Fábrica da La Seda em Sines está insolvente, Caixa arrisca perder 500 milhões

Dois anos e meio depois de ver o seu Processo Especial de Revitalização aprovado, a Artlant está em insolvência. Em Janeiro de 2015 tinha dívidas de 690 milhões de euros, 75% das quais à CGD.

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CGD é a maior credora da Artlant, sona da fábrica de PTA em Sines, agora insolvente Rui Gaudencio / Publico

Foi proferida esta quarta-feira, 26 de Julho, a “sentença de declaração de insolvência do devedor Artlant PTA”, pode-se ler no anúncio do Tribunal de Lisboa, disponibilizado esta quinta-feira no site do Citius. A requerente do pedido, identificada no anúncio como tal, é a empresa Sociedade de Montagens Metalomecânicas, SA (SMM), constando ainda a CGD, a Artelia Ambiente e a AICEP como credores. Correm agora 30 dias, não suspensos pelas férias judiciais, para reclamar os créditos sobre a Artlant junto da justiça.

No edital, consultado pelo PÚBLICO é recordado aos credores da Artlant que “pode ser aprovado Plano de Insolvência, com vista ao pagamento dos créditos sobre a insolvência, a liquidação da massa e a sua repartição pelos titulares daqueles créditos e pelo devedor”.

E que “podem apresentar proposta de Plano de Insolvência o administrador da insolvência, o devedor, qualquer pessoa responsável pelas dívidas da insolvência ou qualquer credor ou grupo de credores que representem um quinto do total dos créditos não subordinados reconhecidos na sentença de graduação de créditos ou, na falta desta, na estimativa do sr. juiz”.

PER foi aprovado em Janeiro de 2015

Esta é a segunda chamada da Artlant – antiga Artenius Sines – à justiça pelos créditos devidos pela unidade de produção de ácido tereftálico purificado (ou PTA da sigla proveniente do inglês Purified Terephthalic Acid, matéria-prima para, por exemplo o fabrico de garrafas de plástico), inicialmente pertencente aos activos da catalã La Seda de Barcelona e que até hoje pesa nas contas da Caixa Geral de Depósitos.

Em Outubro de 2014, em pleno Processo Especial de Revitalização (PER) a lista de créditos então conhecida dava conta de uma dívida da Artlant de cerca de 690 milhões de euros a diversos credores. Deste total, então, 75% ou cerca de 520 milhões de euros eram devidos à Caixa Geral de Depósitos. Foi o banco público que tinha liderado, em Janeiro de 2010, o financiamento de 370 milhões de euros à unidade industrial de Sines, para que a mesma fosse concluída.

O projecto da unidade de PTA em Sines foi classificado de Potencial Interesse Nacional (PIN) pelo Conselho de Ministros (CM) de 28 de Junho de 2007. Foi no mesmo CM que o executivo liderado por José Sócrates atribuiu o igual estatuto de PIN à unidade de pregado da antiga Pescanova em Mira, que também entrou em insolvência anos mais tarde. O PER da Acuinova (empresa da Pescanova com a unidade em Mira) foi recusado recentemente pelo Tribunal de Coimbra.  

Nove anos de avanços e recuos

A unidade de PTA, com mais de 400 milhões de euros de investimento previstos, começou a ser projectada em 2008 pela La Seda de Barcelona, da qual a CGD chegou mais tarde a ser a segunda maior accionista, com 14,7% do capital da catalã. O maior accionista individual da La Seda passou a ser, desde Agosto de 2010, a BA PET BV, criada pelos mesmos accionistas da BA Vidro e liderados por Carlos Moreira da Silva, que foi em dois momentos distintos foi presidente da catalã (entre Abril de 2010 e Abril de 2013 e entre Junho de 2013 e Fevereiro de 2014). A BA PET chegou a ultrapassar os 20% do capital da La Seda.  

