35 horas exigem mais nove mil trabalhadores no Estado

No inquérito feito antes da entrada em vigor das 35 horas, um quarto dos serviços públicos estimava que teria de contratar mais funcionários e aumentar a despesa em 151 milhões de euros para responder à redução da semana de trabalho.

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Mário Centeno, ministro das Finanças MIGUEL A. LOPES/LUSA

O regresso à semana de 35 horas em Julho do ano passado não trouxe, segundo o ministro das Finanças, acréscimo global de despesas com pessoal no Estado. Contudo, num primeiro momento, quando as entidades públicas foram chamadas a apresentar a sua estimativa de custos com a medida, cerca de 25% dos serviços e organismos, a maioria do Ministério da Saúde, apontavam para um acréscimo de despesa de 151,2 milhões de euros, resultantes da necessidade de contratar 8921 novos trabalhadores e do acréscimo do número de horas extraordinárias, para dar resposta à redução do horário semanal.

Estes dados constam do relatório sobre o impacto das 35 horas no Estado, realizado no primeiro trimestre do ano passado e enviado na terça-feira à noite à Assembleia da República, ou seja, sete meses depois de a medida ter entrado em vigor.

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O documento tem como base um inquérito realizado a 250 entidades (só cinco não responderam) e a análise foi feita em dois momentos diferentes. Numa fase inicial, o Ministério das Finanças fez um levantamento dos recursos humanos existentes nos serviços da administração central e procurou identificar os impactos da redução do período normal de trabalho. Numa segunda fase, fez uma "ponderação e validação sectorial dos dados obtidos", para tentar acomodar os custos através de melhorias de gestão e tentando reduzir ao mínimo possível o impacto orçamental das alterações no horário semanal.

A grande maioria dos serviços não deu conta de custos orçamentais associados à alteração das 40 para as 35 horas, reportando margens internas de ajustamento, através de ganhos de produtividade, da reorganização das equipas e do reforço da motivação dos trabalhadores.

Porém, 61 serviços (25% do total) estimaram custos relevantes na ordem dos 151,2 milhões de euros, sobretudo nas áreas da saúde, da educação e da justiça. Este valor é o resultado da necessidade de recrutar 8921 trabalhadores e de aumentar em mais de dois milhões de horas o trabalho suplementar. A maior fatia do aumento da despesa, 87%, diz respeito ao recrutamento de novos trabalhadores e apenas 13% corresponde ao acréscimo das horas de trabalho suplementar, refere o relatório.

Numa análise sectorial, mais de 90% dos custos dizem respeito aos hospitais (EPE e SNS), ao sector da educação e da justiça. A saúde é o sector com maior impacto total, cerca de 90 milhões de euros. Porém é na educação que se verifica a maior necessidade de pessoal, enquanto os hospitais lideram no número de horas suplementares estimadas como necessárias.

Confrontado com estes resultados, o Ministério das Finanças chamou as tutelas que reportaram maiores impactos e concluiu que em alguns casos não consideraram o recurso aos trabalhadores com contrato individual que já estavam nos serviços (e que não foram abrangidos pelo relatório) ou identificaram necessidades de pessoal superiores aos recursos existentes em 2013. Desse diálogo, surgiram soluções para minimizar os impactos. Na Saúde decidiu-se contratar mil enfermeiros e acomodar a medida “dentro da reserva orçamental definida no Orçamento para 2016", reduzindo de 90 milhões para 19 milhões o seu impacto.

Na educação decidiu-se renovar os contratos a termos de mais de 2600 assistentes operacionais e colocar os trabalhadores em mobilidades especial em estabelecimentos de ensino. Na justiça ficou assente que haveria necessidade de reforçar a dotação para trabalho extra de guardas prisionais.

O envio do relatório das 35 horas aos deputados coincidiu com a ida de Mário Centeno ao Parlamento, nesta quarta-feira, para uma audição na Comissão Parlamentar de Trabalho e Segurança Social. Porém, os deputados do PSD não pouparam críticas ao ministro por só ter enviado o documento sete meses depois de a medida já estar em vigor e cinco meses depois de terem feito uma pergunta formal ao Governo.

Mário Centeno remeteu a discussão do relatório para uma oportunidade futura e preferiu destacar alguns dados da execução orçamental de Dezembro para provar que a redução da semana de trabalho não teve impactos na despesa global com pessoal, sem apresentar dados que pudessem servir de contraponto ao relatório. "Não existiu um aumento do custo global com pessoal como consequência do regresso às 35 horas", garantiu.

A análise feita pelo Governo mostra que, excluindo o efeito de reversão da redução remuneratória, as despesas com o pessoal na Administração Central tiveram uma taxa de variação homóloga no segundo semestre (1,6%) inferior à do primeiro semestre (2,0%). "Ora, foi precisamente no segundo semestre que se aplicou o período normal de trabalho de 35 horas", destacou.

Também as remunerações certas e permanentes tiveram uma variação homóloga menor face ao primeiro semestre, assim como os abonos variáveis, onde se incluem as horas extraordinárias.

Mário Centeno explicou aos deputados que o crescimento homólogo de 680 milhões de euros nos gastos com pessoal nas administrações públicas deve-se a vários factores – alguns “inesperados” –, mas não tem qualquer relação com a redução do período normal de trabalho.

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