Abutres da Península Ibérica em risco se fármaco for autorizado, alertam cientistas

Investigadores já estão no terreno para recolher provas de como os abutres podem ficar à beira da extinção em Portugal e Espanha, tal como aconteceu no Sul da Ásia.

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Um grupo de biólogos e ambientalistas portugueses e espanhóis alertou que a autorização do medicamento diclofenaco para uso pecuário põe em risco as populações de abutres, assim como as populações de águias. A equipa de cientistas em Portugal, coordenada pela Universidade de Aveiro, diz em comunicado desta segunda-feira que já está no terreno para provar ao Governo português que o cenário no país pode vir a ser o mesmo do que o do Sul da Ásia, onde o diclofenaco causou quase a extinção dos abutres.

O diclofenaco é um anti-inflamatório que pode ser usado para tratar gado bovino. Fica no organismo dos animais durante algum tempo após a sua morte e é tóxico para os abutres, que se alimentam das carcaças. As aves acabam por morrer de falência renal, dois dias depois de comerem a carne contaminada. “As aves necrófagas, e especialmente algumas espécies de abutres, são extremamente sensíveis aos efeitos tóxicos de fármacos anti-inflamatórios não esteróides, como o diclofenaco, que podem ingerir acidentalmente a partir dos cadáveres do gado doméstico tratado com estes produtos”, disse no comunicado Carlos Fonseca, biólogo da Universidade de Aveiro e coordenador do estudo em Portugal.

O biólogo refere que, apesar de outros fármacos produzirem o mesmo efeito no gado e de serem mais seguros para as aves necrófagas, foi confirmado que o Estado português está também a avaliar um pedido de autorização de comercialização do diclofenaco para uso pecuário. “Atendendo ao impacto conhecido nos abutres e nas grandes águias, invariavelmente a morte por falência renal quando expostos a este fármaco, e ao reduzido tamanho e à vulnerabilidade das nossas populações, a autorização do uso do diclofenaco na pecuária constituirá um enorme risco para estes animais e colocará em causa a sua sobrevivência e a recuperação das suas populações”, refere Carlos Fonseca.

E mesmo que o número de cadáveres contaminados não seja elevado, o coordenador do estudo salienta que esses cadáveres podem causar a morte de um “elevado número de indivíduos que habitualmente se alimenta em grupo e eliminar totalmente casais reprodutores de aves necrófagas em determinada região”. Como tal, isto pode colocar em causa a conservação destas espécies.

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Os abutres têm uma função muito importante nos ecossistemas: como se alimentam de cadáveres, podem reduzir a propagação de doenças, algumas transmissíveis aos seres humanos. Só entre 2008 e 2012, a União Europeia investiu cerca de 11 milhões de euros em projectos de conservação das espécies de abutres.

O grande objectivo deste estudo é demonstrar que o diclofenaco, que nos anos 90 provocou a morte de 99% dos abutres no Sul da Ásia, pode ter o mesmo impacto na Península Ibérica, caso o fármaco de uso veterinário seja autorizado.

Financiado pela Fundação Morris para os Animais (dos EUA), que investe na saúde animal, o trabalho, além da Universidade de Aveiro, conta com a Universidade Autónoma de Barcelona (Espanha), o Instituto de Investigação em Recursos Cinegéticos (Espanha), a Universidade de Lérida (Espanha) e a Universidade do Minnesota (Estados Unidos). Em Portugal, tem ainda a participação da Liga para a Protecção da Natureza, da Associação Transumância e Natureza, da Quercus, do Centro de Recuperação e Investigação de Animais Selvagens da Ria Formosa, do Centro de Ecologia, Recuperação e Vigilância de Animais e, entre outros, do Hospital Veterinário da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro.

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