Cresceu a "base de dados" sobre os micróbios que vivem no nosso corpo
Investigadores analisaram 1631 novas amostras de comunidades de micróbios que habitam os intestinos, a pele, a boca e a zona vaginal. Os dados podem servir para fortalecer o importante papel que já se sabe que estes microorganismos têm na saúde humana
Mais ou, pelo menos, tanto como os nossos genes, os quase dois quilos de microorganismos que carregamos tornam-nos únicos. Além disso, as diversas comunidades de micróbios que fazem parte de nós já foram associadas a várias doenças, desde as alergias até ao cancro, representando hoje um dos campos mais promissores da ciência. Um artigo publicado na Nature apresenta o resultado de uma nova fase do Projecto Microbioma Humano (PMH), o maior projecto de sequenciação desta imensa comunidade de micróbios que existe no corpo humano.
Uma equipa de cientistas nos EUA analisou 1631 novas amostras de comunidades microbianas de 265 voluntários saudáveis. Ainda estamos muito longe de uma visão completa deste mundo invisível feito de feito de bactérias, fungos e vírus mas este trabalho consegue triplicar os dados que tínhamos sobre a diversidade de micróbios que habitam o corpo humano. Na primeira fase do PMH foram analisadas cerca de 700 amostras, o que faz com que o projecto some agora um total de 2355 amostras analisadas. Esta é a segunda fase do Projeto Microbioma Humano, lançado em 2007 para identificar e caracterizar micróbios humanos, explorar a relação dos micróbios com a saúde e doenças e desenvolver ferramentas computacionais para analisar os micróbios.
O novo estudo inclui dados sobre os micróbios que estão nos intestinos, na pele, na boca e no microbioma vaginal que permitem identificar diferenças que são exclusivas dos micróbios de um indivíduo, rastreá-las no corpo identificando os locais onde se instalam e ao longo do tempo. Por outro lado, o trabalho também oferece muita informação sobre os perfis de microorganismos não bacterianos, como os vírus e fungos.
"Este estudo deu-nos as informações mais detalhadas que temos até hoje sobre quais os micróbios e processos moleculares que ajudam a manter a saúde no microbioma humano", refere Curtis Huttenhower, professor associado de biologia computacional e bioinformática da Harvard Chan School e autor do estudo, num comunicado de imprensa sobre o trabalho Através de técnicas de sequenciação de ADN, os cientistas “conseguiram identificar com precisão os organismos que estão presentes em vários locais do corpo, bem como o que eles podem ser capazes de fazer”, adianta o comunicado. “A análise dos micróbios em vários momentos permitiu ainda determinar quais as partes de uma comunidade que podem mudar lentamente, rapidamente ou permanecerem relativamente estáveis ao longo do tempo.”
Actualmente, é indiscutível a importância deste “órgão invisível” que é o mundo dos micróbios que nos habita, e que já foi considerado como o “segundo genoma humano”. Praticamente todos os dias, há um novo estudo que associa uma parte do microbioma humano à saúde. Uma das frentes de trabalho mais exploradas é aquela que se dedica a estudar o intestino mas eles, os micróbios, estão por todo o nosso corpo. Fazem de nós seres únicos, cada indíviduo tem o seu mundo de micróbios. Às vezes, protegem-nos e ajudam-nos, outras vezes, abrem caminho para doenças. Há estudos que revelam que são eles, os micróbios na nossa pele, por exemplo, que ajudam a explicar coisas tão simples como uma pessoa ser mais ou menos picada por mosquitos. Outras investigações associam os micróbios a problemas bem mais complexos como a nossa susceptibilidade para doenças crónicas ou neurodegenerativas, obesidade, VIH, cancro ou autismo. No fundo, conclui-se, os nossos milhões de milhões de micróbios (teremos dez vezes mais micróbios do que células no corpo) influenciam a nossa saúde. Para o bem e para o mal.
No entanto, para Curtis Huttenhower uma das principais conclusões a tirar deste estudo é precisamente constatar o quanto ainda não sabemos sobre o microbioma humano. "Assim como o sequenciação do genoma humano, sem informações sobre variabilidade ou contexto, não conduziu imediatamente a novas drogas ou terapias, também precisamos olhar para o microbioma com uma lente extremamente fina, em muitos contextos diferentes, para podermos entender e actuar sobre suas mudanças específicas em qualquer doença ou indivíduo", referiu Jason Lloyd-Price, do Instituto Broad e autor principal do estudo.
“Estas comunidades de organismos são extremamente complexas. Este estudo é um grande avanço para a comunidade científica”, considera Anup Mahurkar, investigador no Instituto de Ciências do Genoma e outro dos autores do artigo. O resultado do estudo vai garantir uma nova e mais alargada “base de dados” para os cientistas que investigam o papel dos micróbios na doença e na saúde.