Clubes podem expulsar sócios que incitem à violência
Multas para os organizadores do evento, expulsão dos adeptos identificados ou instauração de processos disciplinares aos associados envolvidos são o actual quadro sancionatório para os autores de cânticos ofensivos em recintos desportivos.
O ambiente começou a deteriorar-se há uma semana numa partida de andebol entre FC Porto e Benfica, com elementos da claque nortenha Super Dragões a desejarem que tivesse sido o Benfica a estar no avião que se despenhou na Colômbia, vitimando grande parte da comitiva do clube brasileiro Chapecoense. No último fim-de-semana, as partidas de andebol e futsal entre Benfica e Sporting originaram novos cânticos de ódio, agora envolvendo a claque “encarnada” No Name Boys, alusivos a um adepto “leonino” morto no Estádio Nacional, atingido por um very-light. Actos condenados pelos respectivos clubes, mas que têm penalizações desajustadas e pouco dissuasoras, segundo defendem alguns juristas. Uma das medidas mais gravosas para quem adopta este tipo de comportamento passa pela possibilidade de serem expulsos da condição de sócios, mas apenas se forem devidamente identificados.
“Existe sempre a obrigatoriedade de os promotores de um espectáculo desportivo aplicarem medidas sancionatórias aos seus associados que estejam envolvidos nestas perturbações da ordem pública”, lembrou ao PÚBLICO Alexandre Mestre, ex-secretário de Estado do Desporto e especialista em Direito do Desporto, referindo-se concretamente ao artigo 8.º, alínea C, da Lei Contra a Violência no Desporto (LCVD).
“Se for possível identificar os autores destes actos [como acontece na I e II Ligas de futebol, onde existe videovigilância, o que não foi o caso dos jogos em causa], os clubes ou as sociedades desportivas respectivas têm de aplicar estas medidas: instaurar um processo disciplinar para averiguar a gravidade dos factos e, eventualmente, no limite, expulsar o(s) associado(s) envolvido(s). Mas se estiverem em causa apenas adeptos ou simpatizantes não há essa hipótese. Nesse caso, não têm poder disciplinar para os castigar”, explicou o jurista.
Também o artigo 23.º, alínea e), da LCVD, prevê uma sanção para os autores de cânticos de incitamento à violência. Mas a penalização para os envolvidos, que têm de ser devidamente identificados, fica-se pelo seu afastamento dos recintos desportivos e apenas na partida em questão. A outra sanção é dirigida aos clubes a quem estes adeptos são afectos e não vai além de uma multa, como está previsto nos regulamentos disciplinares da maioria das federações. Ainda que, no caso da Federação Portuguesa de Andebol (FPA), o seu regulamento seja omisso em relação a este tipo de infracções.
A relativa “leveza” das sanções para este tipo de ilícitos já levou alguns juristas a defenderem um reforço das penas, nomeadamente visando os clubes. Lúcio Correia, também especialista em Direito do Desporto, defendeu, na segunda-feira, na SIC Notícias, a possibilidade de serem estudadas medidas direccionadas para a performance competitiva, como retirar pontos aos clubes a que pertencem os adeptos prevaricadores. Algo que, na sua opinião, seria muito mais proveitoso do que simples multas.
Para este jurista, a legalização das claques acabou por não ter nenhum efeito dissuasor no que respeita a este tipo de actos e só uma ameaça real, com penalizações desportivas, poderia atenuar actos como os que têm ocorrido nos últimos dias.
Para já, no caso da FPA — que veio a público, à imagem do que fez na passada semana, anunciar o envio de uma participação ao Conselho de Disciplina sobre o caso, “a fim de o mesmo proceder em conformidade com as disposições legais e regulamentares em vigor” — existe uma norma no seu regulamento disciplinar segundo a qual os promotores dos eventos têm de garantir a segurança nos recintos — e aqui poderão incluir-se casos de actos de incitamento à violência. O problema é que é muito difícil imputar a responsabilidade ao clube visado, já que tem de ficar demonstrado que não foi feito tudo o que era possível para evitar este tipo de situações.