Troika ainda não acredita na retoma e está mais preocupada com o malparado

Comissão Europeia e Fundo Monetário Internacional continuam a traçar um retrato bem mais sombrio da economia portuguesa que o Governo e colocam o problema do crédito malparado cada vez mais no centro do debate.

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Missão da troika de visita a Lisboa em 2014 Nuno Ferreira Santos

Passados quase três anos desde que saiu do país, a troika continua a não acreditar na capacidade de o país para aumentar o seu potencial de crescimento, persistindo no pedido de mais reformas estruturais em Portugal e revelando uma grande nova preocupação: o obstáculo que o crédito malparado acumulado pelos bancos constitui para o aumento do investimento.

Num só dia, duas avaliações de duas das instituições que compunham a troika fizeram um retrato bem mais sombrio do que o do Governo em relação às perspectivas de crescimento da economia portuguesa. Tanto a Comissão Europeia – na avaliação que fez a todos os países da UE no âmbito do Semestre Europeu – como o FMI – no quinto relatório da avaliação pós programa a Portugal – traçaram um cenário em que a economia mantém ritmos de crescimento insuficientes por força da ausência de reformas que lhe permitam aumentar a competitividade, da manutenção de um endividamento muito elevado, tanto do sector público como privado, e da persistência de riscos e fragilidades no sector bancário que não permitem a libertação de fundos para a economia.

Na sua avaliação, Bruxelas voltou a colocar, sem surpresa, Portugal no grupo dos países da União Europeia que enfrentam “desequilíbrios económicos excessivos”. Dentro deste patamar ficaram mais cinco países: França, Itália, Bulgária, Croácia e Chipre.

A classificação de “desequilíbrios económicos excessivos” é a mais negativa que é atribuída nesta fase e significa que entre Abril e Maio, as autoridades europeias irão avaliar a estratégia definida pelos governos destes países (nomeadamente o Programa de Estabilidade e Crescimento e o Programa Nacional de Reformas) e decidir se iniciam ou não um Procedimento por Desequilíbrio Excessivo. Este procedimento é semelhante ao Procedimento por Défice Excessivo, mas focado na situação global da economia e não apenas nas Finanças Públicas, e, segundo as regras europeias, pode resultar, no caso de não tomada sucessiva das medidas recomendadas, na aplicação de multas financeiras ao país.

A Comissão Europeia avalia a forma como cada um dos países respondeu às recomendações que lhes foram feitas no ano anterior, atribuindo cinco tipos de classificações, de mais para menos: Implementação total, progressos substanciais, alguns progressos, progressos limitados e nenhuns progressos.

A Portugal, este ano, as classificações atribuídas pela Comissão foram maioritariamente negativas, por uma ligeira margem. Das cinco grandes recomendações feitas, em três foi considerado que se registaram “progressos limitados” e em duas “alguns progressos”.  Decompondo por sub-recomendações (que foram quinze), em sete vêem-se “alguns progressos”, noutras sete “progressos limitados” e numa “nenhuns progressos”, o resultado mais negativo.

Em anos anteriores, as avaliações tinham sido mais positivas. Em 2016, tinha havido quatro recomendações onde, de acordo com Bruxelas, se registaram “alguns progressos” e uma onde se viram “progressos limitados”. Em 2015, estavam em causa oito recomendações e a avaliação tinha-se dividido por seis áreas com “alguns progressos”, uma com “progressos limitados” e uma com “progressos substanciais”.

Na conferência de imprensa que se seguiu ao anúncio destes resultados, o vice-presidente da Comissão Europeia, Valdis Dombrovskis explicou a decisão de incluir Portugal no grupo de países com “desequilíbrios económicos excessivos” com o facto de o país apresentar diversas “fragilidades estruturais” na sua economia. Em particular, destacou o baixo nível de produtividade, o endividamento elevado tanto do sector público como do sector privado e a manutenção de uma taxa de desemprego alta. O problema do crédito malparado também foi citado como um dos principais problemas que afectam a capacidade do país para crescer.

Dombrovskis deixou ainda claro que “Portugal fez um progresso limitado no cumprimento das recomendações” que lhe foram feitas em exercícios anteriores e disse esperar “a apresentação de um programa ambicioso de reformas”.

O comissário europeu para os Assuntos Económicos e Financeiros, também presente na conferência de imprensa, interveio para acrescentar, em relação a Portugal, alguns pontos positivos de análise, elogiando “os dados económicos encorajadores” dos últimos trimestres e “os resultados obtidos no défice”.

Do lado do FMI, apesar de reverem em alta de 1% para 1,3% a estimativa de crescimento para 2016, os seus técnicos apontam para uma taxa de crescimento do PIB de também 1,3% este ano, o que, a concretizar-se, significaria na prática a quase estagnação da economia portuguesa durante os próximos quatro trimestres.

A falta de confiança do FMI em relação ao potencial de crescimento em Portugal está relacionada com os níveis de endividamento elevados que se registam tanto no sector público como privado e, principalmente, com aquilo que o Fundo defende ser o “congelamento” das reformas estruturais no país.

Este tipo de críticas tem sido recorrente nos relatórios das duas instituições desde que a troika saiu de Portugal em 2014 (e também antes), mas há um ponto que tem vindo a ganhar destaque de relatório para relatório: a fragilidade da banca e, particularmente, a necessidade de se encontrar rapidamente em Portugal uma solução para a questão do crédito malparado.

A Comissão afirma que “a rendibilidade do sistema financeiro continua afectada pelo elevado stock de crédito malparado”, assinalando que os progressos nesta matéria “continuam a ser lentos e novas necessidades de recapitalização são prováveis”.

O FMI concorda que a acumulação de um enorme volume de crédito malparado na banca é um dos principais obstáculos ao crescimento da economia portuguesa, mas não é com dinheiro público que o problema se pode resolver. “O elevado nível de dívida pública não deixa qualquer espaço de manobra orçamental para que haja financiamento público para um ‘banco mau’”, diz o Fundo, defendendo que, por isso, se torna essencial “que os bancos sejam capazes de obter capital privado adicional”.

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