Filhos passam a valer dedução de 550 euros no IRS
Medida compensa o fim do quociente familiar, uma bandeira da reforma do IRS contestada pelo PS. Alteração deverá ter efeito neutro na receita fiscal.
Era uma das bandeiras da reforma do IRS, mas só vai durar um ano fiscal. A proposta de Orçamento do Estado para 2016 confirma o fim do quociente familiar, o que significa que o método usado pelo fisco para considerar os filhos no IRS vai voltar a mudar.
Em vez de o rendimento colectável ser divido segundo o número de membros do agregado familiar, os dependentes deixam de ser tidos em conta na divisão do rendimento, passando a haver uma dedução fixa por filho maior do que a actual.
A proposta de orçamento que nesta quinta-feira deverá ser aprovada na reunião do Conselho de Ministros prevê que por cada filho sejam deduzidos à colecta 550 euros, confirmou o PÚBLICO junto de fonte governamental.
Com esta alteração, noticiada pelo Jornal de Negócios, cai o quociente familiar e volta a aplicar-se o quociente conjugal como forma de dividir o rendimento para calcular a taxa de imposto a pagar. É para “compensar” a ponderação dada aos dependentes no IRS que é reforçada a dedução por cada dependente.
Actualmente, os filhos são considerados de duas formas: primeiro, na divisão do rendimento; e, depois, através de uma dedução fixa de 325 euros. Agora, deixando de ser considerados na divisão do rendimento, o valor da dedução aumenta em 225 euros.
Se a proposta desenhada pelo Governo seguir o princípio previsto no programa do executivo de António Costa, o valor dos 550 euros foi desenhado de forma a haver um efeito neutro na receita fiscal arrecada pelo Estado.
A alteração só se vai aplicar na prática em 2017, relativamente aos rendimentos obtidos em 2016. Este ano ainda vai vigorar o quociente familiar relativamente aos rendimentos de 2015. Neste caso, quando é feita a divisão do rendimento colectável, cada sujeito passivo vale um ponto, sendo dado aos filhos uma ponderação de 0,3.
Por exemplo, num casal com dois filhos, o rendimento é fraccionado em 2,6, havendo depois uma dedução fixa de 325 euros por cada um dos filhos (ou 450 euros caso tenha menos de três anos).
Com a mudança agora prevista pelo novo Governo, o rendimento é divido por dois, sendo os dependentes considerados através das deduções à colecta (1100 euros).
O fim do quociente familiar era uma das bandeiras eleitorais do PS, que considerava a medida regressiva, com o argumento de que a alteração introduzida pelo PSD e CDS-PP fazia com que o “filho de um rico” valesse o mesmo do que o “filho de um pobre”.
Quando a proposta de reforma foi discutida no Parlamento em 2014, o PS já tinha proposto um modelo alternativo ao do quociente familiar/dedução de 325 euros. A dedução fixa era então de 500 euros, inferior à que agora vingou porque, segundo o novo Governo, o custo das alterações foi subestimado pelo executivo anterior.
Visões diferentes
O argumento que levou o PS a avançar com esta alteração fiscal tem a ver com o facto de o quociente familiar ser, nesta perspectiva, mais vantajoso para as famílias numerosas, em particular quem tem maiores rendimentos.
Para o atenuar este efeito, o anterior Governo seguiu a recomendação da comissão de peritos fiscais que elaborou propostas de reforma do IRS e impôs limites para aquilo que um agregado familiar poderia poupar em função da redução do imposto proporcionada pelo quociente familiar (face à versão que vigorava antes da reforma).
A questão continua a dividir fiscalistas. Para a advogada Mariana Gouveia de Oliveira, da Miranda & Associados, o argumento do PS não colhe. O que importa no quociente familiar, diz a fiscalista, é apurar efectivamente a capacidade contributiva do agregado para efeitos de aplicação da taxa do imposto, “porque a progressividade da taxa visa tributar mais gravosamente quem tem mais rendimento disponível, mais capacidade de pagar imposto, não quem tem pura e simplesmente mais rendimento”.
“O quociente familiar assegura, isso sim, uma justa progressividade da taxa, não ignorando o número de pessoas que está a ser sustentado pelo mesmo rendimento”, sustenta Mariana Gouveia de Oliveira.
Quando em Dezembro de 2014 a reforma do IRS era discutida no Parlamento, o grupo parlamentar do PS colocava a questão no prisma inverso, sustentando que o abatimento das deduções é “mais justo e mais transparente, garantindo o princípio da equidade e a não discriminação por tipo de família ou em função dos seus rendimentos”.