Turismo e lei das rendas reabilitaram Lisboa, diz Cristas
Se for presidente da câmara, Cristas diz que não reverte a municipalização dos transportes.
A dinamização do turismo e a lei das rendas permitiram a reabilitação urbana em Lisboa. Mas Assunção Cristas quer mais. Diz que é preciso regulamentação e olhar para as pessoas, para os problemas sociais, para o isolamento dos idosos e para as necessidades habitacionais da classe média. É para isso que se candidata à câmara da capital, garante.
Do que é que Lisboa mais precisa?
Precisa de ter uma cidade que respeite e acolha os seus habitantes, sejam permanentes ou ocasionais — os que aqui trabalham, ou que nos visitam. Lisboa precisa de uma forte dimensão social que tem ficado muito esquecida. A pobreza, os sem-abrigo, os bairros sociais, as carências nas escolas públicas são muito grandes. E esta agenda social tem sido muito posta em segundo plano. Temos a população mais envelhecida em cidades europeias, muitas pessoas idosas e isoladas (muitas pessoas isoladas em casa), temos bairros sociais degradados que não sofreram qualquer intervenção, temos escolas em situação dramática. Temos transportes públicos caóticos, um trânsito péssimo, um estacionamento que não funciona.
Se for eleita, tentará reverter a municipalização da Carris?
Não. Fizemos uma avaliação muito realista. Discordámos da posição que este Governo tomou, o modelo [do Governo anterior] tinha uma visão clara de tratamento em conjunto do Metro e da Carris, através de uma subconcessão. Era um modelo possível, que na altura porventura era o único que garantia o investimento necessário nestas áreas — é sobretudo uma questão pragmática, não havia dinheiro. Este Governo, por uma razão ideológica, reverteu essas subconcessões — e espera-se que faça esse investimento. A Carris veio para a câmara, muito bem. O que é preciso garantir é que funciona de forma articulada. Mas trabalharemos com o actual quadro. Critiquei este Governo por ter chegado e deitado este modelo abaixo este modelo do Metro e da Carris. Obviamente não farei o mesmo que eles.
O aumento do turismo em Lisboa é positivo?
É muito positivo para a cidade. Mas ao mesmo tempo lança desafios sérios — e há muito trabalho que tem de ser feito, na mobilidade, na habitação e na questão da higiene urbana. E também um pouco na questão da segurança.
Mas como vê as críticas, que são em parte também para o anterior Governo e para a gestão do seu vice-presidente, Adolfo Mesquita Nunes, de que Lisboa está invadida por turistas?
Quando olhamos para as cidades que estão no topo do turismo mundial, vemos que Lisboa está muito longe ainda de chegar a esses lugares cimeiros. Há cidades que têm muito mais turistas...
Mas precisa de regulamentação?
Precisa de várias coisas: precisa de ter mais pontos de interesse para os turistas, de forma a que não estejam tão concentrados nos mesmos sítios; precisa de ter mais transporte público a funcionar bem, de ter trânsito mais fluido, que os habitantes não sintam isto como uma ameaça à sua actividade diária, mas como uma oportunidade para os seus negócios e para a reabilitação de Lisboa, porque a cidade estava muito morta. Lisboa veio a decair do ponto de vista da população desde os anos 80, em que atingiu 900 mil habitantes, para agora ter 540 mil. Esta novidade levou a uma boa regeneração e a que Lisboa tivesse mais interesse para os próprios lisboetas e para quem, morando na periferia, de repente vê a cidade mais interessante para se mudar [para ela].
O presidente da câmara já disse várias vezes que a lei das rendas, de que é autora, é a principal responsável pelo fim de muito comércio tradicional na cidade. Como é que responde a esta crítica?
Dizendo que a câmara pode e podia fazer mais do que aquilo que fez. E nalguns casos isso não aconteceu. A lei das rendas foi feita com um cuidado muito grande em relação às pessoas idosas e às pessoas de maior carência, com objectivo muito claro de favorecer a reabilitação urbana. O presidente da câmara não pode ao mesmo tempo vangloriar-se com a reabilitação urbana (que tem que ver com a lei das rendas) e depois dizer que esta acaba com o comércio tradicional. O que não há em Lisboa é uma estratégia de comércio para a cidade. Se a loja com história é um activo da cidade, se se diz que tem um interesse comum, tem de ser o município a encontrar mecanismos de subsidiação. O que não pode acontecer é dizer-se: há um interesse geral de todos, mas há só um que paga, que é o proprietário do edifício.
O que é que a autora da lei das rendas diz às pessoas que foram despejadas das suas casas por esse fenómeno de dinamização do mercado de arrendamento com o turismo?
As pessoas que tinham contratos antigos, com carência económica e mais de 65 anos não foram despejadas. Eram os casos que era importante salvaguardar. Houve pessoas com contratos mais antigos que podiam [pagar] e cujas rendas foram actualizadas. O que creio que faz falta é ter programas de habitação para a classe média — e a câmara também tem falhado aí. Temos bairros sociais onde vivem 20% dos lisboetas. Temos habitação de luxo, que vai aparecendo, mas temos uma classe média que (fruto do turismo) não consegue aceder à habitação em Lisboa. Agora há propostas de renda acessível, mas estão aquém daquilo que pode ser uma dinâmica nessa área.