Delgado deixa Governo e Paula Brito e Costa a Raríssimas

Secretário de Estado da Saúde demite-se na sequência de entrevista da TVI em que entra em contradição quanto à sua relação com a Associação de Deficiências Mentais e Raras.

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dro Daniel Rocha
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MARIO CRUZ

Foi a 14.ª remodelação do Governo e foi feita em tempo recorde. A notícia da demissão do secretário de Estado da Saúde, Manuel Delgado, no âmbito do escândalo da associação Raríssimas, foi avançada nesta terça-feira pelo PÚBLICO por volta das 15h15 e rapidamente o Governo apresentou uma substituta.

Cerca de dez minutos depois o Expresso dava conta da demissão de Paula Brito e Costa, a presidente da Raríssimas (Associação de Deficiências Mentais e Raras) sobre a qual a TVI revelou vários dados que indiciam irregularidades graves na gestão da instituição. Às 15h52, uma nota do gabinete do primeiro-ministro comunicou que António Costa aceitou o pedido de exoneração de Manuel Delgado e propôs o nome de Rosa Zorrinho para ocupar o cargo. E quatro horas e 15 minutos depois, o Presidente da República dava posse à nova secretária de Estado da Saúde, que ocupava o cargo de presidente da Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo desde 2016.

Com a saída de Manuel Delgado, o Governo tenta estancar uma polémica que o país acompanha incrédulo. Ao contrário do que afirmou, na segunda-feira, o ministro do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, Vieira da Silva, foram feitas várias denúncias sobre a Raríssimas, a primeira das quais a 9 de Agosto passado, a que se seguiram duas em Setembro e uma quarta em Outubro.

O até agora secretário de Estado da Saúde foi consultor daquela instituição, tendo por essa colaboração recebido 63 mil euros, entre 2013 e 2014. A sua demissão ocorreu nesta terça-feira, após uma entrevista em que a jornalista da TVI Ana Leal confrontou o então ainda secretário de Estado com novas provas do seu envolvimento com a Raríssimas e com contradições em relação ao que começou por afirmar sobre a sua relação com esta Instituição Particular de Solidariedade Social. Na entrevista, o governante foi confrontado com questões às quais não respondeu e acabou por pedir a demissão, embora tenha chegado a afirmar que falara com o ministro da Saúde e que este lhe dissera não ver “razão objectiva” para o secretário de Estado se demitir.

Durante a entrevista, a jornalista confronta Delgado com uma viagem ao Brasil, até aqui não mencionada, feita na companhia da presidente da Raríssimas, e são exibidas imagem que sugerem uma relação pessoal com Paula Brito e Costa. Delgado começa por dizer que ter viajado no mesmo avião que a presidente da Raríssimas não significa que a associação tenha pago a viagem, mas reconhece que a reserva foi feita por esta entidade. E afirma que a sua vida privada só a si diz respeito.

Manuel Delgado negou que como consultor tivesse conhecimento ou participado em decisões referentes ao financiamento e gestão da Raríssimas. "Seria indelicado intrometer-me em alguma coisa para a qual não fui convidado”, declarou, afirmando que nunca teve acesso a balancetes da associação. Mas mais à frente, confrontado com um email enviado pelo ex-tesoureiro da Raríssimas, admitiu ter recebido a comunicação, cujos números não retivera. O email dava conta da difícil situação financeira da instituição com 351 mil euros em falta. “Pelos vistos foi-me enviado”.

Quanto ao facto de ter sido informado de que a sua colaboração seria paga com verbas do Fundo de Socorro Social, Delgado disse não achar isso imoral. “Tenho um contrato assinado com uma entidade que me contratou para ser consultor, portanto eu não vou dizer ‘eu não vou receber’. Não acho imoral!” Mas negou ter imposto as condições que Paula Brito e Costa menciona, noutro email a que a TVI ter acesso: 12 mil euros, com carro e seguro de saúde”.

À hora a que passava esta entrevista na TVI já Paula Brito e Costa anunciara a sua demisão, que terá comunicado já na segunda-feira de manhã aos trabalhadores da instituição. “A minha presença já está a afectar a instituição e tenho de sair. Esta é uma cabala muito bem feita”, queixou-se ao Expresso, numa entrevista dada de manhã. “Deixo à Justiça o que é da Justiça, aos homens o que é dos homens e ao meu país uma das maiores obras, mas mesmo assim saio. Presa só estou às minhas convicções”.

A agora ex-presidente saiu no mesmo dia em que um inspector do Trabalho e da Segurança Social entrou na Raríssimas, no âmbito da investigação “global urgente” ordenada pelo ministro da Solidariedade. Ainda ao Expresso, Paula Brito e Costa confessou que teve de refrear a vontade de se sentar, “lado a lado”, com o inspector e dizer-lhe: “Vá, vamos lá, diga-me factura a factura o que é preciso explicar”.

Quanto ao salário-base de três mil euros, a que se somavam ajudas de custo e de deslocação de valor equiparável, “era justo”, segundo a própria, para quem “sabe a que horas entra mas não a que horas sai”. Está cima do previsto na lei para os dirigentes de uma IPSS, mas o cargo que ocupava, alegou, não se encaixava nessa categoria: “Não sou remunerada enquanto presidente da instituição. Eu sou uma empregada por conta de outrem e saio por isso do regime das IPSS. Tenho um contrato de trabalho com uma empresa que diz que sou directora-geral.” O marido, Nélson Oliveira Costa, e o filho também trabalham na instituição, e o mais certo é que este último tenha deixado de ser o “herdeiro da parada”, como se lhe referira Paula Brito e Costa, na reportagem da TVI.

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