Hospitais vão receber cerca de 5000 euros para tratar cada aneurisma roto

Lisboa terá nova resposta para aneurismas e AVC na segunda-feira. Reforma surge após morte de doente por falta de equipas de neurocirurgia e neurorradiologia ao fim-de-semana

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Ao fim-de-semana a resposta roda entre os quatro grandes centros hospitalares de Lisboa Foto: José Carlos Coelho

A partir de segunda-feira os quatro grandes centros hospitalares da Área Metropolitana de Lisboa vão assegurar, de forma rotativa, a resposta aos casos de ruptura de aneurisma. O corte nas horas extraordinárias pagas às equipas que estavam de prevenção ao fim-de-semana comprometeu a resposta aos doentes que precisassem de ser tratados ao sábado e domingo. A 11 de Dezembro, um doente de 29 anos internado numa sexta-feira no Hospital de São José, em Lisboa, acabou por morrer na madrugada da segunda-feira seguinte, com um aneurisma roto, sem chegar a ser operado. Agora, o Ministério da Saúde diz que reviu o modelo. A tutela não quis confirmar valores concretos, referindo apenas que os hospitais vão receber de acordo com a tabela do Sistema Informático de Gestão da Lista de Inscritos para Cirurgia (SIGIC), o que pode ultrapassar os 5000 euros.

Esta foi a solução encontrada na área neurovascular pelo Ministério da Saúde, juntamente com os profissionais, para garantir que estes doentes têm uma resposta 24 horas por dia, sobretudo aos fins-de-semana, em que as escalas não estavam sempre asseguradas.

Quanto a valores, o ministério não especificou, mas uma portaria de Setembro de 2012 prevê o pagamento de cerca de 5220 euros por cada “procedimento vascular intracraniano, com diagnóstico principal de hemorragia” que a equipa realize – sendo que, de acordo com a legislação, menos de metade deste montante é que é para distribuir por toda a equipa. Não há um valor concreto para o aneurisma, mas a inserir-se nestes procedimentos será este o preço, que poderá ter ainda uma majoração de 20% quando o método utilizado for uma “reparação endovascular NCOP”.

Esta reforma para a área neurovascular encontrou também resposta para outra patologia: um esquema semelhante de rotação aos fins-de-semana permitirá tratar com uma intervenção complexa um tipo específico de acidentes vasculares cerebrais (AVC) isquémicos. A informação foi avançada ontem, em conferência de imprensa, em Lisboa, pelo secretário de Estado adjunto e da Saúde, Fernando Araújo, que explicou que durante a semana todos os centros hospitalares terão equipas fixas para tratar tanto os aneurismas rotos como um tipo específico de AVC isquémico com uma técnica conhecida como trombectomia. Ao fim-de-semana, a resposta será rotativa entre os centros hospitalares de Lisboa Norte, Lisboa Central, Lisboa Ocidental e Hospital Garcia de Orta, e a informação será do conhecimento de todos, para que se saiba para onde encaminhar os doentes.

Mesmo tendo em consideração a tabela do SIGIC, Fernando Araújo afirmou que o novo modelo não deverá trazer mais encargos para o Serviço Nacional de Saúde (SNS), já que evita as “respostas separadas e por vezes inconstantes” que existiam até agora. Os profissionais vão ser pagos pelas horas em que estão de prevenção, mesmo que não sejam chamados. Se forem chamados, não recebem essas horas e serão pagos por cada acto realizado com os incentivos previstos ao abrigo do SIGIC. O valor será repartido por toda a equipa, que pode ter seis elementos.

A tutela tinha prometido uma resposta até 1 de Fevereiro numa polémica que surgiu após a morte do doente de 29 anos, David Duarte, no Hospital de São José. Logo após este caso, que suscitou escândalo, foi provisoriamente montado um esquema rotativo, conhecendo-se agora o modelo definitivo.

David Duarte foi transferido do Hospital de Santarém para o Hospital de São José, em Lisboa, no final da tarde de uma sexta-feira, dia 11 de Dezembro, e ficou internado nos cuidados intensivos até segunda-feira, para ser submetido a uma intervenção cirúrgica, já que durante o fim-de-semana não existiam equipas de neurocirurgia e de neurorradiologia disponíveis. Acabou por morrer na madrugada de 14 de Dezembro. As equipas especializadas deixaram de fazer prevenção aos fins-de-semana na sequência dos cortes no pagamento de horas extraordinárias.

Após a morte, o Ministério da Saúde pediu aos hospitais que fizessem o levantamento das situações mais críticas de carências de especialistas a nível nacional, para evitar que se repetissem estas situações, e criou um “grupo coordenador da Urgência Metropolitana de Lisboa” para avaliar os “constrangimentos existentes” nos hospitais e procurar soluções para as “disfunções identificadas”.

Fernando Araújo garante que o Governo encontrou, junto dos quatro centros hospitalares, uma resposta “robusta e sustentada”, agradecendo a profissionais de saúde e dirigentes a forma “aberta, disponível, empenhada e responsável com que trabalharam no sentido de encontrar uma melhor solução para este problema”. Ainda assim, o secretário de Estado reconheceu que “é um processo que irá necessitar de um acompanhamento constante”, para se monitorizarem os resultados e se fazerem “os ajustes considerados necessários”.

Reorganizar mais áreas
Dentro de um mês será feita uma avaliação; os profissionais definiram também indicadores para avaliar o que vão fazer. Ao mesmo tempo serão formados internos, já que esta é uma área com escassez de recursos humanos na qual é necessário assegurar a “renovação de quadros médicos”. Fernando Araújo salientou que esta é uma resposta que “valoriza a partilha de recursos entre o Serviço Nacional de Saúde e a cooperação entre as várias instituições” e considerou que a solução vai “devolver aos utentes a confiança no SNS”.

Quanto às próximas especialidades que precisam de uma reforma, o coordenador nacional para a reforma do SNS na área dos cuidados hospitalares, António Ferreira, também presente na conferência, adiantou que se trabalha com os centros hospitalares para reorganizar mais áreas: gastroenterologia, radiologia de intervenção e cirurgia plástica e maxilofacial — neste último caso apenas na zona da península de Setúbal. Quanto a prazos, a ideia é que seja possível chegar a um acordo em tempos semelhantes aos da neurocirurgia e neurorradiologia.

Questionado sobre reformas noutras zonas do país, Fernando Araújo explicou que a Urgência Metropolitana de Lisboa era a que necessitava de uma intervenção mais urgente, garantindo que tanto no Porto como em Coimbra as respostas funcionam. Ainda assim, explicou que o ministério está em contacto com as instituições. Mostrou-se, contudo, preocupado com a situação do Algarve, onde admite que a resposta será mais complexa e passa por dar à região “liderança, projectos e captação de profissionais”.

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