Wilbur Ross: "Não há nada de incorrecto" nos Paradise Papers
Secretário do Comércio dos EUA tem uma participação numa empresa que recebeu milhões de rendimentos através de uma parceria com uma companhia russa detida por, entre outros, um genro de Vladimir Putin. Democratas pedem investigação.
Na sequência da publicação da mais recente fuga de informação sobre offshores, os chamados Paradise Papers, Wilbur Ross, actual secretário do Comércio da Administração norte-americana, disse já que “não há nada de incorrecto” em relação à ligação entre uma das suas empresas e uma companhia russa detida por, entre outros, o genro de Vladimir Putin. Apesar disso, os democratas pediram já um inquérito sobre estes negócios do multimilionário.
Segundo os milhões de documentos que compõem os Paradise Papers, e analisados pelo Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação (ICIJ), Ross detém uma participação numa empresa de transporte marítimo – a Navigator Holdings Ltd - que recebeu desde 2014 dezenas de milhões de dólares através de uma parceria empresarial com a Sibur, uma companhia russa de gás com sede em Moscovo, e cujo co-proprietário é Kirill Shamalov, marido de Katerina Tikhonova, filha de Putin, e também Gennady Timchenko, um oligarca com diversas actividades no sector energético que, segundo o Departamento do Tesouro dos EUA, estão “directamente ligadas a Putin”. Além disso, esta parceria terá começado numa altura em que os EUA e a União Europeia aplicavam os primeiros pacotes de sanções contra a Rússia devido à intervenção militar na Crimeia.
Ora, estas revelações aprofundam as suspeitas de ligações entre membros da actual Administração Trump e Moscovo, bem como o alegado conluio entre a campanha do agora Presidente norte-americano e o Kremlin que está neste momento sob investigação nos EUA.
Um dos primeiros a reagir a estas novas informações foi o senador democrata Richard Blumenthal, que pediu uma investigação ao caso, considerando que Ross “enganou” o Senado durante a audiência para a nomeação do multimilionário como secretário do Comércio em Janeiro.
O democrata faz parte do comité do Comércio do Senado norte-americano que, em Fevereiro, aprovou a nomeação de Ross para a Administração Trump. Agora, com estas revelações, Blumenthal argumenta que o multimilionário de 19 anos omitiu ao painel de senadores o papel na Navigator.
“Ao ocultar os seus interesses nestas empresas de transporte – e a sua actual relação financeira com oligarcas russos – o secretário Ross enganou-me, ao comité do comércio do Senado e ao povo americano”, disse o senador em comunicado. “As divulgações financeiras do secretário Ross são com as bonecas russas [as matrioscas], com conflitos de interesse flagrantes cuidadosamente escondidos em empresas holding aparentemente inócuas”, acrescentou.
Ross diz que estas declarações são “totalmente incorrectas”, já que a sua participação na Navigator foi divulgada em três pontos separados ao departamento de ética do Governo dos EUA. Além disso, o secretário do Comércio garante que não fez parte da negociação do acordo com a Sibur e que nunca conheceu qualquer accionista da empresa russa que tenha sido alvo de sanções norte-americanas.
Em Londres, Ross explicou também que é “incorrecto” classificar esta relação entre a Navigator e a Sibur como uma parceria. “A Navigator freta navios e um dos seus clientes – um grande cliente de charters – acabou por ser a Sibur”, declarou aos jornalistas, citado pelo Guardian. “As negociações para comprar estes navios e as negociações para fretar os navios à Sibur realizaram-se antes de eu me tornar director da Navigator”, acrescentou.
“O ponto mais importante é o de que a Sibur não foi sancionada na altura em que a Navigator realizou o acordo nem é alvo de sanções actualmente, por isso não existe qualquer proibição decorrente das sanções contra quaisquer negócios com a Sibur”, continuou Ross.
As reacções sobre a divulgação dos Paradise Papers não se ficaram por aqui, já que o caso atingiu várias figuras políticas um pouco por todo o mundo.
Um dos responsáveis políticos a reagir foi Pierre Moscovici, comissário europeu dos Assuntos Económicos, que, através do Twitter, garantiu não estar surpreendido com as notícias e que é preciso fazer algo no seio da União Europeia para impedir a fuga aos impostos: “Muito terá de ser feito ao nível europeu, mas nós temos de ir mais longe e mais depressa com os Estados membros”.
“É tempo de completar o pacote da União Europeia contra a evasão fiscal com decisões rápidas sobre os intermediários e a lista negra dos paraísos fiscais”, acrescentou noutro tweet.
Como não podia deixar de ser, Julian Assange, o fundador do Wikileaks, também veio a público elogiar a fuga de informação, considerandos os Paradise Papers “óptimos”, mas realçou que não são suficientes.