O regresso-surpresa de Kendrick Lamar (e a NBA, Deus, e a bicada a Drake)
The Heart Part 4 surgiu de surpresa na noite desta quinta-feira. Nela, o rapper deixa uma data, 7 de Abril, que parece ser a da edição do sucessor do celebrado To Pimp a Butterfly.
Esta quarta-feira, a Internet (e quem tecla na Internet) entrou em polvorosa. Tudo por causa de um post de Kendrick Lamar na sua conta de Instagram. Tratava-se da simples imagem de um quatro romano (IV) sobre um fundo negro. Habituados aos teasers como protocolo contemporâneo de antecipação do anúncio de novas edições, e tendo em conta que o próximo de álbum de Lamar será o quarto da sua discografia, especulou-se o óbvio: que o rapper estaria a preparar o anúncio do sucessor de To Pimp a Butterfly. Na manhã seguinte, o post no Instagram fora apagado. À noite, desfez-se o mistério. Não era um novo álbum. Era uma nova canção, The heart part 4. Mas o álbum não deverá tardar muito: “Y’all got ‘til April 7th to get ya’ll shit together”, avisa Kendrick.
The heart part 4 , disponível nas plataformas de streaming, não demorou a ser analisada, esmiuçada, descodificada verso a verso, ou não falássemos de um dos maiores nomes do cenário musical contemporâneo, autor de um To Pimp a Butterfly distinguido como álbum do ano nas mais diversas publicações (incluindo o Ípsilon) e considerado um dos mais importantes do nosso tempo. Temos referências ao presidente norte-americano, Donald Trump, e à sua relação com a Rússia: “Donald Trump is a chump, know how we feel, punk/ Tell ‘em God comin’/ And Russia needs a replay button, y’all up to something”. Pelo meio, há rimas que citam duas estrelas da NBA e que deixaram os adeptos em alvoroço.
Recentemente, Kevin Durant, que formava com Russel Westbrook a grande dupla dos Oklahoma City Thunder, abandonou a equipa para se juntar às estrelas dos Golden State Warriors, e o mundo da NBA dividiu-se entre os que defenderam Durant e os que o acusaram de se vender por desejo de glória fácil. Westbrook, por seu lado, escolhendo manter-se com os seus Thunder, passou a ser o herói dos românticos. Kendrick alinha com Westbrook: “You jumped sides on me, now you 'bout to meet Westbrook/ Go celebrate with your team and let victory vouch you/ Just know the next game played, I might slap the shit out of you”. Especula-se também que a referência desportiva, a par de um verso como “Don’t tell a lie on me/ I won’t tell the truth ’bout you”, pode esconder, afinal, um ataque a Drake, outro gigante da música do nosso tempo (Tell me lies, cantava ele em 2011), com quem Lamar tem trocado versos pouco simpáticos ao longo dos últimos anos – isto depois de, antes disso, terem colaborado e de se terem elogiado mutuamente. Drake, o músico que mais vendeu em 2016 e que editou há uma semana More Life, seria, na analogia, aquele que se vendeu ao mundo do estrelato. E ainda há espaço, logo a início, para aquilo que se diz serem bicadas ao antigo colaborador Big Sean: "My fans can’t wait for me to son ya punk ass and crush your whole lil shit/ I’ll Big Pun ya punk ass, you a scared little bitch/ Tiptoein’ around my name, nigga, ya lame/ And when I get at you, homie, don’t you just tell me you was just playin'”.
Especulações à parte, certo é que Kendrick Lamar tem uma nova canção e que ela dá sequência a uma série iniciada em 2009, ano em que foi editada Heart part 1. A Part 2 foi incluída na mixtape Overly dedicated e a terceira editada pouco antes do lançamento do segundo álbum, good kid, m.A.A.d city, que o transformou em estrela reluzente do cenário hip-hop e para além dele – foi na sequência desse disco que o tivemos, por exemplo, como cabeça de cartaz do festival Nos Primavera Sound, no Porto, regressando a Portugal, já depois de editado To Pimp a Butterfly, para actuar, na mesma condição, no Super Bock Super Rock de 2016.
Quanto ao novo álbum, temos, por agora, a referência a 7 de Abril como possível data de lançamento e, quanto ao seu conteúdo, uma entrevista ao New York Times, no início de Março, em que declarou vivermos num tempo do qual “excluímos uma componente maior de toda esta coisa a que chamamos vida: Deus”. Disse ser nessa ideia que está mais focado actualmente. “Ninguém fala Dele porque surge quase em conflito com tudo o que se está a passar no mundo quando falamos de política, do governo e do sistema”. Em 2014, como recorda agora a edição online da National Public Radio, Kendrick Lamar escolheu para a noite de Halloween um disfarce de Jesus Cristo. No ano seguinte, declarava à Fader que, escolhendo idolatrar alguém naquela noite, não vestiria a pele de um monstro ou de uma estrela. “Vou idolatrar o Mestre, quem eu sinto que é o Mestre, e tentar caminhar na Sua luz. É difícil, é algo que, provavelmente, nunca conseguirei fazer, mas vou tentar. Não apenas com este disfarce, mas na minha vida de todos os dias."