Directores receiam que escolas percam autonomia com descentralização
Debate promovido pelo Ministério da Educação está a decorrer em Coimbra. Escolas avisam que "não verão com bons olhos" que “sejam transferidas para as autarquias competências que sempre foram" da sua responsabilidade.
A descentralização de competências na educação não deve ser sinónimo de perda de autonomia das escolas, defendem os directores. O presidente do Conselho das Escolas (CE), José Eduardo Lemos, espera que, como consequência do processo, estas não se transformem em “anódinos serviços educativos autárquicos”.
O responsável falava na sessão de abertura da conferência sobre o modelo de descentralização de competências na educação organizado pelo Ministério da Educação, que decorre nesta quarta-feira no Conservatório de Música de Coimbra. Uma das ideias mais defendidas ao longo da manhã por vários responsáveis pelas escolas foi a de que a descentralização da educação não deve significar a sua municipalização. José Eduardo Lemos diz que as escolas “não verão com bons olhos que a descentralização administrativa se opere por conta da sua escassa autonomia” e que “sejam transferidas para as autarquias competências que sempre foram da responsabilidade das escolas”.
Admitindo que o sistema educativo está “excessivamente centralizado”, o presidente do CE defende que o serviço público de educação “só pode melhorar se forem transferidas competências para os decisores escolares”.
A secretária de Estado da Educação, Alexandra Leitão, procurou responder a algumas das preocupações, referindo que “é com vista a saber como operacionalizar em concreto as soluções” que a conferência desta quarta-feira se realiza.
A proposta de lei que prevê a transferência de competências em várias áreas, como a Educação e a Saúde, vai a debate na Assembleia da República esta semana. Na Educação, especificamente, o processo implica, por exemplo, transferir para as autarquias a gestão do pessoal não docente de todos os ciclos de ensino, do pré-escolar ao secundário, algo que já é prática em 15 municípios que assinaram contratos de descentralização com o anterior Governo (e que foram postos em prática já com o actual Executivo). As carreiras dos professores e a dimensão pedagógica continuam na competência do Ministério da Educação.
“As escolas não são todas iguais”
Alexandra Leitão sublinhou que a descentralização deve passar responsabilidades “seja para as autarquias, seja para as escolas”, mas “sempre com respeito pela sua autonomia”.
Também o presidente da Associação Nacional de Directores de Agrupamentos e Escolas PúblicasEscolares (Andaep), Filinto Lima, manifestou receios sobre a questão da autonomia. “As escolas têm pouca autonomia. Vão reforçá-la neste processo?”, questionou.
O dirigente advertiu ainda para a necessidade de se avaliar o actual modelo antes de acabar com ele e para as diferenças entre a dimensão das autarquias e agrupamentos. “Temo que o próximo modelo seja alicerçado num algoritmo”, afirma, acrescentando que “as escolas e os municípios não são todos iguais”.
Para Filinto Lima, as mudanças “não devem ser feitas em cima do joelho”, pelo que um novo modelo não deve estar pronto antes das eleições autárquicas deste ano.
No segundo painel da manhã, naquela que foi a intervenção mais aplaudida pela sala, o presidente da Câmara de Loures, Bernardino Soares, sublinhou que a transferência de competências para as autarquias tem que ser acompanhada pelo respectivo aumento da dotação financeira.
À porta do Conservatório, a Federação Nacional de Professores (Fenprof) mostrava-se contra a municipalização da educação e “globalmente” contra a proposta do Governo por entender que a proposta de lei aprovada em Conselho de Ministros não respeita a autonomia das escolas. Em declarações ao PÚBLICO, Mário Nogueira, secretário-geral da federação, defendeu a necessidade de diálogo sobre esta matéria e disse que “a pressa do Governo” não favorece o debate.
Sobre o reforço de competências, o sindicalista explica que as escolas “têm condições para fazer bem, desde que tenham recursos”. Um processo de municipalização da educação “abre portas à privatização de alguns serviços”, ao mesmo tempo que cria condições para assimetrias no país, dependendo da capacidade de cada município, adverte Mário Nogueira.