O bloqueio espanhol
Espanha vai a terceiras eleições num ano? É bem possível
Desta vez, Mariano Rajoy tem mesmo razão: o regresso de Espanha às urnas pela terceira vez em menos de um ano seria "ridículo". Mas é este o cenário em aberto já depois de o rei Filipe VI ter voltado a pedir ao líder do Partido Popular, também presidente do Governo em funções, para encetar negociações com vista à formação de uma nova equipa governativa.
O impasse político em Espanha mantém-se desde as legislativas de Dezembro de 2015, com as posições relativas dos quatro principais partidos a não sofrerem alterações na segunda repetição do sufrágio, em Junho. No entanto, entre uma eleição e outra, houve pequenas nuances, que sedimentaram ainda mais esta guerra de trincheiras em que ninguém parece ter a mínima intenção de ceder. O PP, apesar de desprestigiado e há muito atolado em escândalos, aos quais não escapou o próprio Rajoy, que chegou a ser indiciado por corrupção e apropriação indevida de fundos, conseguiu ganhar mais 14 deputados (de 123 para 137); o PSOE, liderado pelo pouco carismático Pedro Sánchez, cometeu a proeza de descer, passando de 90 para 85 lugares; o Podemos, do irrequieto Pablo Iglesias, foi a decepção da noite eleitoral, acrescentando apenas mais dois deputados aos 69 que já tinha e à custa da coligação com a Unidade Popular, que tanta expectativa provocou; finalmente, o Cidadãos, liderado pelo jovem Albert Rivera, também deixou fugir oito dos 40 lugares conquistados anteriormente. Se alguém tinha dúvidas sobre o bloqueio do sistema partidário, ficou ontem com certezas, depois da primeira ronda negocial desta fase entre Rajoy e Sánchez. O socialista não mostra qualquer intenção de se aliar ao PP e, segundo o El País, diz que se os populares querem formar governo que "garantam um acordo à direita". Iglesias, por seu lado, afirmara dias antes, via Twitter, que "só há duas opções: um acordo do PSOE com o PP, ou um acordo de coligação das esquerdas", enquanto Rivera havia proposto ao rei formar governo com o PP e o PSOE, com uma condição: sem Rajoy a bordo.
No meio deste cenário aparentemente sem saída, Rajoy já começou a jogar cartadas importantes, pondo em cima da mesa a possibilidade de Espanha vir a ser multada por Bruxelas, caso os dirigentes políticos não se entendam quanto à proposta de Orçamento do Estado, cujo esboço tem de ser enviado para a Comissão Europeia até 15 de Outubro. O objectivo do líder dos populares é colocar pressão sobre os chefes dos outros partidos da oposição, endossando-lhes toda a responsabilidade por eventuais penalizações financeiras a pagar pelos espanhóis.
Até agora nada parece demover a imobilidade dos actores políticos, cada um encerrado no seu feudo, indisponível para fazer concessões. À direita, uma liderança esgotada e sem qualquer prestígio obstrui a confiança e fecha portas a um diálogo frutífero; à esquerda, o contestado Sánchez não tem força negocial, nem rasgo para mobilizar vontades e impor soluções. Um impasse sem fim à vista.