Coração de metal não enferruja, renova-se e adapta-se

O heavy metal continua activo no Porto e está assente numa estrutura composta por bares de concertos, editoras, lojas de música ou estúdios de gravação. Muitas das bandas mais antigas continuam no activo e há sangue novo que dá continuidade ao género.

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Metalpoint centro comercial Stop Paulo Pimenta
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Cave 45 , concerto Kampftar Paulo Pimenta
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Metalpoint centro comercial Stop Paulo Pimenta
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Cave 45, concerto Dawnrider Paulo Pimenta
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Cave 45 , concerto Son Of Cain Paulo Pimenta
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Metalpoint centro comercial Stop Paulo Pimenta
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Metalpoint centro comercial Stop Paulo Pimenta
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Metalpoint centro comercial Stop , concerto In Vein Paulo Pimenta
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Cave 45 , concerto Kampftar Paulo Pimenta
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Cave 45 , concerto Kampftar Paulo Pimenta
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Cave 45, concerto Sonneillon BM Paulo Pimenta
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Cave 45 , concerto Kampftar Paulo Pimenta
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Cave 45 , concerto Kampftar Paulo Pimenta
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Metalpoint centro comercial Stop , concerto In Vein Paulo Pimenta
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Metalpoint centro comercial Stop , concerto In Vein Paulo Pimenta
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Cave 45 Paulo Pimenta
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Cave 45 Paulo Pimenta
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Cave 45 , concerto Kampftar Paulo Pimenta
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Centro comercial Stop Paulo Pimenta
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Centro comercial Stop produtora Raising Legends Paulo Pimenta
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Centro comercial Stop produtora Raising Legends Paulo Pimenta
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Centro comercial Invictos, loja de música Bunker Store Paulo Pimenta
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Centro comercial Invictos, loja de música Bunker Store Paulo Pimenta

Guitarra veloz, bateria e baixo a servir de combustível para que a velocidade se mantenha e uma linha de voz entre o berrado e o cantado é o som que sai de uma das muitas salas de ensaio que existem no Centro Comercial Stop (CCS), na Rua do Heroísmo, no Porto, convertido há quase duas décadas em laboratório de trabalho de centenas de músicos. É thrash metal que se ouve, um dos muitos subgéneros do heavy metal, que esteve no auge nos anos 80 do século passado. Quem toca são os Soul Doubt, de Leça da Palmeira. Todos os membros da banda nasceram nos anos 90 e fazem parte da nova geração da cena metal da Invicta que continua activa e suportada por uma rede cada vez mais organizada, assente numa estrutura composta por bares, salas de concerto, editoras, estúdios de gravação, espaços para ensaiar ou lojas de música.

À excepção do baterista, todos os outros membros não têm mais de 20 anos. Com cabelos compridos e uns esboços de barba estão na sala de ensaio a compor uma nova música. É um dia de semana ao final da tarde e lá dentro trabalha-se. A linha de guitarra está feita. Falta acertar o solo com a bateria. Thrash Metal dos anos 80 feito por músicos nascidos na década de 90..       

Rui Carvalho (baixo), 19 anos, e Telmo Marrão (guitarra), 20 anos, são amigos desde o ensino básico e quando tinham cerca de 14/15 anos começaram a tocar juntos. Em Leça, de onde são, pensavam “estar sozinhos no metal”. Além de um “pequeno grupo” de amigos que conheciam “não havia mais ninguém na zona” que ouvisse este género de música, pensavam: “Foi quando começamos a dar os primeiros concertos no Porto e passamos a ensaiar no Stop que descobrimos que afinal já havia cá gente antes de nós”. Na mesma altura descobriram que existia também um circuito de concertos regulares na cidade.

Fenómeno de longevidade

Estão cerca de 20 pessoas sentadas nas escadas frente à entrada do Metalpoint, no CCS. É fim-de-semana e tocam 3 bandas do Porto e arredores: In Vein, Lyfordeath e SuddenDeath. Todas surgiram nos últimos cinco anos. Lá dentro estão outras duas dezenas e o dono do bar, Hugo Almeida, que nessa noite também assume as funções de técnico de som. Há o tradicional mosh, ou roda, muitas cabeças a abanar (headbanging) e para os mais audazes algum stage diving (quando alguém se atira do palco para o público). Para quem não está familiarizado com o movimento pode parecer um cenário de caos. Não é o caso. Todos se divertem e ninguém sai magoado.

