Marcelo diz que é mais fácil mudar leis que mentalidades sobre paridade

Presidente diz que sempre foi a favor das quotas por género, quando o Parlamento discute a sua introdução nas empresas públicas e nas cotadas.

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O Presidente confessou que sempre foi a favor da igualdade de género ARMÉNIO BELO / LUSA

“É mais fácil elaborar leis do que aplicá-las e do que mudar mentalidades”, afirma Marcelo Rebelo de Sousa. Para o Presidente da República, não basta legislar uma maior participação das mulheres nas administrações das empresas públicas e das cotadas em bolsa, a questão é mais profunda que isso.

Intervindo num ciclo de conferências sobre igualdade de género, na sede regional da Ordem dos Médicos, em Coimbra, o Presidente entende que “há um problema de cultura cívica”.

“As leis têm vindo a consagrar ao longo do tempo, na nossa democracia, uma aproximação em termos de igualdade de género do estatuto jurídico, do estatuto laboral, do estatuto laboral e económico da mulher e do homem. Mas depois a prática fica aquém disso”, lamenta.

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Marcelo, o presidente do Instituto Politécnico de Viana do Castelo, Rui Teixeira, e o presidente da Câmara de Valença, Jorge Mendes, na inauguração do Centro de Inovação e Logística LUSA/ARMéNIO BELO

Uma das áreas em que a desigualdade de género mais se faz notar, assinala Marcelo, é na política. “Estamos longe do que devia ser o patamar desejado” e “na política isso é evidente”. O presidente dá como exemplo a diferença entre a composição das listas quando são submetidas a eleições e no final do mandato. “A composição da lista inicial não tem nada a ver com a lista final”, afirma.

As declarações do presidente surgem no final de uma semana em que a questão da paridade voltou à Assembleia da República. Os deputados debateram na quinta-feira passada, uma proposta do governo para introduzir quotas de género nas administrações nas empresas da bolsa e do Estado, tendo o diploma baixada à discussão na especialidade sem votação.

O objectivo é que um terço dos cargos de direcção das empresas cotadas em bolsa, bem como das empresas públicas, seja ocupado por mulheres. O calendário proposto pelo Governo divide o privado do público e é faseado. Para as empresas do Estado, as quotas devem atingir um terço de um dos géneros até 2018. Para as 46 empresas cotadas na bolsa de Lisboa há uma meta de 20% até 2018 e de 33,3% até 2020.

Sem nunca se referir directamente aos trabalhos parlamentares, Marcelo reforçou este ponto em vários momentos do discurso: “De pouco serve estar a criar fórmulas se depois não olharmos atentamente para a sua aplicação”. Para além da política, o Presidente fala no exemplo das cotadas em bolsa e refere que, ao olhar para a sua gestão verifica-se “uma desigualdade manifesta entre homens e mulheres”.

No discurso o Presidente da República lembrou a sua “outra encarnação política”, quando liderava o PSD, e falou nas “guerras” que teve com as mulheres do partido “por causa da questão das quotas”. Há duas décadas iniciou-se a discussão sobre o assunto em relação à política e o PSD foi oficialmente contra.

“Sendo eu um defensor das quotas elas diziam ‘mas nós não podemos ascender a posições só pelo facto de sermos mulheres, isso não chega a ser humilhante, mas é desprestigiante’”, revelou Marcelo, acrescentando que, como “bom democrata”, foi então vencido na comissão política do próprio “partido, quando queria levar uma iniciativa legislativa à Assembleia da República instituindo o regime de quotas.

Em Outubro, o presidente da Associação Nacional de Bioética, Rui Nunes, também presente em Coimbra, liderou uma equipa que apresentou uma proposta de declaração universal de igualdade de género junto da UNESCO. Marcelo disse que a proposta conta com o seu apoio e falou na necessidade de levar à UNESCO “uma declaração universal que seja fruto de um consenso nacional alargado”.

Entre os sete convidados que discursaram no painel de abertura da conferência sobre igualdade de género, apenas um, a presidente da União Geral dos Trabalhadores, Lucinda Dâmaso, é mulher.

Caixa é assunto “morto”

Para Marcelo, a novela da Caixa Geral de Depósitos terminou. “Esse assunto está morto. Portanto, como está morto, já não ressuscita”. O Presidente da República respondia assim aos jornalistas quando questionado sobre as declarações do líder parlamentar do PSD, Luís Montenegro.

O responsável social-democrata referiu-se a uma eventualidade inconstitucionalidade do Presidente ao ter acesso às mensagens trocadas entre o ministro das Finanças Mário Centeno e o antigo presidente da CGD. “A questão da Caixa, no que me toca, está resolvida definitivamente. Agora temos que pensar é no futuro: na Caixa e na sua capitalização”.

Antes de Coimbra, o Presidente esteve, em Valença, onde apontou para a necessidade de a economia portuguesa crescer a um ritmo superior ao actual. “Precisamos de aumentar as taxas de crescimento, claramente, acima dos 2%”, disse, citado pela Agência Lusa.

Para Marcelo, o crescimento económico é a chave para impulsionar o investimento, reconhecendo que, para que tal aconteça, é preciso “um grande esforço”. "É muito difícil haver investimento público ou privado, a nível mais amplo ou mais restrito se não crescemos mais”, disse. Marcelo apontou ainda para a o papel central da “formação qualificada” no crescimento da economia.

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