Nuclear, evocação e futuro
O que espera o governo português para exigir, exigir mesmo, o fim da produção da central da Almaraz?
Passam cinco anos sobre o acidente de Fukushima. Um reactor, embora longe das notícias, continua em fusão e toneladas, toneladas de água continuam a ser-lhe despejadas em cima e a invadirem o oceano Pacífico. As milhares de pessoas deslocadas e a interdição de consumo de fruta, vegetais ou pescado continuam a afectar uma zona de dezenas de milhares de km2.
Passam 30, 30 anos, já passam 30 anos sobre o acidente nuclear de Tchernobil. Muitos milhares de mortos (ultrapassam 100.000 segundo dados de organizações independentes), muitos, muitas centenas de km2 inabitáveis e altamente contaminados. Uma economia em crise e felizmente a voz de um prémio Nobel a não nos deixar esquecer. Svetlana Alexievich! A voz dos mortos, a voz dos vivos.
E hoje aqui comemoramos 40 anos de luta. O bravo povo de Ferrel, as poucas dezenas de ecologistas da altura, as energias que fizeram dos poucos muito, muita determinação, muito empenho, em defesa do que é nosso, a terra, o mar, as suas, as nossas gentes. Na altura, recordemo-nos, era contra tudo e contra todos. Os partidos, o governo, a onda da nuclear maravilha. Mas nós, e o povo, percebíamos, sabíamos dos riscos, das radiações, do perigo de fugas, das falhas humanas numa tecnologia não dominada pelo homem.
Ganhámos e depois vimos, viram que tínhamos razão. Depois começámos a desenvolver novas energias, vieram as mini-hídricas, os ventos, as solares e as ondas, veio a poupança e a eficiência, mas antes deixem-me recordar outras lutas, que no seguimento desta ganhámos e outras que temos pela frente.
Lutámos com os nossos irmãos espanhóis contra Sayago e Valcaballeros, centrais que não se fizeram também com oposição portuguesa e com o virar da economia em Espanha, lutámos, com os apoio do governo dos Açores e de municípios da Galiza e com o empenho dos ecologistas espanhóis e de todo o mundo, no seguimento também das denúncias do comandante Costeau, contra os enterramentos nucleares na fossa atlântica e pusemos-lhe termo, lutámos, com o apoio do nosso governo e queixa nas instituições europeias contra o insensato cemitério nuclear de AldeaVila que não se concretizou, e com os mineiros do urânio da Urgeiriça por compensações pelo seu trabalho e muitas vidas que nele ficaram e contra novas minerações de urânio em Nisa.
Hoje não podemos aqui esquecer Almaraz, uma central espanhola, contemporânea na sua construção da nossa luta. Construída há mais de 25 anos, é um pesadelo sobre o nosso país. Um pesadelo sobre a nossa vida.
O prolongamento, já em curso, do seu período de vida tem sido avassaladoramente assinalado por falhas e problemas nos sistemas de refrigeração e nas válvulas de segurança, conforme foi até denunciado pela autoridade nuclear espanhola.
O que espera o Governo português para, até no âmbito do timorato acordo nuclear assinado o ano passado com Espanha, para exigir, exigir mesmo!, a exemplo da actual posição das autoridades extremenhas e de quase todas as forças políticas espanholas, o encerramento, o fim da produção, irrelevante e já há muito amortizada pelos seus titulares, da central da Almaraz?
E uma última palavra para aqueles que ainda se articulam contratualmente com a EDP. Esta empresa, ora chinesa, explora 16% da central nuclear de Trillo, outro risco para o Tejo. Para bom entendedor! Há alternativas de energias sustentáveis!
Activista ambiental