Será caso para voltarmos a falar de novo circo?

O festival Vaudeville Rendez-Vous, que começa nesta sexta-feira em Guimarães, quer chamar a atenção para a pouca presença deste género artístico na programação dos teatros nacionais.

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Tipping Point, dos britânicos Ockham's Razor, abre o festival MARK DAWSON
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Resiliência, da Companhia Um Por 1, é uma das duas estreias nacionais co-produzidas pelo festival DR
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À Corps Perdus, da Bivouac Compagnie IAN GRANDJEAN
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Transportadores, pela Radar 360 TERESA COUTO
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Fio Prumo, da Erva Daninha RUI MEIRELES
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Insekto, do Teatro do Mar DR
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L'Effet Escargot, dos franceses Kadavresky DR
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Pozzo, pelos portugueses Cão à chuva e D'Orfeu DR
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Potted, dos La Trócola LA TRÓCOLA
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Tangram, de Stefan Sing e Cristina Casadio ANDY PHILLIPSON

Começa esta sexta-feira, em Guimarães, o Vaudeville Rendez-Vous que, durante toda a semana seguinte, levará 12 espectáculos de novo circo a outras duas cidades do Minho: Braga e Famalicão. O Teatro da Didascália, que organiza o festival, apresenta-o como uma resposta à escassa programação desta linguagem pelos teatros nacionais e municipais, o que deu o mote a uma pergunta: temos falado poucas vezes de novo circo?

No final dos anos 1990, com Isabel Alves Costa à frente do Rivoli Teatro Municipal, no Porto, houve alguma regularidade na apresentação de novo circo, pelo menos no Norte do país. Em 2004, foi criada a rede nacional de programação Sem Rede, que integrava 13 espaços culturais, incluindo o Centro Cultural de Belém e o próprio Rivoli. Mas essa experiência esvaziou-se ao fim de quatro anos e, actualmente, são raros os teatros com programação nesta disciplina. O Centro Cultural Vila Flor (CCVF), em Guimarães, que tinha integrado a Sem Rede, é hoje o único representante nacional na rede europeia Circus Next, apresentando um ou dois espectáculos anualmente.

Em Viseu, o Teatro Viriato é outros dos raros exemplos de alguma programação de novo circo. “Não é uma programação regular”, reconhece o director, Paulo Ribeiro, mas todos os anos há um ciclo mais focado nesta linguagem. O mais recente, o Circus Lab, permitiu programar vários espectáculos em diferentes concelhos do Centro do país, no início do ano passado, e prolonga-se ao longo deste ano, com um trabalho de várias companhias junto dos alunos das escolas da região.

“Ao longo dos anos foi existindo uma série de incentivos consequentes para motivar alguma produção em Portugal, mas é tudo ainda muito verde”, avalia Paulo Ribeiro, dizendo que, apesar dos vários intérpretes, “competentes”, tem dificuldades em encontrar no país criadores de novo circo que se destaquem pela sua linguagem própria ou pelo virtuosismo.

“Também há pouco investimento dos programadores em conhecerem o meio”, contrapõe o director do Vaudeville Rendez-Vous, Bruno Martins. Gera-se, por isso, aquilo que designa por um efeito “bola de neve”: os programadores justificam a pouca aposta no novo circo com a exígua criação nesta área em Portugal, os criadores têm raras oportunidades para criar peças novas porque não há muitos espaços onde as mostrar.

Desde a sua criação, há três anos, que o Vaudeville Rendez-Vous identificou como um problema os escassos apoios à produção nacional de novo circo, tendo por isso vindo a co-produzir novas criações em todas as edições. Nesta, há dois espectáculos a estrear, ambos no domingo – e terão circulação pelos três municípios que apoiam o festival. Arremesso, da Bisonte Amarelo, será mostrado pela primeira vez no Parque da Juventude, em Famalicão (19h), sendo resposto nos dias 19 e 23, em Guimarães e Braga, respectivamente. Resiliência, da Companhia Um Por 1, apresenta-se na Avenida Central, em Braga (22h), repetindo no dia seguinte em Guimarães.

