A ARCOlisboa vai ter algo de insólito
Não param de abrir galerias em Lisboa. Com três inaugurações marcadas para esta semana, a tempo da ARCOlisboa, a feira tem um novo programa para integrar esta dinâmica.
Na sua segunda edição, a ARCOlisboa — Feira Internacional de Arte Contemporânea vai ser mais “divertida”, promete o curador João Laia, responsável pelo novo espaço dedicado às galerias mais jovens, que pela primeira vez vai existir em Lisboa. Nesta quarta-feira, a partir das 16h, começa a pré-inauguração para os convidados profissionais da ARCOlisboa na Cordoaria Nacional, um dia antes da inauguração oficial, marcada para dia 18, às 12h, com o presidente da Câmara Municipal de Lisboa e o secretário de Estado da Cultura.
Ao todo, são 58 galerias, oito das quais no programa comissariado por Laia, que se chama Opening, a mesma designação usada na feira de Madrid, também responsável pela organização do evento em Lisboa. Mais uma dezena de galerias do que no ano passado, contabiliza Carlos Urroz, o director das duas feiras, que nesta terça-feira assistia já à montagem dos stands na Cordoaria, estando a maior parte das novidades concentradas nas galerias jovens, mas também algumas no programa geral, onde este ano vão estar 50 galerias (13 países, divididos por 23 galerias nacionais e 27 estrangeiras).
É na Sala dos Barcos, a que se acede através da zona do pátio marcada por uma cobertura verde, que vai estar o programa Opening. “Pum-pum-pum”, o som dos martelos sobrepõe-se às palavras de João Laia, que tenta explicar como trabalhou esta exposição que junta oito stands de mais de 20 metros quadrados. “Por causa da dinâmica que existe actualmente com as galerias a abrir em Lisboa, a ARCO achou relevante ter também o Opening em Lisboa. O que distingue a montagem da exposição é o facto de não haver paredes entre cada stand. Fica uma coisa mais contaminada e híbrida”, afirma Laia.
O curador, que vive em Londres, convidou quatro galerias portuguesas e quatro estrangeiras: Francisco Fino, Hawaii-Lisbon, Madragoa e Pedro Alfacinha, ao lado de BWA Warszawa (Varsóvia), Dürst, Britt & Mayhew (Haia), José García (Cidade do México) e Narrative Projects (Londres). “Todas as portuguesas abriram nos últimos dois anos e meio, sendo a mais velha a Pedro Alfacinha, enquanto a última, a Francisco Fino, abriu ontem [na segunda-feira]!” Vale a pena incluir uma galeria aberta na véspera, defende, porque “vai ser importantíssima, já fez feiras mesmo antes de abrir e tem um trabalho anterior” que passou por outros espaços. Com as estrangeiras, Laia pensou nos artistas que lhe interessavam ou com os quais já tinha trabalhado e chegou às galerias.
“Insólito” foi mote que deu às oito galerias para trabalharem. “Pedi-lhes que pensássemos todos na ideia de invulgar. Não o que é mais novo, mais fresco, mas que pensássemos naquilo que supostamente não acontece e que acaba por acontecer, como o 'Brexit' ou o Trump.”
João Laia espera que os 25 artistas que os visitantes vão poder encontrar nesta secção consigam “ser um indicador do que está para chegar”. “O insólito quer dizer que as coisas não estão estáveis. Isso provoca ansiedade, mas é também uma época em que as coisas se abriram e têm potencial de ser transformadas.”
Novas galerias, novos artistas
Se na véspera tinha inaugurado a galeria Francisco Fino, em Marvila, na terça-feira estava prevista a inauguração da espanhola Maisterravalbuena, em Alvalade, seguindo-se a italiana Monitor na sexta-feira. “Está a desenhar-se uma cena cosmopolita, internacional, que não havia no circuito da arte em Lisboa. As novas galerias dão uma oxigenada, porque trazem outros artistas e outros coleccionadores”, afirma o curador.
Um desses exemplos, aponta, está mesmo à nossa frente, a fazer a montagem do seu stand no espaço Opening. O italiano Matteo Consonni, que chegou no ano passado a Lisboa para abrir a Galeria Madragoa, já fez várias feiras e tem um programa inovador. Equilibrado em cima de um escadote, o galerista tenta suspender no vazio um dos delicados desenhos da portuguesa Sara Chang Yan, marcados por cortes, buracos e uma discreta presença da cor.