“Nunca houve no Porto uma agenda de concertos tão regular e em tanta quantidade”, diz Hugo, que sublinha ter existido “um boom” sobretudo nos últimos 2/3 anos. A oferta de concertos afirma ter crescido tanto ao ponto de  existirem espectáculos que se sobrepõem. Todas as semanas há “mais do que um concerto” do género na cidade, que muitas vezes “calham no mesmo dia”. Sem hesitar diz considerar o aumento da oferta positivo. Contudo, assinala contribuir para alguma dispersão de público que tem que optar, algo que “dantes não acontecia”. Tem quase 40 anos e mais de 20 dentro do género e por isso recorda os tempos em que todos os que ouviam este estilo de música se juntavam em massa em qualquer evento que se organizasse. “Não havia mais gente, havia sim menos oferta”, sublinha. O espaço que gere está aberto há quase 10 anos, “um fenómeno” para um bar de metal. “Desafio que nomeiem outro que tenha existido durante tanto tempo ou que continue aberto”,  lança o repto. O segredo da longevidade diz dever-se acima de tudo a persistência, teimosia e muito sacrifício pessoal. Desde que abriu o bar apostou “tudo no mesmo cavalo” e assumiu-o como a sua principal fonte de rendimento. Por lá, diz já terem passado “seguramente” mais de 2 mil bandas nacionais e internacionais.

Vera Oliveira, que estava lá para ver o concerto, tem 39 anos e diz que não é uma “metaleira”. Não gosta de rótulos, afirma. Já ouve metal há muitos anos, mas diz ser eclética e por isso não está presa a um género. De resto, diz que com o passar dos anos é essa a maior diferença que denota no meio: “Cada vez as pessoas estão mais abertas a ouvir géneros diferentes e caiu aquela ideia de que todos têm que se vestir de preto”, conclui. 

O Cave 45, na Rua das Oliveiras, é um desses exemplos de ecletismo. É um bar dedicado ao rock em todas as suas vertentes e por isso dedica também parte da sua agenda ao heavy metal.  Rodas, Iolanda e Oscar, abriram o bar em 2014 e uma das missões era também unificar os diferentes públicos. Portugal, segundo Rodas, “é um país de metaleiros”. É essa a fatia dos clientes que considera mais “fiel”. Já para Oscar, independentemente do género, o número de público depende fundamentalmente do cartaz.

Não muito longe do Cave 45, em Cedofeita, há ainda o Fundo do Poço, bar onde se pode ouvir os grandes clássicos do género e estar com quem partilha o mesmo gosto.

Ponto de encontro dos coleccionadores “fiéis”

Na loja de música dedicada ao género mais antiga da cidade e ainda em actividade, a Piranha (1996), no Parque Itália, na Boavista, está encostado ao balcão Filipe Almendra, com 40 anos. Enquanto Armando Marques, um dos funcionários, vai amontoando uma pilha de álbuns em vários formatos Filipe conta a história do dia em que o filho, aos três anos, lhe pediu para se vestir no Carnaval como um dos membros dos Kiss. “É provável que tenha sido influência lá de casa”, ri-se. Rainbow, Accept, Obituary e os portuenses Xeque-Mate, uma das primeiras bandas nacionais do género a gravar um álbum, são grupos que fazem parte da pilha de seguramente mais de uma dezena de álbuns que leva para casa. Armando, que conhece os clientes pelo nome, diz que quem é coleccionador continua a comprar.

Na Bunker Store, no Centro Comercial Invictus, promove-se também o lado mais social. Num dos dias em que visitamos a loja, Manuel Fernandes e Pedro Branco, os donos, tinham organizado um dos habituais encontros com bandas. Os H.O.S.T, banda do Porto, composta por membros de outros grupos com história no meio estavam a lançar o primeiro registo. Por lá estavam membros de bandas como Tarantula, Buried Alive, Web ou In Solitude, que em conjunto com Heavenwood, Genocide, Pitchblack ou Holocausto Canibal são dos nomes mais carismáticos e mais antigos da cena metaleira da Invicta. Todos os que lá estão conhecem-se. Conversa-se e recordam-se histórias enquanto se ouve o novo lançamento. Nas prateleiras da loja estão várias raridades, vendidas em formatos cassete e vinil e algumas em CD. Há cassetes e discos que podem custar até 250 euros ou até mais, que por norma, dizem os donos, interessam aos coleccionadores mais antigos. Não é por isso que não aparece público mais novo na loja: “Há miúdos que vêm cá com os pais comprar. Acontece, igualmente, virem cá só os pais sozinhos comprarem para os filhos”. Segundo Manuel e Pedro, de acordo com a experiência que têm, o público está em constante renovação.   

Mais estúdios e mais editoras

No sector da edição há pelo menos duas editoras do género a funcionar na zona do Porto. A Raising Legends é uma delas, que acumula também a função de estúdio de gravações. André Matos começou com a editora em 2009, depois de se aventurar também no seu primeiro trabalho como produtor. Desde então foram editados cerca de 60 álbuns pelo selo da Raising Legends.  Actualmente, diz ser esta a sua actividade a tempo inteiro.

