A história da notícia de um avião que, afinal, não caiu
Durante quase duas horas foi noticiada a queda de um avião em Pedrógão, informação que tinha sido confirmada inicialmente por fontes da Protecção Civil, que depois veio afirmar que não havia registo da queda de nenhuma aeronave.
Durante quase duas horas, pensou-se que tinha caído um avião em Pedrógão Grande. Primeiro um avião, escreveu o PÚBLICO. Depois, segundo outros órgãos de informação, um Canadair. Mas, afinal, não se tinha registado a queda de nenhuma aeronave, mas sim a explosão de uma roulotte. No fim, apenas uma grande confusão, que teve como ponto alto a conferência de imprensa do comandante da Protecção Civil, na qual este afirmava que não tinha conhecimento de qualquer acidente com uma aeronave.
Pouco passava das 17h quando começaram a surgir as primeiras informações sobre a queda de um avião, que, segundo informações recolhidas pelo PÚBLICO, teria caído na Louriceira, concelho de Pedrógão Grande junto à fronteira de Góis. Muitos outros órgãos de comunicação social – nacionais e internacionais – começaram a noticiar a queda de um aparelho que estaria a combater os incêndios.
Pouco depois, surge a informação de que o avião seria um Canadair. Vários jornalistas confirmaram a informação junto de fontes ligadas ao posto de comando de Ansião, onde estavam. Nesta altura, o Gabinete de Prevenção e Investigação de Acidentes com Aeronaves e de Acidentes Ferroviários (GPIAAF) tinha indicado à agência Lusa que tinha sido informado da queda de uma aeronave.
Associada a esta informação estavam relatos de uma explosão e de uma bola de fogo. Fonte da Autoridade Nacional da Protecção Civil confirmou à agência Lusa que tinha caído um avião Canadair que estava no combate ao incêndio e que estaria a caminho do local um helicóptero do INEM.
As dúvidas começaram a surgir também sobre a origem da aeronave, uma vez que estavam no terreno aviões franceses, espanhóis e italianos, sendo que Portugal não possuiu aviões Canadair — apesar de ter contratado o serviço destes aparelhos.
A agência EFE adiantou que o avião que tinha caído não era espanhol, uma informação confirmada depois pela própria Força Aérea de Espanha. As informações contraditórias começam aqui quando fonte da Protecção Civil adianta à Lusa que o Canadair que caiu não era nenhum dos contratados por Portugal.
Enquanto a confusão adensa, o Ministério da Administração Interna remeteu as explicações para mais tarde – e nisto tinha passado quase uma hora desde as primeiras informações. A localização da queda do aparelho foi actualizada perto das 18h, sendo que o avião teria caído no pinhal entre as localidades de Louriceira e Ouzenda. A GNR não deixava nenhum jornalista chegar àquela zona. Fonte da Protecção Civil disse ao PÚBLICO que ainda não tinha sido possível confirmar qual era o Canadair que tinha caído.
Para além das informações contraditórias e confusas, o primeiro sinal de que algo não estava bem veio de Jorge Gomes, secretário de Estado da Administração Interna, que quanto a esta questão disse aos jornalistas: “Não confirmo”.
Já perto das 19h, fonte da Protecção Civil garantiu depois ao PÚBLICO que nenhum avião de combate aos incêndios teria caído, apesar de ter confirmado a informação contrária algum tempo antes. Os aviões de combate ao incêndio “foram todos contactados e estão operacionais”. Surge, no entanto, uma nova informação adiantada pela mesma fonte que diz que nada garante que não possa ter caído outro qualquer aparelho.
Estava marcada para as 19h a conferência de imprensa para novo ponto da situação. Vítor Vaz Pinto, comandante da Protecção Civil, reforçou a informação que tinha sido dada ao PÚBLICO de que não tinha conhecimento da queda de um avião, ainda que tenha sido lançada uma operação de busca e salvamento após a notícia, mas sem qualquer confirmação da queda.
Vítor Vaz Pinto fez saber durante o briefing que se registou uma explosão numa roulotte abandonada, que teria botijas de gás no seu interior, e que o seu rebentamento poderia estar na origem dos relatos sobre a suposta queda da aeronave. O avião que não caiu pode ter sido, afinal, uma roulotte abandonada. As botijas de gás que estavam no veículo podem justificar os relatos de explosão e de bolas de fogo que muitos viram.
Ao PÚBLICO, testemunhas no local confirmaram terem avistado a queda de um avião. Horas depois, confrontadas com a certeza de que nenhum aparelho tinha caído na zona, a reacção foi de negação: "O avião caiu mesmo! Alguém tem de estar a mentir". Pouco tempo depois confirmou-se no local a origem da explosão.
A explicação desta confusão poderá estar na geografia do local. As aldeias Louriceira e Ouzenda, ambas do concelho de Pedrógão, ficam a vários quilómetros de distância por estrada. Em linha recta, porém, são vizinhas e implantadas num terreno que desce até uma parte larga do rio Unhais, onde os Canadair abastecem de água. O reabastecimento de um destes, que desaparece da linha de visão de quem se encontra na estrada, poderá ter coincidido com a explosão justificando o facto de tanta gente ter "visto" um avião a cair.