Se na ARCOmadrid a Kubikgallery estava no programa Opening, na feira de Lisboa, em que esta galeria do Porto participa pela primeira vez, encontra-se no programa geral, onde na terça-feira de manhã a maior parte dos stands estava ainda por montar. A Kubik está mesmo no final da grande nave que define o edifício histórico da Cordoaria, para quem entra do lado esquerdo, mesmo ao lado da galeria lisboeta Belo-Galsterer.
“Estou muito tranquilo. Tenho um dos melhores stands que já fiz. Com quatro artistas, dois portugueses e dois brasileiros, que mostram registos diferentes de paisagem”, explica o galerista João Azinheiro, acabado de chegar do Brasil, com uma pintura sobre tecido da brasileira Leda Catunda na mão. “Estou muito curioso e acho que vai correr bem, por causa da organização, do público de Lisboa e de alguns coleccionadores com quem tenho falado.”
Na Vera Cortês, já podemos ver duas obras de José Pedro Croft à espera de serem montadas — um desenho e uma das suas esculturas “dripping” —, o artista que representa este ano Portugal na Bienal de Veneza e que integra agora a galeria.
A galerista e o pintor João Queiroz acertam a disposição de sete trabalhos numa das paredes do stand, que cruzam aguarela e encáustica, duas técnicas opostas na fluidez da tinta. O artista, um dos nomes relevantes da pintura portuguesa, falou com o PÚBLICO sobre o significado da feira, que já vai no segundo ano, para o mercado da arte nacional: “Pode significar mais gente a ver, o desenvolvimento do mercado, mas pode também ser a sua perversão. Concentrar muitas coisas neste acontecimento pode impedir que outros aspectos se desenvolvam e que a feira acabe por cair num vazio. Aspectos como as actividades [normais] das galerias, porque há muitas exposições mas cada vez menos divulgação.” Queiroz lembra que as feiras, onde se juntam milhares de obras em competição, não são também o melhor sítio para apreciar arte.
Mesmo ao lado da Vera Cortês, a galeria Maisterravalbuena vai tornar-se oficialmente a partir desta terça-feira à noite uma galeria lisboeta, além de madrilena. Com inauguração marcada para as 22h em Alvalade (Rua Reinaldo Ferreira, 40), Blanca Marín Argüelles explica que mostram sete artistas numa colectiva, onde estão os portugueses Joana Escobar, André Romão e Leonor Antunes, ao lado de Christodoulos Panayiotou, Haris Epaminonda, Iman Issa e Magdalena Jitrik. “Lisboa é uma cidade que está a fazer muita coisa nova com a arte, como a ARCOlisboa. Os mercados espanhol e português são muito diferentes e queremos fazer uma ponte: os coleccionadores espanhóis conhecem a cena portuguesa, mas o contrário não é vulgar. Pensamos que o mercado está a crescer com os brasileiros, franceses e africanos.”
Na sexta-feira, será a vez de a galeria italiana de Roma, a Monitor, abrir um novo espaço em Lisboa, na zona do Rato (D. João V, 17-A), além de se estrear igualmente na ARCOlisboa. Uma instalação site-specific do artista Graham Hudson vai ocupar uma antiga loja de papel, num espaço ainda em reformulação que só estará totalmente pronto em Setembro. “Lisboa é uma cidade com um enorme potencial por desenvolver”, lê-se no comunicado da galeria. “Embora a sua comunidade artística não seja enorme, é verdadeiramente sólida e focada, havendo um crescimento nos últimos anos que se distingue por ser rápido e com qualidade.” Esse crescimento, continuam, “estimula o mercado e o público, determinando Lisboa como um novo centro cultural na Europa”.
O horário da feira é, de 18 a 20 de Maio, das 12h às 20h. Dia 21, domingo, encerra duas horas mais cedo.
Notícia corrigida dia 20/5: A galeria Belo-Galsterer também participou na primeira edição da ARCOlisboa, ao contrário do que se escrevia numa versão anterior do texto