No dia em que visitamos o estúdio, Ricardo Dias preparava-se para gravar as guitarras do novo single de Heavenwood, a primeira banda nacional a tocar no maior festival de metal da altura, o Wacken Open Air, na Alemanha, ainda nos anos 90. Há mais de 20 anos com a mesma banda continua no activo. Primeiro foi “a paixão, agora é o amor” que o mantém ligado à música, diz. A par dos Moonspell foram das primeiras bandas “a dar cartas” fora do país.

Internacionalização

Os Holocausto Canibal, a celebrar 20 anos, são outra das bandas que tocam constantemente no estrangeiro. Zé Pedro, baixista e membro fundador da banda, que acumula funções em Grunt ou Dementia 13 já tocou no Brasil, Estados Unidos e toca constantemente pela Europa nos vários projectos dos quais faz parte. Além disso, aventurou-se há 2 anos no sector das edições com a Larvae Records, que surge, essencialmente para dar resposta aos trabalhos das suas próprias bandas. Motivado pelo sucesso do selo, deu continuidade ao projecto e iniciou-se no lançamento de outras bandas, sobretudo em formatos como cassete ou vinil e reedições de bandas “clássicas”. É um nicho que compra estas edições, que “se vendem bem”. Nicho que já não é visto com desconfiança: “Hoje nos meios mais urbanos já ninguém liga aos metaleiros. Esse estigma já não existe”, diz.

Na linha de proporcionar um suporte que garanta às bandas as condições para começarem ou darem continuidade à actividade existe ainda a World Metal Domination (WMD), criada por Ricardo Faria, conhecido no meio como Orca. De acordo com o responsável, a missão deste projecto é auxiliar as bandas em todo o processo associado à actividade das mesmas. A equipa que está a trabalhar na WMD está preparada para produzir álbuns, tratar do grafismo e da promoção dos mesmos ou realizar videoclipes. Têm também sala de ensaios. Além destas funções, é também promotora de concertos. Esta engrenagem surge da experiência coleccionada por Orca, que também é músico e sempre detectou existirem bandas com qualidade que por vezes não avançam mais porque “não sabem como nem têm os meios para o fazer”.  

Persistência e amor à camisola

José Aguiar, é baixista de uma das bandas mais antigas do heavy metal nacional, os Tarantula, que surgiram em 1981. Não está lá desde o início, mas desde que começaram que acompanha a banda e foi participando nalgumas gravações. Antes disso, no início dos 80s, tocou em grupos como os Roxigénio ou os Go Graal Blues Band. Actualmente tem 58 anos, os Tarantula 35 e ainda continuam no activo. Há uns anos a banda da qual ainda faz parte foi responsável pelo desenvolvimento do género. Foram os Tarantula que fundaram o Rec'n'Roll Studio e a Rec'n'school, até há uns anos dos poucos estúdios e escolas de música do género na zona do Porto e mesmo em solo nacional. Muita coisa mudou desde então, diz Aguiar. É com bons olhos que vê a evolução e o crescimento do género. Quando nos anos 70 começou a ouvir Black Sabbath, Led Zeppelin ou Deep Purple, nem lojas de discos existiam para comprar os álbuns: “Tinha que ser um amigo a trazer os discos quando viajava para fora do país”, recorda. Actualmente diz existir mais público, mais bandas e mais condições. Não faltam meios para “os miúdos” poderem iniciar-se num instrumento, afirma. Não foram as bandas onde tocou que lhe permitiram viver da música, embora seja dela que viva, mas com o ensino. No entanto, continua nos Tarantula e há-de continuar: “Parar é morrer. Este género entranha-se e continuamos por cá porque o temos cravado no coração”.  

Barroselas celebra o “Natal dos metaleiros” há 20 anos

São 20 edições de um dos festivais mais antigos do género em solo nacional. É o SWR Metalfest, em Barroselas, Viana do Castelo, ou o “Natal do metal”, como lhe chamam muitos dos “metaleiros”. O festival, que começou na sexta-feira e termina no domingo, deu os primeiros passos em 1998, ainda na Casa do Povo da vila, apenas com uma mão cheia de bandas no cartaz. De há uma série de anos para cá o festival cresceu e tem agora 3 palcos distribuídos pelas tendas montadas nos terrenos da associação desportiva local e realiza-se ao longo de 3 dias, com dezenas de bandas nacionais e internacionais e público que vem de todo o país e além fronteiras. Ricardo e Tiago Veiga, irmãos, começaram o festival sem grandes expectativas e actualmente a caminho de 20 anos são os anfitriões do festival que pôs a vila no mapa. Inicialmente, os habitantes da terra com cerca de 4 mil habitantes estranharam a romaria “daquela gente toda vestida de preto”, recorda Ricardo. Hoje a população e sobretudo os comerciantes, “perguntam se falta muito para a próxima edição”, conta. 

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