Uma tarde a tentar provar que o orçamento para a Cultura não é “uma enorme desilusão”

Ministro da Cultura foi ao Parlamento anunciar que a concessão do Forte de Peniche está a ser reequacionada e que o Museu Nacional de Arte Antiga pode vir a ter videovigilância.

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Daniel Rocha

Luís Filipe Castro Mendes passou esta tarde no Parlamento a tentar provar que o orçamento de que dispõe para 2017 não é “uma enorme desilusão” – à direita, que voltou às suas contas de subtrair (as mesmas que preocupavam o Bloco de Esquerda há um mês) para concluir que “o investimento real na cultura” é inferior ao que o Governo anterior fez em 2015, e à esquerda, onde a situação no sector continua a ser considerada “de emergência”, tanto quanto se vê da bancada do PCP.

A guerra de números foi, como seria de esperar, inconclusiva: o Governo mantém que os 209 milhões de euros de orçamento consolidado para o próximo ano, negociados “ainda no quadro de uma disciplina financeira exigente”, correspondem a um aumento real de 10,6 por cento na dotação do sector, o PSD mantém que os números "envergonham um Governo e uma esquerda” que “andam com a Cultura sempre no céu da boca”.

Mas do debate acabaram por sair algumas notícias concretas, a começar pelo anúncio, em resposta a uma pergunta do deputado bloquista Jorge Campos, de que o Ministério da Cultura (MC) está a “reapreciar” a contestada concessão do Forte de Peniche a privados, ao abrigo do Programa Revive. Não porque, esclareceu Castro Mendes, o Governo entenda que o monumento seja “absolutamente” intocável, mas porque “o que ali se fizer terá de ter como prioridade” a preservação daquele lugar como “testemunho da luta pela democracia”. À deputada Ana Mesquita, do PCP, que tinha manifestado “enorme preocupação quanto à filosofia” de “dar uso privado a imóveis históricos”, garantiu ainda que o Programa Revive não fechará monumentos ao público: “Há uma preocupação de garantir a fruição pública.”

2017, explicou o ministro na sua intervenção inicial, será o ano de “repor a capacidade de entidades especialmente fragilizadas como a Biblioteca Nacional, “caso evidente de suborçamentação” que terá um reforço orçamental de 11%, e da Fundação Côa Parque, “completamente secada pelo anterior Governo”. E será também o ano em que o Museu Nacional dos Coches, inaugurado ainda pelo anterior governo de coligação PSD/CDS-PP, deixará de ser apenas uma “garagem de luxo”: as obras para a instalação do projecto de museografia (que exigirão o encerramento do museu por alguns dias, em data ainda a anunciar) aguardam apenas o visto do Tribunal de Contas.

Quanto ao Museu Nacional de Arte Antiga, onde no passado fim-de-semana um visitante danificou acidentalmente uma estátua do século XVIII, é possível que, além dos três novos vigilantes já prometidos, possa vir a receber também um sistema de vigilância electrónica.

Ainda na agenda do MC para 2017, disse o ministro da Cultura, está a criação de uma linha de apoio às livrarias independentes que possa dinamizar um sector com que Castro Mendes mostra especial preocupação (a fusão de que resultou a Direcção-Geral do Livro, dos Arquivos e das Bibliotecas, apontou, é “uma situação extremamente grave”).

E, acrescentou o secretário de Estado Miguel Honrado, estão também a entrada em vigor do regime de benefícios fiscais de incentivo à produção do cinema, que ficará pronto ainda este ano, a assinatura dos primeiros contratos-programa com os três teatros nacionais (D. Maria II, São João e São Carlos) e com a Companhia Nacional de Bailado, e a definição de um novo modelo de apoio à criação artística capaz de “corrigir todos os desfasamentos entre o calendário da DGArtes e as necessidades de financiamento do sector”. Para já, o reforço de 3,8 milhões de euros anunciado para o próximo ano é “insuficiente”, diz o PCP, e agrava “a precarização” dos profissionais do meio artístico.

Cinco horas depois do início do debate, muito dominado também pelas questões da contribuição audiovisual e do contrato de concessão da Lusa – a propósito, Castro Mendes declarou “total abertura do Governo” para aprovar na especialidade a reposição de uma indemnização compensatória “que garanta a dignidade do serviço público” prestado pela agência noticiosa –, o CDS-PP continuava a exigir provas materiais de que a Cultura é uma prioridade para o Governo do PS e o ministro da Cultura continuava a debitar números e a mostrar gráficos. Não é só na América que a política se tornou pós-factual.
 

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