Estudantes de arquitectura fazem do bairro das Campinas “um laboratório”

Com o início de Agosto, 25 alunos de arquitectura de quatro continentes começaram obras de requalificação no bairro das campinas.

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Adriano Miranda

 Até 11 de Agosto, 25 alunos de arquitectura estão a trabalhar no bairro das Campinas, em Ramalde. Por detrás do bloco 30, os alunos, em conjunto com os arquitectos Roberto Cremascoli, Nicolò Galeazzi e Ivo Poças Martins, vão construir um coreto, um parque para crianças e um pequeno jardim. A ideia é que pareça a planta de uma casa.

O projecto, organizado pela Casa da Arquitectura em conjunto com a Câmara do Porto, a Domus Social, a Porto Academy e a Freguesia de Ramalde, chama-se Lugar de Partilha.     

Tal como no Há Baixa, realizado por alunos de arquitectura de Coimbra, o Lugar de Partilha é um projecto onde “a ideia é que se aprenda a conceber e executar”, conta Nuno Sampaio, director artístico da Casa da Arquitectura. “Muitos estudantes saem da universidade sem uma experiência de construção e eles precisam ver se o que desenham é passível de ser construído”, afirma.

António Gouveia, presidente da Junta de Ramalde, também vê a iniciativa com bons olhos. “É uma forma de dar poder e responsabilidade à junta para actuar nos bairros”, diz o autarca aos residentes e aos alunos, na apresentação do projecto à comunidade. Gouveia reforça o desejo por “algo que encha o olho”, para que o município preste mais atenção ao interior dos bairros, “espaços ainda muito esquecidos”.

Numa visita inesperada, depois de tomar conhecimento do projecto “há meia hora”, Rui Moreira relembrou a importância da iniciativa porque “a arquitectura é a base de como se vive na cidade”. O presidente da câmara, depois de ouvir algumas queixas dos moradores, falou nas obras do centro de saúde e na intenção de demolir o centro social. Mas o dia era para falar do projecto dos alunos, “que vai ajudar a definir uma política melhor, quer a nível de espaços verdes, quer de espaços de habitação”.

Lugar de Partilha é “um laboratório de autoconstrução para a realização de uma infra-estrutura ao serviço da comunidade”, adianta Roberto Cremascoli, comissário do projecto. “O objectivo é envolver todas as pessoas na arquitectura. É para nós, para os estudantes e para as pessoas que já vivem aqui”, afirma.

Ivo Poças Martins fala de um projecto com dois sentidos. “Não temos a ambição messiânica de vir cá resolver problemas. É mesmo encontrar um ponto em que possa haver interacção”, assegura. “Neste processo, todas as estruturas têm de ser potencialmente desmontáveis. Não vamos intervir em nada que já seja permanente”, acrescenta, afirmando que as estruturas deverão ser desmontadas depois do Verão.

As ideias para a requalificação da pequena praça do bairro das Campinas onde, todos os anos, no São João, os moradores acendem uma grande fogueira, foram apresentadas na escola de arquitectura de Verão, Porto Academy, realizada por Pedro Bandeira e pela Casa da Arquitectura. Apesar de nem todos os projectos serem realizados, os arquitectos reuniram num documento todas as queixas dos moradores, registadas durante a pesquisa, para que eles possam ser apresentados às entidades responsáveis, como a Câmara do Porto e a Domus Social.

A comunidade do bairro vê a acção dos alunos com agrado. “Não há lá nada. Seja o que for, para nós já é gratificante”, diz Tânia Anastásia, de 30 anos, moradora do bairro desde que nasceu. Como ela, todos os moradores presentes aplaudiram o projecto e aceitaram o pedido por “carpinteiros disponíveis” feito pelos arquitectos. Actualmente, Campinas tem mais de 1900 moradores.

Alunos de todo o mundo

Os 25 participantes vêm do Brasil, Austrália, Líbano, Coreia do Sul, Inglaterra, Itália e Portugal. Nacionalidades diferentes, mas um objectivo em comum: pôr mãos à obra. João Costa, estudante da FAUP — Faculdade de Arquitectura do Porto, juntou-se a este projecto através da Porto Academy. “É importante perceber a partir de dentro”, conta o estudante de 23 anos. Depois de participar na escola de Verão surgiu a oportunidade de construir o que estava no papel. “A nível académico é muito enriquecedor”, afirma.

Foi o desejo de conhecer visões de várias nacionalidades que fez Vicky Berl atravessar o Atlântico. Vinda da Escola da Cidade, em São Paulo, a jovem de 21 anos pensou que o projecto “só ia ficar no papel”. Quando lhe disseram que ia ser construído, não hesitou em ficar por Portugal mais umas semanas. “No Brasil, não há hipótese de construir enquanto alunos”, confessa.

Esta iniciativa enquadra-se no programa inaugural da Casa da Arquitectura, o Please Share!, e tem como objectivo facilitar “o debate disciplinar com os profissionais e com os não arquitectos, que são os utilizadores de toda a arquitectura”, segundo Nuno Sampaio.

Texto editado por Ana Fernandes     

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