Uma misteriosa onda gigante detectada na atmosfera de Vénus

As imagens do satélite meteorológico Akatsuki, da agência espacial japonesa (JAXA), parecem mostrar o efeito de um dedo a pressionar a superfície de Vénus. Uma enorme e imóvel região brilhante em forma de um arco foi visível na atmosfera do planeta durante vários dias. Depois desapareceu.

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Sequência de imagens que mostra como o arco se mantém imóvel na atmosfera de Vénus Planet-C
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Imagem do arco brilhante em Vénus Planet-C
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Imagens do brilho da temperatura e do brilho ultravioleta no planeta Vénus Planet-C

Durante cinco dias, o satélite meteorológico Akatsuki, da agência espacial japonesa (JAXA), registou imagens de um estranho fenómeno na atmosfera de Vénus. Um arco brilhante que se estendia por mais de dez mil quilómetros e que, surpreendentemente, se manteve imóvel na agitada atmosfera do planeta. As observações tiveram de ser suspensas para algumas operações técnicas na sonda e, quando o satélite voltou a ser ligado e apontado para a mesma região, a onda gigante já não era visível. Um estudo publicado esta segunda-feira na revista Nature Geoscience analisa o fenómeno.

Vénus já foi notícia por causa da formação cíclica daquilo que parecia ser uma nuvem em forma de Y deitado e que tomava conta da atmosfera venusiana na região do equador e em latitudes médias tanto no hemisfério Norte como no Sul. A onda em forma de Y deitado, explicaram os astrónomos em 2015, deve-se ao arrastamento das partículas empurradas pelos fortes ventos horizontais que existem em altitude. Antes disso, em 2013, o planeta já tinha sido notícia por causa da inesperada complexidade do remoinho gigante no pólo Sul. E, em 2007, os primeiros resultados obtidos pela sonda Vénus Express, lançada pela Agência Espacial Europeia (ESA), confirmaram que Vénus também tem relâmpagos e trovões como a Terra.

Agora, o satélite japonês Akatsuki, que entrou na orbita de Vénus a 7 de Dezembro de 2015, oferece imagens de mais um fenómeno impressionante na atmosfera venusiana. A descoberta desta região brilhante e imóvel, dizem os cientistas, é difícil de explicar e parece ser incompatível com a espessa atmosfera superior do planeta, na qual as nuvens se movem a 100 metros por segundo – muito mais rápido do que a lenta rotação do planeta.

Uma equipa de investigadores de vários institutos e universidades japonesas analisou o fenómeno, descrevendo uma enorme região em forma de arco brilhante que se estendia por mais de dez mil quilómetros através da atmosfera superior de Vénus, acima das nuvens, a cerca de 65 quilómetros de altitude. O satélite Akatsuki observou esta onda gigante marcada na atmosfera durante vários dias, constatando que não se movia com os fortes ventos que nestas altitudes viajam a uma velocidade média de 400 quilómetros por hora (os furacões mais fortes na Terra atingem cerca de 250 quilómetros por hora). Permanecia estável, estendendo-se desde a região polar do Norte, atravessando o equador até à região polar do Sul, acima de uma região montanhosa na superfície do planeta.

No artigo científico, os investigadores notam que esta estrutura em forma de arco existiu, pelo menos, durante cinco dias, mantendo a sua forma. “Infelizmente, não há dados após 12 de Dezembro [de 2015] porque a observação foi suspensa devido a operações relacionadas com a órbita e telecomunicações da sonda.” Só a 15 de Janeiro de 2016 é que o satélite japonês Akatsuki voltou a olhar para o local e, desta vez, “a estrutura em forma de arco tinha desaparecido”. Algo semelhante mas com muito menores dimensões terá sido avistado em Abril e Maio de 2016, mas a onda gigante não voltou a aparecer.

O inferno em Vénus

Outras observações anteriores que como esta recorreram a equipamentos que observam no comprimento de onda da luz ultravioleta já tinham detectado arcos na atmosfera de Vénus. Porém, notam os autores, a diferença é que, neste caso, a onda mantinha-se estável e as outras moviam-se, cedendo ao movimento de rotação.

A montanha pode guardar parte da explicação para o fenómeno, sugerem os cientistas. Os autores do artigo referem que a região brilhante, mais quente do que a atmosfera circundante, poderá ser “o resultado de uma onda de gravidade gerada na atmosfera inferior, que flui sobre topografia de montanha – um fenómeno semelhante ao que acontece quando o ar passa sobre montanhas na Terra”, refere um resumo da Nature sobre o estudo. Assim, embora não se saiba ainda se as ondas de gravidade induzidas pelas montanhas se podem propagar rapidamente para cima das nuvens de Vénus, as observações do satélite japonês sugerem que a dinâmica atmosférica deste planeta é ainda mais complexa do que se pensava.

Apesar dos relâmpagos e trovões e de outras semelhanças entre Vénus e a Terra (como, por exemplo, o tamanho: Vénus tem 80% do tamanho da Terra), os dois planetas são muito diferentes. Vénus tem uma atmosfera densa, infernal, com uma temperatura média à superfície de 450 graus Celsius e uma pressão equivalente à pressão existente nos oceanos da Terra à profundidade de um quilómetro.

Como se isso não fosse suficiente, o planeta está envolvido em nuvens espessas de ácido sulfúrico. Por outro lado, Vénus gira no sentido inverso da rotação da Terra e a uma velocidade extremamente lenta. Um dia em Vénus dura 243 dias terrestres, sendo assim mais longo do que um ano venusiano, com apenas 224 dias. A estas diferenças vão agora sendo somados outros fenómenos, que não existem na Terra, como nuvens em forma de Y deitado, complexos remoinhos ou ondas gigantes que permanecem imóveis na sua atmosfera. 

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