Com o crescimento conseguido na edição deste ano – o festival deixou de ser realizado apenas em Famalicão, fruto de uma parceria com os municípios vizinhos, que permitiu triplicar o seu orçamento –, o Vaudeville Rendez-Vous conseguiu também concretizar outros dos seus projectos, o programa Cabaret Showcase. “Como muita da falta de programação destas linguagens advém da falta de conhecimento, decidimos pôr em contacto os artistas que têm trabalhos ainda em fase de criação com os programadores”, explica Bruno Martins. Assim, ao longo da próxima segunda-feira, no CCVF, os projectos serão apresentados de forma a criar pontes que permitam, por exemplo, a realização de co-produções ou o agenciamento de espectáculos.

Entretanto, lá fora

Pode um festival ajudar a mudar este panorama? O programador Paulo Ribeiro acredita que sim, desde que haja “continuidade”. “Tem de haver outras estruturas a seguir este exemplo, para que aconteçam coisas sucessivamente. Se não, tudo isto se esvazia”, avisa. Se assim for, “talvez tenhamos uma conversa diferente dentro de dez anos”.

Paulo Ribeiro e o director do Vaudeville Rendez-Vous, Bruno Martins, concordam que outro aspecto que necessita de um maior investimento é o da formação dos intérpretes. Há vários anos que o Chapitô, em Lisboa, tem um curso profissionalizante na área, ao qual se juntará, em Setembro, o Instituto Nacional de Artes do Circo que está a nascer na Maia. Porém, ao contrário do que acontece em França ou no Reino Unido, por exemplo, em Portugal não existe nenhuma escola superior que dê formação em circo contemporâneo.

“Qualquer aluno que queira consolidar os seus conhecimentos no circo tem de ir para fora”, sublinha Martins. Foi o que aconteceu com Telma Pinto que, depois da formação no Chapitô, rumou a Londres para frequentar o National Center for Circus Arts durante três anos. Terminado o curso, voltou a Portugal, onde foi uma das fundadoras do colectivo Armazém 13, mas depressa se desiludiu. “Ter uma companhia em Portugal implica um trabalho que vai muito para além de criar e actuar. Temos de fazer formação e eventos para empresas para ganhar dinheiro, e esse não é o meu objectivo”, explica.

Telma Pinto acabou por deixar a estrutura que tinha ajudado a fundar e por tornar-se artista independente, até que o passado no Reino Unido voltou a chamá-la. Como é uma das poucas mulheres especializadas em mastro chinês, recebeu um convite para uma audição com a companhia britânica Ockham's Razor, com que tem vindo a trabalhar nos últimos dois anos.

Ao festival Vaudeville Rendez-Vous, a estrutura traz Tipping Point, a sua última criação, estreada em Outubro do ano passado, que é interpretada por cinco artistas que manipulam outros tantos mastros chineses. A peça, diz Telma Pinto, é “uma picardia” entre os cinco artistas em que se tenta perceber “até que ponto vai o nosso equilíbrio, enquanto grupo e enquanto indivíduos”.

Tipping Point abre o festival esta sexta-feira, na praça da Plataforma das Artes e da Criatividade, em Guimarães, e é a primeira das seis apresentações de companhias internacionais do cartaz. Pelas três cidades do Minho passam Tangram, co-criado e co-interpretado por Stefan Sing e Cristina Casadio (sábado, em Famalicão), Potted, da espanhola La Trócola (dia 18, Guimarães), L’Effet Escargot, da jovem companhia francesa Kadavresky (dia 19, em Braga), e Tauromáquina, dos espanhóis Animal Religion (com duas apresentações, a primeira no dia 18, em Braga, e a segunda, a 20, em Famalicão). O encerramento está a cargo da Bivouac Compagnie, que apresenta  À Corps Perdus, em Famalicão, no dia 23.

Além das propostas internacionais e das duas co-produções, o Vaudeville Rendez-Vous reúne também quatro criações de estruturas nacionais. A Erva Daninha mostra Fio Prumo por duas vezes (sábado em Guimarães, dia 21 em Braga), Insekto, do Teatro do Mar, acontece em Braga, a 20, e, no dia seguinte, Cão à chuva & D’Orfeu apresentam Pozzo em Guimarães. Por fim, a Radar 360, uma das mais sólidas companhias de novo circo a operar em Portugal, leva Transportadores a Famalicão, no dia 22. Todos os espectáculos acontecem em praças públicas e têm entrada gratuita.

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