O projecto de Sines foi lançado e iniciado pela La Seda, quando a catalã ainda detinha 100% do capital da subsidiária portuguesa (então designada Artenius Sines). Mas, a 16 de Setembro de 2010, era comunicado publicamente que a La Seda alienara 59% do capital da Artlant a três accionistas portugueses: o Fundo de Recuperação da ECS (29,26%), a CaixaCapital (18,52%) e o InovCapital (hoje Portugal Ventures Capital, com 11,11%).

A unidade de Sines entrou, finalmente, em laboração em Março de 2012, tendo a La Seda como principal cliente. Contudo, em Fevereiro de 2014, a petroquímica catalã, que se manteve dona de 41,11% da Artlant e de mais de duas dezenas de unidades industriais na Europa, viu a justiça espanhola decretar a sua liquidação e posterior dissolução por incapacidade em ressarcir os seus credores.

Em Agosto de 2014, torna-se público que o (então) Tribunal de Comércio de Lisboa tinha aceite o pedido de PER da Artlant. Um Processo Especial de Revitalização, pela legislação em vigor, visa colocar a empresa ao abrigo de credores em caso de incumprimento de dívidas, impossibilitando, durante o tempo que está a ser negociado, um possível decreto de insolvência. É uma possibilidade de as empresas procurarem a sua reestruturação financeira, sob a gestão de um administrador judicial mandatado pelo tribunal, em que a mesmas se comprometem – juntamente com parte condicional dos credores – a um plano de recuperação que a maioria dos créditos em causa aprovem e que a justiça homologue. São, normalmente, acordados prazos e condições de pagamento (com ou sem perdão de dívida). E, nos PER, os trabalhadores são classificados como “privilegiados” na hierarquização dos créditos para efeitos de reclamação na justiça.

Mas, aparentemente, o PER aprovado a 15 de Janeiro de 2015 pelos principais credores da Artlant não foi suficiente para “salvar” a empresa. Desconhece-se, por agora, qual é o montante de dívida que a Artlant acumulou nos últimos dois anos e meio. Mas, em Outubro de 2014, quando o PER da Artlant estava ainda a ser negociado, a lista de créditos aprovada pelo administrador judicial reconhecia 689,7 milhões de euros de dívida da unidade de PTA em Sines.

O PER da Artlant – que como PIN recebeu 38,8 milhões de euros do quadro comunitário de apoio em 2012 - contemplava dois lay off dos 161 trabalhadores então na unidade, até um núcleo final de seis pessoas.

A recuperação da Artlant foi então viabilizada pela CGD (detentora de mais 75% do total da dívida reconhecida em 2014, ultrapassando os 520,66 milhões de euros), pela Artelia (fornecedora de equipamento industrial) e pela AICEP – as três juntas detinham 87% da dívida acumulada pela Artlant até essa data. E, as três, aprovaram o PER.

Os restantes accionistas portugueses – Portugal Capital Ventures, Fundo de Recuperação FCR e o Fundo Caixa Capital –, donos de 58,8% do capital da Artlant mas de créditos de 25 milhões de euros (sendo assim minoritários na contagem de votos para aprovação do Plano de Recuperação) – abstiveram-se na votação do PER da Artlant.

No plano aprovado em Janeiro de 2015, consultado na altura pelo Jornal de Negócios, ficara acordado que "em relação ao crédito da CGD", garantido pelas instalações industriais em Sines e pelos imóveis onde se localizam, e pelo "penhor da totalidade das acções representativas do capital social da Artlant",  "sai o mesmo afectado por a Artlant se propor a pagar 70% do seu valor, cujo pagamento é diferido para os anos de 2021 a 2034". Haveria, neste contexto, um “perdão” de dívida à CGD de 30% (cerca de 156 milhões de euros dos mais de 520 milhões em causa). 

Mas previa – e a CGD aprovou o PER – que o banco público contratasse com a Artlant "um novo financiamento até ao valor de 60 milhões de euros" em "fundos, garantias e cartas de conforto" para "apoiar a sociedade na fase de rearranque da sua actividade". O processo segue agora em tribunal. Outra vez. 

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