Pressão de Angola não demove Portugal de candidatura à liderança da CPLP
Luanda "conta espingardas" e afirma ter o apoio do Brasil e Moçambique para travar candidatura de português a secretário executivo da organização.
Apesar de Georges Chikoti, ministro das Relações Exteriores de Angola, se ter referido à candidatura de Portugal ao cargo de secretário executivo da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) como uma imposição, a disposição de Lisboa mantém-se. O PÚBLICO sabe que o Ministério dos Negócios Estrangeiros não desiste da candidatura de um português, como, aliás, o chefe da diplomacia de Portugal, Augusto Santos Silva, anunciou no seminário diplomático de Janeiro passado.
Assim, a decisão sobre a candidatura portuguesa será um dos temas da reunião ministerial dos chefes da diplomacia dos países da CPLP, marcada para a próxima semana, em Lisboa. É com este horizonte que a diplomacia de Lisboa continua a trabalhar, depois de, na passada segunda-feira, o Palácio das Necessidades desconhecer a existência de um acordo verbal que inviabilizaria a ocupação do cargo de secretário executivo como compensação pelo facto de a sede da CPLP estar na capital portuguesa.
Esta quarta-feira, o ministro das Relações Exteriores de Angola referiu-se à candidatura de Portugal como uma tentativa de imposição. “É certo que não há nada escrito, mas desde a criação da CPLP, quando se escolheu Portugal para sedear a organização, inclusive com o maior número de funcionários, foi acordado que [Portugal] deve abdicar da presidência do órgão executivo”, disse o ministro das Relações Exteriores de Angola, em declarações ao Jornal de Angola. E o responsável de Luanda foi peremptório: “Portugal quer fazer uma imposição, quando se sabe que é a vez de São Tomé e Príncipe assumir o cargo.”
Nesta declaração, Georges Chikoti não se eximiu a um “contar de espingardas”, quando referiu que, tal como Angola, também Brasil e Moçambique se opõem à pretensão portuguesa. A posição conjunta de Luanda, Brasília e Maputo terá outros apoiantes. Na passada segunda-feira, o primeiro-ministro de Cabo Verde, José Maria Neves, referiu a existência de um acordo verbal que inviabilizaria a candidatura de um português a secretário executivo.
Contudo, o angolano Marcolino Moco, que ocupou pela primeira vez aquele cargo, entre 1996 e 2000, afirmou desconhecer a existência de qualquer acordo. “Não, senhor. Na minha vez, nunca ouvi tal acordo verbal e isso nem sequer está escrito em lado nenhum”, frisou. O ex-secretário executivo precisou ainda que ouviu falar do assunto “apenas este ano”.
No mesmo sentido se continua a pronunciar a diplomacia de Lisboa: “O Governo português não tem conhecimento dessa disposição.” Assim, Portugal remete a questão para a agenda da reunião dos ministros dos Negócios Estrangeiros da CPLP de 17 de Março.
Contudo, depois das declarações do chefe da diplomacia de Luanda existe uma nítida subida de tom numa discórdia que, na passada segunda-feira, apenas tinha como protagonista o actual secretário executivo, o moçambicano Murade Muragy, e o primeiro-ministro de Cabo Verde.
Desde a criação da CPLP, em 1996, o secretariado executivo tem sido assumido rotativamente pelos Estados-membros por ordem alfabética: Angola, Brasil, Cabo Verde e Guiné-Bissau. Moçambique assumiu o cargo nos últimos anos, com dois mandatos de Murargy. De acordo com este princípio, os próximos candidatos a secretário executivo são apresentados por Portugal, São Tomé e Príncipe e Timor-Leste.
O Presidente da República visita na próxima segunda-feira a sede da CPLP. A ida ao Palácio Conde de Penafiel, em Lisboa, traduz o interesse que Marcelo Rebelo de Sousa vota à lusofonia, uma das prioridades de política externa do seu mandado.