"As coisas nunca estiveram tão más"
Ratos, rixas, lama, lixo - na "Selva" de Calais, o nome do campo de refugiados e migrantes, vivem dez mil pessoas.
Em três meses, Junho, Julho e Agosto, o número de residentes no campo de refugiados e migrantes que nasceu em Calais quase duplicou — eram 4500, passaram a ser sete mil, segundo os dados oficiais. Também há dados não oficiais, que dizem que no campo, onde a vida é tão degradante que se lhe chamou "A Selva", vivem dez mil pessoas — número do sindicato da polícia francesa Aliance.
A "Selva" apareceu na berma da estrada que liga França a Inglaterra, o destino desejado pela maior parte dos que ali chega e que está do outro lado do Canal da Mancha. Para lá entrarem, estão dispostos a tudo, até a arriscar a vida, pendurando-se nos camiões que se preparam para fazer a travessia, por exemplo.
Dizer que o campo não tem condições é um eufemismo. As pessoas vivem no meio de lama, no meio de ratos, com serviços escassos (como casas de banho) e conflitos interétnicos permanentes, descreveu o enviado do El País Carlos Yárnoz numa reportagem publicada a 30 de Agosto.
A polícia relata que a sua principal missão ali é impedir que os imigrantes e refugiados saltem para os camiões. A segunda é mais delicada e é nocturna — é quase sempre à noite que as rixas entre as várias comunidades começam. Num confronto entre afegãos e sudaneses morreu uma pessoa e seis ficaram feridas com gravidade, noutro morreram duas pessoas.
O fluxo de chegadas não diminui. Ali estão sobretudo pessoas que entraram na União Europeia através de Itália. As travessias do Mediterrâneo não abrandaram, o acordo firmado entre Bruxelas e a Turquia apenas reduziu a rota do Mar Egeu, as outras cresceram.
Volta e meia, o Governo de Paris diz que vai encerrar a "Selva". Foi assim há alguns meses, quando um grande bloco de tendas foi incendiado, para que nada restasse do acampamento insalubre. Para os que ainda ficaram, foram instalados contentores com capacidade para 12 pessoas cada um. Os desalojados foram enviados para outros campos de acolhimento. Mas os contentores estão superlotados, o recinto ocupado pelas tendas cresceu, os centos de acolhimentos têm cada vez mais gente e, nos arredores de Calais, surgiram várias outras "selvas": Norrent-Fontes, Steenvoorde, Tatinghem, Grande-Synthe, Angres (só neste há pessoas da Eritreia, Afeganistão, Sudão e Vietname, segundo a Cruz Vermelha britância que ali presta apoio humanitário e médico).
Em Grande-Synthe os Médicos Sem Fronteiras estão a instalar habitações de madeira e aquecimento — já alojaram 800 pessoas, o problema é que neste campo já estão três mil, quase todas curdas, do Iraque e da Síria, havendo muitas famílias com crianças.
Há uns dias, o Governo de François Hollande voltou a dizer que vai desmantelar Calais — está "muito determinado", disse o ministro do Interior, Bernard Cazeneuve, anunciando um plano faseado para levar os dez mil que estão na "Selva" para outros locais de acolhimento. Mas mais gente vai e a verdade, como explicou ao El País uma fonte do sindicato da polícia, é que "as coisas nunca estiveram tão más" em Calais.