Erdogan quer tomar as rédeas do aparelho militar turco

Liderança militar foi profundamente reestruturada depois da tentativa de golpe de Estado. Presidente turco sugere que general americano escolheu o "lado dos conspiradores".

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Erdogan fala aos militares em Ancara, diante um quartel danificado pelas operações do dia 15. Gabinete de Imprensa da Presidência da Turquia

Recep Tayyip Erdogan quer que as Forças Armadas e as agências de informação nacionais passem a ser controladas pelo Presidente e deixem de estar sob a tutela do primeiro-ministro, como acontece agora. A sua vontade foi transmitida na quinta-feira à liderança militar turca, profundamente reestruturada com as grandes purgas postas em marcha depois da tentativa falhada de golpe de Estado do dia 15 de Julho.

A reunião do Supremo Conselho Militar acontece normalmente em Agosto e costuma demorar três dias. Mas, por vontade do Presidente turco e do seu Partido da Justiça e Paz (AKP), o encontro antecipou-se um mês e durou apenas cinco horas. Antes da reunião de quinta-feira, o Governo destituiu 149 generais e almirantes. Depois do encontro, os aliados de Erdogan anunciaram a promoção de 99 coronéis para esses postos.

Fontes parlamentares adiantaram os planos do líder turco à Reuters e El País, dizendo que Binali Yildirim, primeiro-ministro, serviu como seu porta-voz ao longo do encontro de quinta-feira. Para conseguir controlar o Exército, porém, o Presidente precisa da aprovação de dois terços do Parlamento, o que exigiria uma aliança com a oposição de centro-esquerda, o CHP, que até agora se opôs aos planos presidencialistas de Erdogan. Resta saber se o golpe deste mês o pode alterar.

O aparelho militar foi um dos sectores mais atingidos pelas purgas na sociedade turca das últimas semanas. Sob o pretexto de limpar as Forças Armadas da influência do "Grupo Terrorista Gulenista" – o nome dado ao suposto Estado paralelo do oposicionista Fethullah Gülen, que o Governo acusa de ter comandado a tentativa de golpe –, mais de 10 mil militares foram detidos e quase 1700 foram demitidos. Perto de 40% dos generais e almirantes foram afastados dos seus cargos.

Vivem-se “tempos muito maus” na Turquia, em cima “de tempos já maus”

Os países da União Europeia e na NATO dizem-se preocupados com o volume de demissões e detenções ordenadas por Erdogan e pelos seus aliados no Governo. Mais de 18 mil pessoas foram detidas desde o dia 15, das quais quase 10 mil estão ainda presas e à espera de julgamento. Outras 50 mil pessoas foram afastadas dos seus cargos, sobretudo no sistema educativo, onde 42 mil funcionários perderam os empregos.

As Forças Armadas norte-americanas dizem que as purgas no aparelho militar turco atingiram vários interlocutores com quem contactaram ao longo dos anos e temem o impacto que isso possa ter na cooperação entre os dois maiores exércitos da NATO. "Tínhamos certamente relações com muitos líderes turcos, em particular líderes militares", disse o general Joseph Votel, chefe do comando central americano. "Tenho receio sobre qual será o impacto nessas relações à medida que progredimos", disse.

O que fica muitas vezes de fora dos discursos de responsáveis europeus e norte-americanos é o receio de que Erdogan aproveite o momento de força para alcançar o seu grande objectivo de concentrar quase todo o poder na figura do Presidente. Para ele, aliás, os receios ocidentais com as detenções são descabidos. “Mas o que é que preocupa estes senhores?”, lançou Erdogan esta sexta, diante de um quartel em Ancara, parcialmente destruído na noite da tentativa de golpe.

“Têm receio de que o número de detidos e prisões aumente? Se houver culpados, os números aumentarão”, adiantou Erdogan, lançando duras críticas à líderança militar americana, em especial aos comentários de Jospeh Votel, de quem sugeriu ter escolhido o lado dos golpistas: “Quem é você? Conheça o seu lugar! Está a tomar o lugar dos conspiradores em vez de agradecer ao país que repeliu uma tentativa de golpe. O putschista já está no vosso país.”

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