência do realizador, Weinstein fez saber através de um comunicado, que não teve nada a ver com o afastamento das duas actrizes, recordando que o casting da trilogia foi feito pela New Line Cinema e não pela sua Miramax.
O porta-voz do produtor lembrou ainda, escreve o diário britânico The Guardian, que Weinstein continuou a integrar Ashley Judd no elenco dos seus filmes, mesmo depois de a actriz ter alegadamente sido vítima de abusos indesejados do produtor, e que o nome de Mira Sorvino foi considerado para outros projectos em que esteve envolvido.
Jackson ripostou reafirmando o que dissera e precisando que, no ano e meio em que estiveram a preparar a trilogia, ele e a sua equipa tiveram inúmeras conversas sobre o elenco com o produtor, o seu irmão Bob e muitos dos executivos da empresa de ambos.
É verdade, escreveu Peter Jackson numa resposta a Weinstein publicada pela revista Entertainment Weekly, que “os filmes mudaram da Miramax para a New Line Cinema antes de o elenco estar fechado mas, porque a Miramax nos tinha avisado em relação à Ashley e à Mira, e porque nós fomos suficientemente ingénuos para acreditar que nos tinham dito a verdade, nunca falámos nos nomes delas quando conversámos com a New Line”.
Peter Jackson disse não ter conhecimento, nas últimas décadas, de que Harvey Weinstein era suspeito de fazer do abuso sexual prática corrente, mas explicou que deixou de trabalhar com os irmãos Weinstein porque eles se comportavam como “rufias da máfia de segunda categoria”.
Tanto o diário The New York Times como a revista The New Yorker, pontas de lança na divulgação das práticas predatórias de Weinstein – foram os primeiros trabalhos destas duas publicações americanas, aliás, que desencadearam o escândalo de assédio e violência sexual que há meses assombra Hollywood e que já se alastrou a outras geografias e áreas, da política à televisão, passando pelo desporto, pelas artes plásticas e pela música erudita – já alertaram para a rede de espiões, jornalistas e outros profissionais dos media e da indústria entretenimento que ajudaram o produtor a evitar ver o seu comportamento exposto ao longo das últimas décadas ou a retaliar contra todos os que ameaçassem denunciá-lo.
As actrizes Annabella Sciorra, Darryl Hannah e Salma Hayek estão entre as que acusaram publicamente o produtor de as ter assediado ou mesmo violado, prejudicando ou ameaçando prejudicar em seguida as suas carreiras. Hayek diz mesmo que Weinstein chegou a dizer que a matava.