Use o dinheiro para comprar tempo livre e será mais feliz

A “fome do tempo” e o stress na sociedade moderna podem ser atenuados para os quem têm dinheiro para pagar a alguém que, por exemplo, limpe a casa. Investigadores defendem que comprar tempo traz mais felicidade do que comprar coisas materiais.

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Operação de limpeza no Big Ben, em Londres REUTERS/Toby Melville

Não vamos entrar na discussão sobre se o dinheiro (por si só) compra a felicidade. Vamos por um atalho e falar sobre os resultados de um estudo que mostra que se usar o dinheiro para comprar tempo, aí sim, poderá estar a promover a sua felicidade. Numa época em que o mundo parece andar numa correria, uma equipa internacional de investigadores fez um inquérito a mais de seis mil pessoas que compraram tempo pagando a alguém para fazer tarefas como limpar a casa, fazer as compras de supermercado ou cozinhar. A conclusão (pouco surpreendente, talvez) é que estas pessoas afirmaram estar mais satisfeitas com a vida. Com uma experiência isolada, os cientistas perceberam também que gastar 34 euros (40 dólares americanos) a comprar tempo é muito mais satisfatório do que gastar a mesma quantia num objecto.

No início do artigo publicado na revista Proceedings of the National Academy of Sciences (PNAS), os investigadores dos EUA, Holanda e Canadá começam por defender a existência de uma nova forma de pobreza na sociedade moderna: é, dizem, a falta de tempo. Adiantam ainda que “as pessoas com rendimentos mais elevados reportam uma maior escassez de tempo”. “Em teoria, os rendimentos crescentes poderiam oferecer uma saída para a ‘fome do tempo’ da vida moderna, porque a riqueza oferece a oportunidade de ter mais tempo livre, como, por exemplo, pagando mais para viver mais perto do trabalho. No entanto, há estudos que sugerem que as pessoas mais ricas passam mais tempo envolvidas em actividades stressantes, como compras e viagens. Investigações experimentais mostram que simplesmente levar as pessoas a sentir que seu tempo é economicamente valioso faz com que sintam que não têm o suficiente”, referem. Apoiados em resultados obtidos em estudos anteriores, os autores do artigo lembram que o stress provocado pela falta de tempo já foi associado a um “menor bem-estar, incluindo uma redução da felicidade e um aumento de ansiedade e insónia”.

O artigo com o título “Comprar tempo promove a felicidade” mostra os resultados obtidos com um inquérito a 6241 pessoas a viver nos EUA, Canadá, Dinamarca e Holanda. Este grupo de inquiridos envolvia 366 trabalhadores associados à Mechanical Turk (uma plataforma de emprego “online” que permite que as pessoas escolham o que fazer e quando o fazer perante uma determinada procura das empresas inscritas no sistema) e uma amostra representativa da população com 1260 trabalhadores americanos a viver nos EUA, um grupo de 467 adultos a viver na Dinamarca e de 326 a viver no Canadá e ainda uma outra amostra representativa de 1232 pessoas e 818 milionários a viver na Holanda.

A questão colocada pelos investigadores era apenas se (e quanto) gastavam por mês para aumentar a fatia de tempo livre, pagando a alguém para desempenhar alguma tarefa diária desagradável. Depois tinham de classificar o nível de satisfação com a vida e fornecer alguns detalhes sobre os rendimentos, número de horas semanais de trabalho, idade, estado civil e composição do agregado familiar. Os resultados revelaram que 28,2% dos inquiridos gastou dinheiro a comprar tempo todos os meses. A quantia média gasta foi de 126 euros (147 dólares americanos). E, concluem os investigadores, quem gastou dinheiro desta maneira relatou uma maior satisfação com a vida.

Desconstruindo a tabela dos resultados, encontram-se alguns dados previsíveis. Por exemplo, o grupo dos milionários foi onde se encontrou mais pessoas a comprar tempo (60%) e com um maior investimento. No oposto do quadro, estavam o grupo dos trabalhadores da Mechanical Turk onde só 15% comprou tempo. Numa outra experiência, os investigadores pediram a 60 pessoas para gastar 34 euros a comprar algo material num fim-de-semana e a mesma quantia para comprar tempo num outro fim-de-semana. Os participantes neste teste revelaram que quando compravam tempo sentiam, ao final do dia, menos efeitos negativos e menos stress associado à pressão do tempo.

O estudo nota que há cada vez mais pessoas que se sentem reféns do tempo, porque têm muitas coisas para fazer mas também porque sentem que não conseguem ter controlo sobre o seu tempo. “Ironicamente, gastar dinheiro num serviço que vai significar economia de tempo pode prejudicar as percepções de controlo pessoal, levando estas pessoas a inferir que não conseguem lidar com as tarefas diárias e, desta forma, potencialmente reduzir a sensação de bem-estar”, argumentam os autores do estudo, sugerindo que a “relação benéfica entre a compra de tempo e a satisfação com a vida pode ser curvilínea e reverter nos mais altos níveis de gastos em compras com economia de tempo”. Ainda assim, arriscamos dizer, o problema maior será para os que não têm dinheiro para comprar tempo. 

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