Jay-Z pergunta: e se Friends tivesse um elenco negro?
Moonlight, o novo teledisco do rapper Jay-Z, envolve uma recriação de Friends com um elenco composto só por actores negros.
Ao longo de dez anos, de 1994 a 2004, Friends foi uma das mais bem-sucedidas e amadas sitcoms de sempre. Centrando-se num grupo de seis amigos na casa dos 20 e 30 a viverem em Nova Iorque, mostrava um mundo em que muito poucas pessoas que não fossem brancas existiam e interagiam com os protagonistas.
O novo teledisco do rapper Jay-Z para Moonlight, tema do recente 4:44, tenta chamar a atenção para isso e para a forma como a televisão tem vindo a evoluir desde então. No vídeo, disponibilizado há uma semana na plataforma de streaming de música TIDAL (da qual Jay-Z é um dos donos) e chegado hoje ao YouTube, é feito um remake parcial de The One Where No One’s Ready, o 50.º episódio de Friends e o segundo da terceira temporada, mas com actores negros do mundo da comédia actual em vez do elenco original. E tem ainda mais do que isso.
O vídeo inclui uma recriação do genérico da sitcom, filmado exactamente na mesma fonte do original, mas sem I’ll be there for you a canção dos Rembrandts que dava música à cena. Em vez dela, e por sugestão do próprio Jay-Z, ouve-se Friends, o clássico de 1994 do grupo de rap Whodini.
O novo elenco que dá vida a esta recriação é composto por: Jerrod Carmichael, o cómico de stand-up, que faz Ross; Issa Rae, criadora e estrela de Insecure, que faz de Rachel; Tessa Thompson, da série Westworld e filmes como Creed: O Legado de Rocky e o vindouro Thor: Ragnarok, que faz de Monica; Lil Rel Howery, de Foge, que é Joey; LaKeith Stanfield, de Atlanta (e também Foge), que é Chandler; e, por fim, Tiffany Haddish, cujo perfil tem vindo a crescer desde que foi uma das protagonistas de Girls Trip, uma das comédias mais aclamadas deste verão, e que é Phoebe. Além destes, Jay-Z faz, ao telefone, a voz da personagem de Tom Selleck, Richard.
A meio, a cena corta e Carmichael sai do cenário do apartamento de Monica e Rachel, que foi destruído aquando do final da sitcom e recriado especialmente para este vídeo, para encontrar Hannibal Buress, outro cómico de stand-up e uma parte importante das séries cómicas Eric Andre Show e Broad City, que lhe diz que o conceito deste remake é fraco – e ainda confunde Friends e Seinfeld. O que segue é uma trip que acaba com Carmichael sentado num banco a olhar para a lua cheia, com um sample de Warren Beatty e Faye Dunaway a anunciarem este ano La La Land em vez de Moonlight como o vencedor do Óscar de Melhor Filme.
O conceito e a realização são de Alan Yang, co-criador da série de Aziz Ansari, Master of None, que aborda frequentemente os temas da identidade racial e étnica, da visibilidade e da representação, e o modo como esses tópicos são tratados na cultura pop que consumimos (o memorável episódio Indians on TV da primeira temporada da sua série gira à volta de estereótipos racistas sobre pessoas de origem indiana, por exemplo).
Em entrevista ao site de música Pigeons & Planes, Yang explicou que a ideia não era denegrir Friends, mas antes fazer pensar sobre o quanto a cultura televisiva evoluiu. E ainda contou que uma das maiores conversas que teve com Jay-Z foi sobre a importância de as pessoas fazerem as suas próprias coisas. A falar com o Vulture, o site da revista New York, adicionou também que, mais do que apontar o dedo, queria fazer pensar sobre os temas – algo que faz parte da abordagem de Master of None.
O vídeo chega numa altura curiosa, pouco após o final de The Carmichael Show, a sitcom sobre uma família à moda das produções de Norman Lear – o lendário responsável por sitcoms como Uma Família às Direitas –, em que temas sociais sensíveis eram discutidos com atenção a todos os lados dos argumentos. Criada e protagonizada por Jerrod Carmichael, o último episódio foi para o ar na quarta-feira. Howery e Haddish também faziam parte do elenco.The Carmichael Show pegava numa maneira tradicional de fazer televisão e dava-lhe uma perspectiva fresca e moderna. Já que, no tempo de Friends e antes, mesmo quando se viam famílias negras na comédia televisiva, raramente eram escritas por pessoas negras sob a sua própria perspectiva. É a importância de se fazer as próprias coisas.