Daniel Varela já não vai ser expulso para Cabo Verde
Recluso nasceu em Portugal e tem duas filhas menores. Processo do SEF para afastamento coercivo com destino a Cabo Verde, onde nunca esteve, foi arquivado.
Afinal, Daniel Sousa Varela já não vai ser expulso de Portugal para Cabo Verde. Entre as dezenas de clientes que a advogada Susana Alexandre tem acompanhado e que aguardam ordens de expulsão, este foi o único processo de afastamento coercivo que terminou com arquivamento. O caso de Daniel foi noticiado pelo PÚBLICO em Fevereiro deste ano.
Filho de pai cabo-verdiano e de mãe de origem cabo-verdiana com nacionalidade portuguesa, Daniel nasceu em Setúbal, tem uma companheira portuguesa e tem na cidade duas filhas portuguesas menores, uma de três e outra de oito anos. No ano passado, quando estava no Estabelecimento Prisional de Setúbal a cumprir pena por roubo, foi-lhe aberto um processo de afastamento coercivo para Cabo Verde, país onde nunca esteve. Vai ser libertado no próximo mês, mas afinal já não vai ser expulso.
Na altura, explicaram a Daniel que “era o procedimento normal”, abrirem-lhe um processo de afastamento coercivo do território nacional. O Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) entendeu, na altura, que Daniel deveria ser expulso, “por razões de segurança”, mesmo tendo nascido em Portugal e tendo duas filhas menores em território nacional, duas situações que, à luz da lei anterior a 2012, faziam dele inexpulsável.
“Não foi expulso porque foi notícia"
A advogada Susana Alexandre ironiza quando diz que os crimes (roubo e tráfico de droga) que justificavam a sua possível expulsão por razões de segurança no ano passado são, alguns meses depois, considerados criminalidade de “pouca gravidade”. “Não foi expulso porque foi notícia. Tenho situações iguaizinhas de pessoas que foram expulsas. Há dezenas de pessoas nestas situações”, critica.
Susana Alexandre tem acompanhado casos de cidadãos que nasceram em Portugal mas que, “por causa do descuido dos pais”, não têm nacionalidade portuguesa. Nunca foi pedida. Lembra-se do caso de um rapaz nascido em Portugal que esteve numa instituição de menores em risco desde os seis anos. Agora está preso por furto, tem um filho e aguarda expulsão.
Daniel chegou a ter bilhete de identidade português, tirado quando era adolescente e vivia num centro educativo. Mas em 2008 perdeu a carteira com o bilhete de identidade lá dentro. Quando foi renová-lo, responderam-lhe que não constava do sistema como cidadão português. A vida dele mudou desde esse dia. Teve de sair do emprego por falta de documentos. Nunca mais conseguiu arranjar emprego fixo. É dessa altura o seu primeiro furto, contou.
“Desde que perdi a carteira, a minha vida descambou. Fiz tudo para ter os documentos”, disse. Mandaram-no ir à embaixada de Cabo Verde pedir o registo criminal. “Foi dado como desconhecido em Cabo Verde. Então se ele nunca lá esteve...”, disse na altura a companheira Susana Santos.
Decidiu voltar a pedir a nacionalidade. Mas, depois de ter cometido crimes, foi-lhe recusada. A lei portuguesa prevê que está impedido de pedir a nacionalidade portuguesa quem tenha praticado uma "crime punível com pena de prisão de máximo igual ou superior a três anos”. E está impedido de ter autorização de residência quem tenha cometido um crime com pena de prisão superior a um ano. Está preso e vai sair no próximo mês da cadeia ainda com a sua situação por legalizar mas, no documento onde o SEF arquiva definitivamente o afastamento coercivo de Daniel para Cabo Verde, aconselham-no agora a pedir autorização de residência temporária “por razões humanitárias”.