Cas Mudde: “A política tornou-se tridimensional”
Cas Mudde é holandês, cientista político e estudioso dos populismos. Apesar de viver nos Estados Unidos, tem uma visão privilegiada sobre as eleições legislativas holandesas.
As sondagens indicam que os resultados eleitorais na Holanda serão muito fragmentados. Quem ganha com este cenário?
Esta campanha tem sido a campanha mais à direita de que me lembro e tenho a certeza absoluta de que nunca foi assim. Não é apenas Geert Wilders, é o partido do primeiro-ministro, o partido conservador VVD, os democratas cristãos do CDA, mesmo a esquerda radical do SP já começou a falar de fechar fronteiras e temos o Partido Pensionista que se posiciona muito à direita. Quer Wilders esteja no governo ou não, estamos a enfrentar uma forte reorientação à direita.
A questão é: vamos ver uma coligação homogénea eurocéptica, hostil à imigração e ao islamismo? Vamos ver uma transição da islamofobia fanática de Geert Wilders para uma preocupação moderada com o Islão, como no caso dos cristãos democratas, ou será uma coligação de cinco ou seis partidos sem nada em comum excepto o desejo de manter Wilders afastado do poder? Nenhuma destas opções é boa e nenhuma será estável.
Creio que estamos a dar demasiada ênfase à vitória, ou derrota, de Wilders porque a sua percentagem de voto não irá ultrapassar os 18%, o que significa que serão necessários três ou quatro partidos para formar governo. A questão essencial é que a política holandesa está fragmentada de forma absurda e atravessa um período de coligações nunca antes visto. Espera-se que as coisas voltem ao que eram, onde dois partidos formavam uma coligação e punham em prática o seu programa político de forma estável. Isso é impossível, actualmente, com cinco partidos.
O crescimento recente do Partido Verde é uma resposta da esquerda a Geert Wilders?
Em parte, creio que é uma resposta à implosão total dos sociais-democratas, que estão a governar com um partido da direita conservadora. Também há problemas dentro do partido de esquerda radical socialista, que tem um líder que não alcança a maioria das pessoas, especialmente os jovens. Como tal, a Esquerda Verde tornou-se na voz credível da esquerda. Não é tanto o partido anti-Wilders, já existe um partido libertário, o D66, que se tenta posicionar dessa forma, mas demonstra que existem dois países dentro da Holanda. Na verdade, todas as sondagens indicam que o partido que irá ter maior crescimento em percentagem de votos será o Partido Verde e, no entanto, ninguém refere isso.
É a mesma fragmentação que observamos nos Estados Unidos. Vamos testemunhar o mesmo a acontecer na Europa?
Sim, acho que é uma consequência, não tanto para a Holanda porque os sistemas eleitorais são importantes e o nosso sistema eleitoral é altamente proporcional e representativo. A política fragmentou-se porque tornou-se demasiado tridimensional e, como afirmei antes, tal significa que existem mais combinações possíveis e as pessoas vão procurar combinações diferentes. Não existe lealdade ao partido como antes, não existe subcultura como existia e o elo de ligação entre as pessoas e os partidos é muito mais frágil. Além disso, no momento de votar, a preferência eleitoral é subtil, não existem tantos sociais-democratas ou conservadores aguerridos e,tal significa que as pessoas mudam de partido. Hoje em dia, um partido grande obtém um terço dos votos; mas já não existem assim tantos partidos desses.