Governo lança novo concurso para gestão do Hospital de Cascais em PPP

Bloco de Esquerda e PCP contestam opção de novo concurso para gestão do hospital em parceria público-privada. Administrador hospitalar defende que esta é uma "decisão racional".

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O Hospital de Cascais representa cerca de um quinto dos gastos do Estado com as PPP da saúde RUI GAUDÊNCIO/Arquivo

Contra as expectativas e a vontade dos parceiros da maioria, vai ser lançado um novo concurso público internacional para a gestão em parceria público-privada (PPP) do Hospital de Cascais. Este concurso vai ser feito, apurou o PÚBLICO, de forma a testar o mercado, para o Governo avaliar no final se as propostas são compensadoras para o Estado. Para já, foi posta de lado a possibilidade de regresso da gestão de Cascais à esfera pública, mas o Governo reserva uma decisão para o final do processo, tendo em conta as propostas recebidas.

O Governo avança para o novo concurso suportado nas recomendações da Unidade Técnica de Acompanhamento de Projectos (UTAP) do Ministério das Finanças, que avaliou esta matéria para concluir que a gestão em parceria público-privada é mais vantajosa, ao mesmo tempo que sublinhou a necessidade de alterar vários parâmetros no futuro contrato.

Esta era uma das três opções possíveis. Afastada desde logo a possibilidade de renovar a parceria com os actuais gestores, o grupo Lusíadas Saúde, restava escolher entre a reversão para a gestão pública ou a abertura de um novo concurso, agora com regras e condições diferentes. Foi a última possibilidade que vingou. A decisão conta à partida com a oposição vigorosa do Bloco de Esquerda e do PCP, mas agrada certamente ao Presidente da República, que vinha a fazer pressão neste sentido. Moisés Ferreira, do BE, avisa que o partido vai contestar o novo concurso público e fala mesmo na hipótese de uma “uma iniciativa legislativa”.

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“Decisão racional”

Cumprindo o prazo a que estava legalmente obrigado, o Governo já tinha avisado o responsável pela gestão clínica de Cascais, o grupo Lusíadas Saúde da brasileira Amil (e que integra o norte-americano UnitedHealth Group), que não ia renovar directamente o contrato. Com a validade de dez anos, este acaba no final de 2018, mas nada impede o actual gestor de apresentar uma proposta no novo concurso.

Para a decisão foi fulcral a avaliação do grupo técnico da UTAP, que concluiu que a PPP de Cascais permitiu uma poupança de cerca de 40 milhões de euros entre 2011 e 2015, em comparação com os custos estimados da gestão pública, apesar de ter apresentado resultados inferiores em alguns indicadores de qualidade e eficácia. Mas a comissão da UTAP também sublinhou a necessidade de mudar uma série de parâmetros no contrato.

Entretanto, já foi anunciada a intenção de alargamento do Hospital de Cascais, que actualmente tem 277 camas, com a construção de mais um piso. Mesmo assim, no conjunto dos quatro hospitais geridos em PPP (além de Cascais, Braga, Loures e Vila Franca de Xira), o primeiro é o que implica menores encargos para o Estado. Em 2015, custou 68,1 milhões de euros, 16% do total dos encargos com as PPP na saúde.

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Em teoria, a escolha para Cascais dará o mote para a decisão do modelo a seguir no caso de Braga, que é, este sim, um hospital universitário de grande dimensão (705 camas), mas o ministro da Saúde fez questão de enfatizar, em recente entrevista ao Expresso, que a opção não terá que ser copiada no caso da unidade gerida em parceria com o Grupo Mello.

“É uma decisão racional. A decisão política é baseada em estudos, o que é positivo”, comenta, a título pessoal, o presidente da Associação Portuguesa dos Administradores Hospitalares, Alexandre Lourenço. “Não havendo nada de negativo, é racional manter esta experiência-piloto. Não existe um estudo que diga que esta experiência é muito negativa”, argumenta.

Os estudos e os resultados do benchmarking trimestral da Administração Central do Sistema de Saúde “demonstram que as PPP são mais eficientes e aportam mais qualidade”, frisa o administrador hospitalar, para quem é salutar manter este tipo de projectos que “ainda são residuais” no Serviço Nacional de Saúde. Até porque, reforça, tem havido “paz laboral, não existe grande litigância” dentro destas unidades.

Esquerda contesta

Contra esta interpretação dos estudos e dos indicadores disponíveis, Moisés Ferreira sublinha que o administrador se limitou a analisar os parâmetros económico-financeiros dos hospitais geridos em parceria com privados. “Se virmos os indicadores operacionais, na prestação de cuidados de saúde, os hospitais PPP não são os melhores”, enfatiza. O deputado recorda, a propósito, o último estudo do Tribunal de Contas (sobre o Hospital de Braga) para lembrar que houve um aumento dos tempos de espera para consultas e cirurgias.

“No SNS não podemos ter entidades que visam taxas de rendibilidade da ordem dos 10% e distribuição dos lucros pelos accionistas. O SNS não pode funcionar sob essa lógica do lucro”, acrescenta o deputado. Mesmo do ponto de vista da conflitualidade nas PPP, a visão de Alexandre Lourenço “não é a mais factual”, contesta. “Ainda recentemente, profissionais do Hospital de Cascais denunciaram a precarização das relações laborais, falsos recibos verdes, e há queixas de manipulação de indicadores”, diz. O BE, assegura, vai bater-se por “uma solução alternativa”, sem descartar qualquer hipótese, "mesmo a de uma iniciativa legislativa”. Ao mesmo tempo, Moisés Ferreira pede aos portugueses que exerçam “pressão social”.

Também o PCP se mostra firme na contestação a esta forma de gestão dos hospitais. “O PCP sempre se mostrou contrário às PPP, incluindo as da saúde”, afirma a deputada Carla Cruz. A parlamentar comunista recorda que, “em sede de discussão do Orçamento do Estado, houve a oportunidade de dizer que esta era uma boa oportunidade para a reversão no SNS”. “Iremos insistir na nossa posição”, afirma, ainda que reconheça que “o Governo é do PS e quem toma as decisões é o PS”.

Além da avaliação da comissão técnica da UTAP, no ano passado o Governo encomendou um estudo à Entidade Reguladora da Saúde (ERS) para a comparação entre as quatro PPP e 33 hospitais com gestão pública e características semelhantes. Apresentado em Maio, o estudo da ERS não encontrou “diferenças estatisticamente significativas entre os resultados”. Ou seja, não foram identificadas mais-valias relevantes nem o contrário. Analisando quatro indicadores (eficácia, eficiência, qualidade e custos de regulação), o estudo da ERS concluiu que os resultados são positivos, mas destacou que “não há diferenças relevantes que permitam dizer que o modelo PPP é superior ao da gestão pública de hospitais do SNS”.

Um outro estudo — encomendado pelos gestores das parcerias de Cascais e de Braga à Católica Lisbon School of Business & Economics — concluiu que o Estado poupou cerca de 200 milhões de euros em quatro anos ao optar pelo modelo das PPP.

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