Com votação do Supremo, Lava Jato ganha mais um arguido: Eduardo Cunha
Presidente da Câmara dos Deputados insiste em permanecer no cargo, apesar da abertura de um processo penal por corrupção.
Eduardo Cunha é um sobrevivente. Durante os últimos quatro meses, nem a revelação de que possui contas secretas na Suíça, nem o pedido de abertura de um inquérito pela Procuradoria-Geral da República para investigar as suas supostas ligações ao escândalo de corrupção conhecido como Lava Jato, nem as chantagens explícitas e as manobras de bastidores que diariamente aparecem expostas na imprensa brasileira conseguiram retirá-lo da liderança da Câmara dos Representantes, o terceiro mais importante cargo no sistema político brasileiro.
Mas a sorte do arqui-inimigo de Dilma Rousseff, responsável pela abertura de um processo de destituição (impeachment) no Congresso brasileiro contra a Presidente da República, parece ter-se invertido esta semana. Cunha sofreu a primeira das derrotas na madrugada de quarta-feira, quando o Conselho de Ética da Câmara dos Deputados votou maioritariamente pela abertura de um inquérito parlamentar que poderá levar ao seu afastamento do cargo.
Na quinta, foi a vez dos juízes do Supremo Tribunal Federal, também em Brasília, aprovarem por unanimidade, a pedido da Procuradoria-Geral da República, que Cunha fosse constituído arguido na operação Lava Jato, indiciado pelo crime de corrupção. Embora tenha rejeitado uma parte do pedido da PGR, que acusava Cunha de envolvimento na contratação de navios-sonda pela Petrobras, o Supremo considerou que existem indícios “robustos” de que o presidente da Câmara dos Deputados recebeu pagamentos ilícitos relacionados com a negociação entre um estaleiro sul-coreano e a petrolífera estatal.
A denúncia da PGR contra Eduardo Cunha aponta que o deputado do PMDB, o partido do vice-presidente e aliado do Governo, recebeu esses pagamentos, no valor de cinco milhões de dólares em contas offshore e através de empresas-fantasma, para tentar ocultar a sua origem.
A abertura de um processo penal contra Cunha teve de ser decidida pelo Supremo Tribunal Federal por o presidente da Câmara dos Deputados gozar do que no Brasil se chama “foro privilegiado”, equivalente a imunidade parlamentar. Cunha é o primeiro arguido da Lava Jato formalizado nessas condições. Durante a análise do pedido da PGR, que durou duas tardes, entre quarta e quinta, um dos juízes do Supremo, Celso de Mello frisou que o que estava em causa não era proferir “um juízo de culpabilidade ou inocência" em relação a Cunha, mas avaliar se existiam elementos suficientes para dar início a uma acção penal.
Apesar da decisão, Eduardo Cunha continuará, pelo menos por agora, a exercer o seu cargo parlamentar. A PGR também solicitou o seu afastamento da presidência da Câmara dos Deputados, mas o Supremo Tribunal irá analisar esse pedido separadamente, sem data prevista. Em entrevista ao jornal Globo esta quarta-feira, Cunha antecipou que iria permanecer no cargo mesmo que a decisão do Supremo lhe fosse desfavorável. “Estou absolutamente tranquilo porque estou com a verdade, estou com a inocência. Eu não tenho nada com que me preocupar. Virar arguido não é sentença de ninguém. Tanto é que eu já fui arguido em 2013 e fui absolvido por unanimidade em 2014”, afirmou.
Com a abertura de um inquérito penal, a PGR e a defesa de Cunha poderão recolher novas provas e ouvir testemunhas. No final, o Supremo poderá condenar e sentenciar Cunha, ou absolvê-lo e arquivar definitivamente o caso.
Apesar do revés sofrido por Cunha na quinta-feira, ele foi ofuscado pelas revelações feitas por um senador do PT, Delcídio do Amaral, acusando Dilma e Lula de tentarem influenciar as investigações da Lava Jato e, no caso do ex-presidente, de comprar o silêncio de testemunhas. Detido em Novembro quando foi surpreendido por tentar planear a fuga do ex-director da Petrobras, Nestor Cerveró, condenado na operação anti-corrupção, Delcídio fez um acordo de delação premiada e implicou directamente Dilma e Lula nas suas declarações aos investigadores da Lava Jato.