Apoiantes de Clinton trocam votos com eleitores dos estados oscilantes
A campanha de Donald Trump diz que é mais uma prova de como o sistema está viciado: os eleitores dos estados democratas oferecem-se para votar nos candidatos de outros partidos para garantir vantagem de Clinton nos territórios mais disputados.
Imagine-se um eleitor norte-americano residente num dos muitos estados chamados “oscilantes”, onde o intervalo que separa os candidatos presidenciais dos dois maiores partidos é tão curto que qualquer um pode ganhar. Esta pessoa preferia votar noutro concorrente, por exemplo o libertário Gary Johnson, o conservador independente Evan McMullin ou Jill Stein, que corre em nome dos Verdes, mas está angustiada com a sua escolha: está a manifestar o seu desejo de abrir o sistema bipartidário para incluir mais alternativas, ou está a contribuir involuntariamente para a vitória do republicano Donald Trump ao desviar votos da única pessoa que o pode bater, que é Hillary Clinton?
Foi a pensar no dilema deste eleitor hipotético que um empreendedor de Silicon Valley, Amit Kumar, inventou uma aplicação que permite trocar votos. É uma solução inspirada na chamada economia da partilha, que funciona de maneira muito simples: os eleitores de estados azuis (aqueles onde a vitória de Hillary Clinton está garantida, como por exemplo a Califórnia) votam no candidato escolhido pelos eleitores dos estados oscilantes, que em troca depositam o seu voto em Hillary Clinton. É, segundo explica Amit Kumar, um sistema em que todos ganham menos Donald Trump – até porque esse é precisamente o seu objectivo, impedir que o candidato republicano seja eleito Presidente dos EUA.
O que Kumar descobriu nos últimos dias é que estes eleitores não são tão hipotéticos quanto isso, porque milhares de pessoas estão a aceder à sua aplicação #NeverTrump propondo-se a trocar votos. Por exemplo, um eleitor de Jill Stein do Ohio quis saber se alguém o ajudava a “sentir-se melhor” por votar em Clinton, que considera “a mestre da corrupção”. No sistema, encontrou um eleitor da Califórnia, apoiante da democrata mas simpatizante da causa dos Verdes – a troca assenta num compromisso de honra, que ambos garantem respeitar. Stein e Clinton obtém os mesmos dois votos, mas em estados diferentes, o que no caso do Ohio, pode fazer toda a diferença para o resultado final da eleição.
Como solução para o dilema destes eleitores, a prática da troca de votos não é inédita. Aconteceu nos anos 2000 e (menos) em 2004, quando eleitores de Ralph Nader e Al Gore se propuseram trocar votos para evitar que George W. Bush vencesse as eleições. Mas como o sistema levantou dúvidas e uma série de advogados e procuradores ameaçaram litigar contra os promotores dessa ideia, com base na legislação que proíbe a compra de votos (a lei diz que é ilegal trocar um voto por qualquer quantia de dinheiro, presentes ou serviços), os cerca de 35 mil norte-americanos que se inscreveram para trocar votos acabaram por desistir.
Uma decisão judicial de 2007 veio, no entanto, confirmar a legalidade da troca de votos em modelos tal como aquele que foi criato por Amit Kumar. O entendimento do tribunal é que os eleitores que manifestam a sua intenção de voto em sites ou aplicações como estão protegidos pela primeira emenda da Constituição que consagra a liberdade de expressão: se no diálogo produzido com outra pessoa, ambos ficam convencidos a mudar o seu voto, não estão a cometer nenhuma ilegalidade.
Claro que não é assim que a campanha de Donald Trump encara a situação. Para o magnata, o “expediente” é apenas mais uma prova de como o sistema está viciado contra ele, e como as autoridades estão a fechar os olhos à manipulação de votos em nome da sua adversária democrata.