Carminho e os Tribalistas: “Fiquei muito orgulhosa de fazer parte desta tribo”

Carminho co-assina dois dos temas do novo disco dos Tribalistas, Trabalivre e Os peixinhos, e canta e toca num deles. Um orgulho, diz ela — que os teve por referência na juventude.

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Carminho Miguel Manso

Ela já sabia do dia do lançamento, mas guardou segredo. Tribalismo oblige. No Brasil houve quem se agastasse por não ter havido aviso prévio à imprensa, mas até nisso os Tribalistas quiseram surpreender. A cantora e fadista Carminho, que assina em co-autoria com o grupo dois dos temas do disco, diz ao Ípsilon: “Eles tiveram essa ideia de o apresentar ao público privilegiando o online e escondendo até ao último dia como o iam fazer. Também aqui houve novidade.”

Da parte dela, o contacto com o Brasil e com músicos brasileiros já vem de há algum tempo. Em finais de 2016 lançou um disco integralmente dedicado a Tom Jobim, como corolário da sua ligação musical ao Brasil. Quanto aos Tribalistas, ela já gravara com Marisa Monte a canção Chuva no Mar, que incluiu no seu disco Canto, de 2014 (Marisa incluiu essa mesma canção na sua colectânea Coleção, de 2016, que reunia temas quase inéditos e raridades); e participara no espectáculo que Arnaldo Antunes apresentou no São Luiz, em 12 e 13 de Novembro de 2016, do qual resultou um CD/DVD ao vivo já editado e nas lojas portuguesas. Cantou com ele Vilarejo e Do vento e também o tema Velha infância, dos Tribalistas, já no final, com ele e os outros dois convidados, Manuela Azevedo e Hélder Gonçalves, dos Clã.

“Isto tem sido uma amizade que se tem criado”, diz Carminho. “Comecei a ir bastantes vezes ao Brasil e nalgumas dessas vezes convidavam-me sempre para ir lá a casa, estar com eles. Eles funcionam muito em tribo, estamos sempre todos juntos e fazemos bastantes coisas. E começámos também a tirar do baú algumas composições que tínhamos.” Ela mostrou-lhes uma parte de uma composição que não estava terminada, Os peixinhos, e, com Marisa, alinhavou ideias para outra, Trabalivre. “Eu tinha já há algum tempo estas primeiras frases, ‘os peixinhos são/ flores sem o chão’, já com uma música, começámos com uma guitarra a cantar e foram surgindo ideias que não estavam ainda completas.” Depois eles foram para a Bahia, para casa de Carlinhos Brown, convidaram-na para fazer parte desse encontro, mas ela não pôde ir. “Infelizmente. Porque foi aí que reuniram todas as canções e algumas coisas inacabadas que tinham para as terminar. Eu não sabia que iria ser um disco dos Tribalistas, sabia que eles estavam a terminar as canções.” Os peixinhos ganhou vida assim. “Quando eles vieram da Bahia com aquilo feito, mostraram-me e eu achei que estava espectacular.”

"Um momento maravilhoso"

Mas não esperava o que se seguiu. “Fiquei muito surpreendida quando a Marisa Monte me ligou a dizer que as duas parcerias iam entrar no disco e que gostavam muito que eu cantasse a dos peixinhos.” Mas não hesitou, perante o convite e rumou ao Brasil na mesma altura em que foi fazer os concertos do disco de Tom Jobim lá. “Foi um momento maravilhoso. Eles optaram por fazer sessões contínuas, dez dias para fazer os dez temas e gravar os vídeos todos.”

Trabalivre, o outro tema, nasceu de uma coisa em que ela andava a pensar na altura. “Uma ideia que partilhei com a Marisa Monte, sobre os cantos de trabalho. Existem muitos cantos de trabalho em Portugal e foi feita até a captação de muitos deles, nos anos 1970, por Michel Giacometti; eram uma forma de ajudar o povo a trabalhar e a ganhar ritmo nas suas tarefas, e isso era fundamental muitas vezes para se suportar muitas horas a trabalhar, não só no campo mas também na pesca. Fomos então à procura desses cantos de trabalhos também no Brasil, como o dos boiadeiros, a forma como eles trabalhavam a voz e faziam os seus pregões, e começámos a criar aquela primeira frase (‘um dia minha mãe me disse:/ ‘você já é grande, tem que trabalhar’) como âncora de trabalho. Eles completaram-no depois com outros versos na Bahia. Os contributos surgem muitas vezes assim, depois as coisas ganham forma.”

Ganham forma como as amizades, ou a música. “Fiquei muito orgulhosa de fazer parte desta tribo”, diz Carminho ao Ípsilon, com satisfação. “Eles dizem que eu já sou uma tribalista e eu rio-me. Porque os Tribalistas fizeram parte do meu universo musical de juventude e acompanharam grande parte da minha vida. E isso é muito especial para mim.”

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