Mudanças em Angola ainda não chegaram ao Fundo Soberano gerido por “Zenú”
Filho de José Eduardo dos Santos, exposto nos Paradise Papers, fica mais isolado ao 50.º dia de João Lourenço como Presidente.
O sinal dado por João Lourenço com o afastamento de Isabel dos Santos da Sonangol ao 50.º dia como Presidente deixa mais isolado outro vértice do poder económico que continua sob o controlo da família do ex-chefe de Estado – o Fundo Soberano de Angola (FSDEA), liderado desde 2013 por José Filomeno dos Santos.
É pressão a somar à pressão que já pairava no ar, ainda mais adensada nos últimos dias com as revelações dos Paradise Papers sobre o destino dos investimentos do Fundo, dotado de 5000 milhões de dólares.
“Zenú”, como é conhecido José Filomeno dos Santos, aparece referenciado no dossier do Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação (CIJI) pelas ligações ao empresário suíço-angolano Jean-Claude Bastos de Morais, a quem Filomeno, seu amigo próximo, confiou aplicações do Fundo no centro offshore das Maurícias. Em causa está a concentração de recursos em fundos de investimento do grupo Quantum Global, de Bastos de Morais, com remunerações consideradas altas para a sociedade gestora dos activos.
Mas se há quem peça (fê-lo Rafael Marques) para João Lourenço usar os Paradise Papers como pretexto para destituir agora Filomeno dos Santos, não se conhecem mudanças no FSDEA. Além da liderança do fundo, “Zenú” é referido na imprensa angolana como estando ligado à empresa de análises laboratoriais de alimentos Bromangol – e em relação a esta empresa João Lourenço mandou rescindir o contrato de concessão com o Estado.
Há nuances a observar. Se a dimensão internacional dos Paradise Papers trouxe para a primeira linha a forma opaca como é gerida boa parte dos 5000 milhões de dólares do Fundo Soberano, pôs a descoberto outras ramificações do poder económico em Angola, colocando em relevo grandes projectos onde o empresário amigo de Filomeno dos Santos tem interesses.
Um deles é a construção do porto de águas profundas de Caio, na província de Cabinda, uma Parceria-Público Privada que Jean-Claude Bastos de Morais e o próprio João Lourenço visitaram em conjunto há poucos meses, quando o agora Presidente era ainda candidato pelo MPLA. Aliás, uma das imagens que agora salta à vista é uma fotografia que a Quantum Global publicou em Abril no seu site para assinalar o momento, mostrando os dois, lado a lado, a observarem o local da obra.
Internamente, a União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA) já defendeu a abertura de uma investigação ao estado do Fundo Soberano, que segundo as contas oficiais de 2016 registou um resultado positivo de 44 milhões de dólares (perto de 37 milhões de euros).
Filomeno dos Santos começou por ser administrador do FSDEA e, em Junho de 2013, subiu a presidente do conselho de administração, onde só têm assento mais dois membros, quando Armando Manuel, então à frente do FSDEA, foi chamado a ministro das Finanças por José Eduardo dos Santos.
Assim que as investigações dos Paradise Papers apareceram na imprensa internacional, o FSDEA contestou as “alegações infundadas” e garantiu que as operações de investimento são realizadas “de forma legítima e responsável em todas as jurisdições”.
Um fundo soberano é um instrumento usado por alguns países para preservar o património do Estado ou rentabilizar recursos, fazendo aplicações financeiras com as verbas obtidas a partir de fontes de receita públicas, muitas vezes a exploração de petróleo, como é o caso do FSDEA, criado em 2012.