Vendas online dominam crimes cometidos pela Internet
Em algumas comarcas este tipo de crimes já representa um terço dos denunciados. No Algarve destaca-se a fraude no aluguer de casas por via electrónica.
As vendas online dominam os crimes praticados através da Internet, revela o Relatório de Actividade do Gabinete de Cibercrime do Ministério Público, divulgado nesta sexta-feira. Em todas as comarcas “foi relatado que este é um fenómeno que, apesar de ser já muitíssimo expressivo, é também grandemente crescente".
O relatório não detalha o número global de crimes desta natureza porque, como é explicado, não há estatísticas que descrevam de forma cabal a dimensão dos que acontecem online. Porém, os investigadores não têm dúvidas em afirmar que as vendas na Internet — compra de objectos que, depois, não são entregues, mas também por vezes a venda de objectos, com entrega do mesmo, sem que o pagamento seja feito — são “uma das mais importantes manifestações criminais que têm chegado ao Ministério Público”.
Estas vendas fraudulentas têm sido denunciadas quer em plataformas legítimas de vendas, quer em perfis do Facebook que, logo de seguida, são apagados, quer ainda em páginas web deliberadamente abertas para este efeito e, em regra, domiciliadas em servidores estrangeiros.
Há comarcas, como a da Amadora (Comarca de Lisboa Oeste), em que “cerca de um terço da criminalidade denunciada se refere a burlas online”, prossegue o relatório. “Mesmo em comarcas de menor dimensão, foi sublinhada a expansão crescente deste fenómeno. Na Guarda, por exemplo, foi relatado haver, por ano, largas dezenas de casos de burlas cometidas pela Internet."
Burlas com casas de férias
Algumas comarcas registam burlas desta natureza com contornos peculiares. Na comarca de Faro, por exemplo, “foi reportado ter muita expressão o número de burlas online no arrendamento de casas de férias”. Pessoas que alugam casa por meio electrónico, pagam um sinal por transferência bancária ou outro meio e, quando chegam ao local, a casa não existe ou é uma residência que não está nem nunca esteve para alugar.
Segundo o Relatório Anual de Segurança Interna de 2016, revelado na semana passada, o crime de sabotagem informática foi o que mais cresceu: nada menos de 147,4%, tendo passado de 76 queixas em 2015 para mais do dobro (188) um ano depois.
Este documento revela que foram constituídos 330 arguidos por burla informática e nas telecomunicações e 16 por falsidade informática
Muitos casos de phishing
Foram igualmente noticiados muitos casos de queixas por prática de phishing bancário — prática que, por meios fraudulentos, leva as pessoas a divulgarem dados bancário aos criminosos.
“Este tipo de fenómeno criminal assumiu já uma grande dimensão. Na comarca de Lisboa Norte foi referido que, em média, darão entrada, talvez, 20 a 30 casos novos, por mês. No DIAP de Lisboa este tipo de inquéritos está distribuído às 3.ª e 8.ª secções, as quais investigam todo o tipo de burlas. Foi dada conta de que, nestas secções, cerca de um terço dos processos respeitam a phishing”, acrescenta o documento
Foi igualmente registado com “grande significado estatístico”, as participações respeitantes à criação de perfis falsos em redes sociais, em particular no Facebook.
“Normalmente, estes perfis falsos estão associados quer à disseminação de conteúdo injurioso (em especial textos ou fotografias), quer à divulgação de dados pessoais ou íntimos de terceiros, abusivamente obtidos", lê-se no relatório. "A par, foi referida a ocorrência de crimes contra a honra por via de blogs ou por meio de correio electrónico."
Apurou-se também terem alguma expressão os casos de acessos ilegítimos a sistemas informáticos — tanto a contas bancárias, como a contas de correio electrónico, sobretudo em contextos de relações pessoais que cessaram (ex-maridos/mulheres ou ex-namorados/namoradas).
Noutra vertente, já em meados de 2016, “anotou-se o surgimento, com tendência crescente, de casos de ransomware”. São situações que podem ser criminalmente enquadradas no dano informático ou na sabotagem informática e que se traduzem, na perspectiva da vítima, no recebimento de uma mensagem de correio electrónico, infectada com malware que, uma vez aberto, encripta os dados do computador. Depois, surge no monitor uma mensagem a informar que os dados apenas serão libertados mediante um pagamento de uma quantia monetária.
“Muitas destas queixas que foram surgindo, como se disse de forma crescente, foram apresentadas por empresas que, tendo backups dos seus dados, pretendiam reportar a situação para poderem vir a justificar (por exemplo, por razões societárias ou fiscais) a perda de documentos de gestão.”
Pornografia infantil também a crescer
Por último, o relatório revela que crimes na área da pornografia infantil têm também vindo a crescer. Desde Outubro de 2013 a até Junho de 2016, o Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP) recebeu 2880 participações. Destas, 1350 deram origem à abertura de inquérito, dos quais foram remetidos para as comarcas 601. No DCIAP foram arquivados 634 inquéritos. Até Julho de 2016, foram proferidas nestes inquéritos 20 acusações, número esse que chegaria a 28 no fim do ano de 2016.
Segundo o Relatório Anual de Segurança Interna de 2016, os crimes de pornografia com menores na Internet cresceu 36% em relação a 2015.
Já em jeito conclusão, o relatório revela que “de um modo generalizado, foi dada conta de imensa demora na realização de perícias informáticas, pela Polícia Judiciária". "Esta demora tem prejudicado de forma excepcionalmente grave as investigações."
Por outro lado, anotou-se que, em bom número das comarcas, “a criminalidade relacionada com a Internet já tem sido distribuída de forma concentrada a um ou mais magistrados, tirando-se assim proveito de alguma especialização que vai já surgindo.”