Viaduto de Alcântara sem substituição à vista
Provisória há quarenta anos, a estrutura metálica teve uma "deslocação" esta quarta-feira, o que tornou caótica a manhã lisboeta. Mas não existe qualquer previsão de quando um novo viaduto será construído.
A construção de um novo viaduto em Alcântara, em substituição da estrutura metálica que esta quarta-feira teve problemas num dos pilares, está oficialmente prevista pela Câmara Municipal de Lisboa desde o fim de 2014. No entanto, a autarquia não sabe quando é que o dito viaduto poderá ser construído, uma vez que a solução está dependente de outras entidades.
A ligação rodoviária entre a Rua de Cascais/Avenida de Ceuta e a Avenida de Brasília, por cima da Linha de Cascais, é uma das obras programadas no Plano de Urbanização de Alcântara, aprovado pela Assembleia Municipal de Lisboa em Dezembro de 2014 e publicado em Diário da República em Fevereiro do ano seguinte.
Nunca foi definido, contudo, um prazo para a sua concretização. O Plano de Urbanização de Alcântara, muito polémico e aprovado apenas com os votos da maioria socialista, começou a ser pensado em Março de 2008 e sofreu várias mudanças até ser finalmente aprovado seis anos depois. Uma primeira versão desse plano previa, por exemplo, que a linha ferroviária fosse enterrada e ligasse as estações de Alcântara-Mar e Alcântara-Terra entre si e a uma futura estação de metro.
Com a chegada da troika, essas ideias ficaram adiadas. O mesmo aconteceu com o viaduto. “O viaduto que estava previsto construir para ligar a Rua de Cascais e a Avenida de Ceuta à Avenida de Brasília foi retirado de primeira prioridade e passou também para muito mais tarde”, disse o vereador do Urbanismo, Manuel Salgado, na sessão da assembleia municipal que aprovou o plano, em 2014.
Num dos documentos que então foram votados pode ler-se que “parte-se do princípio que, numa primeira fase, não serão construídas” seis infra-estruturas previstas no plano. As mesmas “só serão executadas mais tarde, quando as condições económicas e financeiras o permitirem”. Nesse documento é apontada ainda outra razão: “A manutenção do acesso ferroviário entre as estações de Alcântara-Terra e a zona portuária inviabiliza a construção do viaduto que liga a Av. Brasília à Av. de Ceuta, não sendo viável, de acordo com informações da Refer, a construção de acessos ferroviários alternativos à superfície”.
Isso mesmo foi sublinhado esta quarta-feira por uma fonte da autarquia, em resposta a perguntas do PÚBLICO, que procurou saber porque é que ainda não se avançou com a construção de um novo viaduto. “O plano consiste em directrizes que estão previstas para o território”, disse, mas “há várias entidades envolvidas” na definição das acessibilidades da zona. A autarquia espera, nomeadamente, pelas medidas concretas do Plano Estratégico de Desenvolvimento do Porto de Lisboa, apresentado na semana passada, e que contempla a “reorganização do terminal de contentores de Alcântara”. A Infraestruturas de Portugal (herdeira da Refer e gestora das linhas férreas) é outra entidade que tem de se pronunciar.
Últimas obras foram em 2005
Em 2014, Manuel Salgado explicou que “em contrapartida” a esse adiamento sine die “foram propostas pequenas alterações aos viadutos metálicos, mantendo os viadutos metálicos em funcionamento”.
Os viadutos metálicos de Alcântara foram construídos em 1972 pela Construtora Moderna, empresa de metalomecância sediada em Pedrouços. Inicialmente pensados como construções provisórias, acabaram por se manter no local nas últimas quatro décadas. Em 2001, a Administração do Porto de Lisboa, que então geria toda a zona ribeirinha da cidade, chegou a anunciar o início das obras de novos viadutos para Junho de 2003. Manuel Anastácio, à data director de planeamento do Porto de Lisboa, dizia na altura ao PÚBLICO que a estrutura, que ainda hoje subsiste, "já não tem capacidade para escoar o tráfego existente". Porém, nada aconteceu entretanto.
A última vez que estes viadutos tiveram obras de fundo foi em 2005, quando o Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC) divulgou um relatório em que referia a falta de “segurança para a circulação rodoviária de pesados” – veículos que usam estes viadutos frequentemente, uma vez que é em Alcântara que está situado um dos terminais de contentores de Lisboa. “A segurança fica bem garantida. O viaduto fica em condições de ficar aqui mais 30 anos, mas eu espero que isso não aconteça”, disse Santana Lopes, então presidente da câmara, no fim das obras.
Na noite de terça para quarta-feira, um camião embateu num pilar de um dos viadutos e originou "uma deslocação da estrutura", nas palavras de Carlos Castro, vereador da Protecção Civil da Câmara Municipal de Lisboa. Ou seja, separaram-se duas partes do tabuleiro rodoviário. Apesar dos receios e dos constrangimentos ao trânsito automóvel e à circulação de comboios durante a manhã de quarta-feira, o vereador Manuel Salgado garantiu que “não existe risco de derrocada” e que os viadutos cumprem “todos os requisitos de segurança”. O responsável pelo Urbanismo afirmou que a última vistoria técnica foi feita a 13 de Fevereiro.
Apesar destas garantias, a oposição na câmara critica a maioria socialista. "Estou muito preocupado com o que começa a estar visível na cidade relativamente às consequências da falta de investimento na sua manutenção", disse o vereador António Prôa à Lusa. O social-democrata põe em causa “o trabalho de verificação e inspecção das condições de segurança das infra-estruturas de Lisboa” e comenta que “aparentemente, não tem sido feito o suficiente”.
Já para Carlos Moura, do PCP, também ouvido pela Lusa, “parecem multiplicar-se na cidade as situações em que faltou o cuidado e a observação do que poderia levantar risco”. A câmara “está a fazer muitas obras que eram necessárias, sim, mas que eram maioritariamente visíveis. As que não são tão visíveis ficaram para trás e estão a dar problemas”, acrescentou o comunista.
João Gonçalves Pereira, do CDS, visitou o local e disse esperar que este assunto seja esclarecido na reunião privada da câmara desta quinta-feira. “É importante”, afirmou o centrista, que a autarquia forneça “todos os elementos, designadamente em relação ao acidente” que terá originado este problema.
Além dos viadutos em Alcântara existem ainda outros de semelhante estrutura na zona ribeirinha: um na Avenida Infante Santo (a última grande intervenção deu-se quando João Soares ainda era presidente da câmara) e dois, um em cada sentido, junto à Torre de Belém. Desde 2011, no âmbito de uma proposta de requalificação da Doca de Pedrouços, que está prevista a “substituição dos viadutos metálicos por micro-túneis” neste último caso.